tag:blogger.com,1999:blog-11591774543617648072024-03-08T11:34:04.694+00:00Passado FuturívelRui Vítor Costahttp://www.blogger.com/profile/07059965221323441539noreply@blogger.comBlogger1306125tag:blogger.com,1999:blog-1159177454361764807.post-45142083004416788712024-02-18T20:57:00.004+00:002024-02-18T21:01:54.154+00:00Atração Fatal<p> </p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 26pt;">D</span><span style="font-size: 14pt;">esde muito cedo na minha vida que tenho uma atração pela notícia, como retrato aproximado do presente.<o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;">Apanhei o 25 de abril ainda criança e toda aquela realidade, ou representação da realidade que as notícias transmitiam, exerciam, em mim, um magnetismo tremendo. Lembro-me claramente, já com 11 anos, do debate na RTP <i>CunhalxSoares</i>, da importância das diferentes perspetivas daqueles dois históricos homens, e de ter ficado pregado, durante quase quatro horas, ao ecrã, torcendo por Soares e a sua visão democrática para o país. Hoje uma hora de debate político já é uma seca, abundando a “informação” de segundos que o TikTok ou outras redes sociais providenciam, sem ideias, apenas com preconceitos e banalidades que se destinam a influenciar o bovino sentido crítico de quem nelas se predispõe a acreditar. Hoje, de forma paternalista e preguiçosa (para nós), existem hordas de comentadores políticos para nos explicarem o que vemos e ouvimos. <o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;"><br /></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"></p><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjrCpTJiO3KGVuN-CfY1r4WuYw4oggVG-MAPt9ExvZmoOGHWrQmX5ReF8BnY0f0ycJqEeuG_C1jRA2hqjq1QBY6bnMmbjVBxgZEDXrqX23VmqnF7zkWHvq2xsv94s-VlWFwRx07oDxm5tebBQDBiAFiWZLa0VUB04T0eG4HU7QEk20nb60mWGD8Ao06W4g/s694/expresso.jpeg" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" data-original-height="464" data-original-width="694" height="214" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjrCpTJiO3KGVuN-CfY1r4WuYw4oggVG-MAPt9ExvZmoOGHWrQmX5ReF8BnY0f0ycJqEeuG_C1jRA2hqjq1QBY6bnMmbjVBxgZEDXrqX23VmqnF7zkWHvq2xsv94s-VlWFwRx07oDxm5tebBQDBiAFiWZLa0VUB04T0eG4HU7QEk20nb60mWGD8Ao06W4g/s320/expresso.jpeg" width="320" /></a></div><br /><span style="font-size: 14pt;"><br /></span><p></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><br /></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 26pt;">A</span><span style="font-size: 14pt;"> política é algo de complexo e, muitas vezes, de contraditório, que se esconde nas sombras da aparência, como a vida de cada um. Não é substancialmente diferente da vida. As falhas da política, as contradições, as desilusões que ela provoca, são obra do espírito humano, assim como as suas realizações e os seus sucessos.<o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;">A imprensa teve um papel importante no desenvolvimento das sociedades, na democraticidade que muitas delas tiveram capacidade de prosseguir. No século XIX e na maior parte do séc.XX, a imprensa, com os jornais em particular destaque, apesar do alto grau de iliteracia, tiveram uma importância extraordinária ... e davam lucro. Cada comunidade, como Guimarães, tinha imensos títulos e as pessoas tentavam encontrar neles, frequentemente, uma fonte para a sua formação crítica ou, também, uma maneira de se distraírem ou, até, encontrarem mulher casadoira. Era comum há uns anos, no Toural, ao sábado ou domingo, ver muita gente lendo o jornal ou passeando-o com indisfarçável orgulho. <o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;">Hoje a crise dos jornais mete dó pela irrelevância a que são votados. Numa sociedade em que a humildade de cada um desapareceu por magia, não é preciso formar opinião. O primeiro disparate que vem à cabeça de cada um passa a ser a "notícia" própria nos milhões de pequenos mundos em que habitamos.<o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;">A crise da comunicação social é visível. Incapaz de contrapor as suas qualidades críticas e de investigação à imbecilidade reinante, mimetizou-a. Dantes quando alguém queria ler sobre coisas bizarras comprava o Tal&Qual, hoje a atração fatal pela pequenez espalha-se na comunicação social de “referência” e transforma os macacos, pela importância que lhes dão, nos donos deste zoo noticioso.</span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: medium;"><br /></span><span style="font-size: 14pt;"><o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify;"><span style="font-size: 14pt;"> </span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 26pt;">E</span><span style="font-size: 14pt;">stive naturalmente atento às eleições dos Açores. A importância que deram (e continuam a dar) ao partido do Dr. Ventura é uma vergonha. Não há outra maneira de o dizer.<o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;">Há, na comunicação social, uma esquizofrenia à volta do bizarro que enjoa e o alimenta. O Dr. Ventura, um homem habilidoso, conseguiu que o país se viciasse em torno dele. As perguntas dos jornalistas repetem-se até à má educação, até ao vómito, alimentadas também, diga-se, por partidos políticos sem ideias, que não sejam as do aceno de fantasmas na casa dos outros. Desta forma o Dr. Ventura tem conseguido iludir o facto de liderar um partido sem estratégia para o país, com segundas linhas sinistras que afirmam, perante o embevecimento da comunicação social, a sua vulgaridade intelectual e política.<o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;"> </span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;"> </span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"></p><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhZWBnPOwzsr4F-z0-ObbM2X-7VeAWGNPqpTPvq68sga_RSkFKCI2BDEmlHlB9kcxJkdGCy0hNqrtJ8LxIfHOOjmRAfWCdFwxHxHCxOcMu30QLj94WujWKzQMrfr7Yv6R241XUli1P0aFSv95SMOnAcHn6JH2P-mYS_72qdKWZ0PYl6eeFucQ5eV_8pdZo/s694/inacio%20ludgero:visao.jpeg" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" data-original-height="463" data-original-width="694" height="213" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhZWBnPOwzsr4F-z0-ObbM2X-7VeAWGNPqpTPvq68sga_RSkFKCI2BDEmlHlB9kcxJkdGCy0hNqrtJ8LxIfHOOjmRAfWCdFwxHxHCxOcMu30QLj94WujWKzQMrfr7Yv6R241XUli1P0aFSv95SMOnAcHn6JH2P-mYS_72qdKWZ0PYl6eeFucQ5eV_8pdZo/s320/inacio%20ludgero:visao.jpeg" width="320" /></a></div><span style="font-size: 26pt;">D</span><span style="font-size: 14pt;">eixamo-nos encantar demasiado pela quietude das coisas, pelas certezas dogmáticas de quem vocifera alto: o Portugal pequenino. <o:p></o:p></span><p></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;">Estou a ler a biografia de Natália Correia, impecavelmente escrita por Filipa Martins. Não sendo fã absoluto da sua poesia, são fã da personagem, que entrou na política pela sua amizade com Sá-Carneiro. Numa das peripécias relatadas, Natália é mandada parar pela polícia por estar a conduzir de ombros a descoberto. Protestando com a autoridade pelo facto de outras mulheres o fazerem, o polícia argumenta que ela se encontrava já fora de Lisboa e que, por isso, o decoro se impunha. A escritora contra-argumenta, com o seu desarmante humor, “desde quando é que a moral está na razão direta da quilometragem?”.<o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;">A capacidade de pensar e não nos deixarmos amesquinhar pela indigência vigente, pelo ódio, pelo <i>bullying noticioso</i>, pelo “quero que se f***”, é necessária. Dá trabalho, é certo, mas compensa. É assim que se constroem as nações, como a nossa. Cheia de defeitos, é certo, mas inapelavelmente nossa e a precisar, urgentemente, de rumo e de perspetiva.<o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;"><br /></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;"><br /></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 9pt;"><i><span style="font-size: 9pt;">“Hoje apetece-me que o cigarro saiba/ A ter fumado uma cidade toda/ Ser o anel onde o teu dedo caiba/ E faltarmos os dois à nossa boda.”<o:p></o:p></span></i></p><p align="right" class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: right; text-indent: 9pt;"><span style="font-size: 9pt;">Natália Correia. </span><i><span style="font-size: 9pt;">Passaporte.</span></i><span style="font-size: 9pt;"> 1958.</span><span style="font-size: 9pt;"><o:p></o:p></span></p><p align="right" class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: right; text-indent: 9pt;"><span style="font-size: 9pt;"><br /></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: left; text-indent: 9pt;"><span style="font-size: 9pt;"><br /></span></p><p class="MsoNormal" style="margin: 0cm; text-align: left; text-indent: 9pt;"><span style="font-family: Times New Roman, serif;"><span style="font-size: 9pt;">Adaptado de </span><span style="font-size: 12px;">publicação</span><span style="font-size: 9pt;"> d' O Comércio de Guimarães de 7 de fevereiro de 2024</span></span></p><p class="MsoNormal" style="margin: 0cm; text-align: left; text-indent: 9pt;"><span style="font-family: Times New Roman, serif;"><span style="font-size: 9pt;"><br /></span></span></p><p class="MsoNormal" style="margin: 0cm; text-align: left; text-indent: 9pt;"><span style="font-family: Times New Roman, serif;"><span style="font-size: 9pt;">Imagens:</span></span></p><p class="MsoNormal" style="margin: 0cm; text-align: left; text-indent: 9pt;"><span style="font-family: Times New Roman, serif;"><span style="font-size: 9pt;"><br /></span></span></p><p class="MsoNormal" style="margin: 0cm; text-align: left; text-indent: 9pt;"><span style="font-family: Times New Roman, serif;"><span style="font-size: 9pt;">Debate Soares </span><span style="font-size: 12px;">Cunhal</span><span style="font-size: 9pt;"> (Expresso)</span></span></p><p class="MsoNormal" style="margin: 0cm; text-align: left; text-indent: 9pt;"><span style="font-family: Times New Roman, serif;"><span style="font-size: 9pt;">Natália Correia (Inácio Ludgero/Visão)</span></span></p>Rui Vítor Costahttp://www.blogger.com/profile/07059965221323441539noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-1159177454361764807.post-86037210305053315912024-01-15T11:15:00.001+00:002024-01-15T11:23:26.295+00:00A JAULA DOS LEÕES<p><br /></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 26pt;">P</span><span style="font-size: 14pt;">enso que a maior parte das pessoas, mais ou menos atentas à realidade, e aos sinais que ela deixa antever, entraram em 2024, com o mesmo terror com que se entra, sozinho e desarmado, numa jaula de leões. Entra-se e espera-se apenas que os bichos não deem por nós, não queiram fazer do nosso corpo uma refeição extra.<o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;">Daniel, numa das fantásticas – mas sempre violentas - histórias do Antigo Testamento, é condenado pelo Rei Dário da Aqueménida (que corresponderá ao atual espaço geográfico ocupado pelo Irão, Iraque, Síria, Turquia e mesmo parte do Egipto) para ser enviado para a jaula dos leões, pelo facto de, ao contrário daquilo que a lei então ditava, adorar um Deus em vez do próprio Rei. Daniel safou-se, ao contrário do que para nós é expectável. No entretanto, em 1981, a banda britânica The Sound, edita o álbum <i>From the Lions Mouth</i>, um dos mais interessantes discos da minha adolescência, cuja capa reproduz essa cena bíblica.<o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"></p><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhsDNyNx1K85t8ANkCbnfi_S_cIT4eRBP-YZj_eE_SUughWDOjA-IWdIFUjcM1N0NwmN6sPTbEM4gBRqEEm3ARsHHWdB4L0EJTqZqx92wvshNlLwlFTHUvfbFxoQc1vYidDEs6lcHXSBa9-mJ3O79wDXX589J8Kl2YKlj3Br9kg7Xvj7P04_I_QIujNTVU/s1000/BRiton_Rivie%CC%80re_1872.jpg" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" data-original-height="606" data-original-width="1000" height="240" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhsDNyNx1K85t8ANkCbnfi_S_cIT4eRBP-YZj_eE_SUughWDOjA-IWdIFUjcM1N0NwmN6sPTbEM4gBRqEEm3ARsHHWdB4L0EJTqZqx92wvshNlLwlFTHUvfbFxoQc1vYidDEs6lcHXSBa9-mJ3O79wDXX589J8Kl2YKlj3Br9kg7Xvj7P04_I_QIujNTVU/w396-h240/BRiton_Rivie%CC%80re_1872.jpg" width="396" /></a></div><span style="font-size: 14pt;"> </span><p></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 26pt;">E</span><span style="font-size: 14pt;">stamos, previsivelmente, como se costuma dizer, entregues à bicharada.<o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;">Mesmo a Europa que conseguiu passar, com base nas suas instituições e nos seus governos, como nunca até aqui se tinha conseguido, de forma solidária e eficaz uma pandemia que nos atirou para uma realidade perigosa e desconhecida, não consegue fazer ressaltar as suas forças e perde-se pelas suas fraquezas. O que nos une, os valores da democracia e de uma cultura cristã, começa a ser obliterado por aquilo que nos divide e que, penso, não tem a dignidade e a possibilidade de progresso que aquilo que nos une poderia ter. As eleições americanas de 5 de novembro, e a forte possibilidade de Trump voltar para nos ensombrar é tão forte e exequível que parece que já estamos dentro da jaula, mesmo antes de lá entrarmos.<o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;">Por cá tudo é também um pouco trágico-cómico. Perceber a possibilidade de ter Pedro Nuno Santos como primeiro-ministro, depois de tudo que aconteceu, depois de todas as particulares, claras e repetidas excitações da personagem, tem a mesma razoabilidade que emprestar o carro do pai ao adolescente, para ele, mesmo sem carta, dar umas voltas no bólide pela cidade ... e esperar que, condutor e carro, cheguem intactos depois da temerária permissão. Se se atropelarem uns peões pelo caminho, paciência, o que interessa é que o carro, amolgado ou não, continue na família.<o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;"><br /></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"></p><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgDeu6fZGYqfsnmUK4mf3Bm1yJZcSfMnfP2lRDo3HLcExmBYiqvsWZDOUN2-KadDNuwMzbYRU0IEvoDNdvf7HRnonPEcdS9TX7H5Wv-st6IR28DD_uUM_8FwQOlCCDk0-gQhPEdizJIaGYmCTvc_Dqf0Ft61It19BJekiLnGjZTKRNHR7JqmXUeTT2Kw20/s1200/Briton_Rivie%CC%80re,_1890.jpg" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" data-original-height="772" data-original-width="1200" height="206" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgDeu6fZGYqfsnmUK4mf3Bm1yJZcSfMnfP2lRDo3HLcExmBYiqvsWZDOUN2-KadDNuwMzbYRU0IEvoDNdvf7HRnonPEcdS9TX7H5Wv-st6IR28DD_uUM_8FwQOlCCDk0-gQhPEdizJIaGYmCTvc_Dqf0Ft61It19BJekiLnGjZTKRNHR7JqmXUeTT2Kw20/s320/Briton_Rivie%CC%80re,_1890.jpg" width="320" /></a></div><span style="font-size: 14pt;"><br /></span><p></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify;"><span style="font-size: 14pt;"> </span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 26pt;">N</span><span style="font-size: 14pt;">ão consigo perceber quando é que a natural rotação da terra e das democracias se inverteu. Quando os extremismos obliteraram definitivamente as pontes e diálogos que caracterizaram as democracias e o ocidente depois da II Guerra. Assiste-se, progressivamente, a um niilismo militante, em que a ausência dos valores tradicionais se perde sem que nada os substitua. Nietzsche profetizou esse período caótico, a morte de Deus, o acontecimento que possibilitaria o aparecimento de um homem novo, com alguns super-homens que dominariam o conhecimento. Provavelmente o filósofo alemão pensaria no conhecimento científico; mas na verdade esses super-homens já existem, não por aquilo que conhecem de si, mas por aquilo que conhecem dos outros, pelas permissões que damos continuamente na internet para eles nos rastrearem as preferências e, com esse conhecimento, possam condicionar o que pensamos.<o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;">Não diabolizo a internet, pelo contrário. Do meu sofá atinjo, com critério, julgo, aquilo que me demoraria dias, semanas ou até meses a alcançar, mas essa é uma jaula em que é preciso, continuamente, saber entrar, mas, igualmente, saber sair, quando o leão se aquieta.<o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;"> </span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 26pt;">C</span><span style="font-size: 14pt;">ustará a muitos de nós compreender a vitória progressiva da intolerância. Não sei quando a coisa mudou, e porque mudou. Tenho uma teoria patética de que a espécie humana não aguenta brutais mudanças de velocidade, se enjoa e fica confusa e violenta com elas.<o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;">A ditadura do politicamente correto, amplamente difundida pela comunicação social e pela cultura vigente, não procurou ensinar e corrigir comportamentos, mas, pelo contrário, censurar e ostracizar quem pensava de forma diferente. De repente, como numa aceleração de um foguetão espacial, a cabeça ficou tonta e extremam-se pensamentos recalcados. Quando esse recalcamento é pessoal e voluntário, tudo tende a evoluir, quando o recalcamento é imposto de fora, tudo se extrema.<o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;"> </span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"></p><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEiaGpI4gAK2Y0Qu6w1R3RKRSVNUMj2njXM5edgTmH4YU8OgTgzxKzX0CdkxW3wsSwT_J-XL7nbZ1N1yoV_cK-4CIY539glarVyx2EyQEUoVmm6E4Nag4tSdF2MA61BLg-IhkA2MB51rfSUF2JL9Cj719i53Cpoc6wqchK2LH0Ci-TojPyh6gzOKqnslbZ4/s7633/Peter_Paul_Rubens_1615.jpg" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" data-original-height="5165" data-original-width="7633" height="217" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEiaGpI4gAK2Y0Qu6w1R3RKRSVNUMj2njXM5edgTmH4YU8OgTgzxKzX0CdkxW3wsSwT_J-XL7nbZ1N1yoV_cK-4CIY539glarVyx2EyQEUoVmm6E4Nag4tSdF2MA61BLg-IhkA2MB51rfSUF2JL9Cj719i53Cpoc6wqchK2LH0Ci-TojPyh6gzOKqnslbZ4/s320/Peter_Paul_Rubens_1615.jpg" width="320" /></a></div><span style="font-size: 14pt;"><br /></span><p></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;"><br /></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 26pt;">N</span><span style="font-size: 14pt;">a passagem bíblica de Daniel com os leões, o condenado conseguiu que os leões não lhe fizessem mal. Pelo contrário, fez com eles uma amizade como aquela que se tem com os bichos domésticos. Perante a inusitada situação, a estranha amizade de Daniel com os leões, o Rei Dário tomou então a resolução de libertar Daniel e atirar para os leões os legisladores que o quiseram, para seu primeiro agrado, glorificar.<o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;">Precisamos de um Rei Dário que, mesmo com a hipocrisia do arrependimento, inverta drasticamente o plano inclinado em que nos encontramos. Ou, melhor, que cada um seja capaz de ver no cinzento, no ocre, no verde-azulado, as tonalidades que o preto ou o branco absoluto nos escondem.<br /><o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;"><br /></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;"><br /></span></p><p class="MsoNormal" style="margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: xx-small;"><span style="font-family: Times New Roman, serif;">Publicado in O Comércio de Guimarães a 10 de janeiro de 2024</span></span></p><p class="MsoNormal" style="margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: xx-small;"><span style="font-family: Times New Roman, serif;"><br /></span></span></p><p class="MsoNormal" style="margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: xx-small;"><span style="font-family: Times New Roman, serif;">Pinturas: Briton Rivière (1872 e 1890) e Peter Paul Rubens (1615)</span></span></p>Rui Vítor Costahttp://www.blogger.com/profile/07059965221323441539noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-1159177454361764807.post-40538251962914155212023-12-14T18:42:00.007+00:002023-12-14T18:43:42.387+00:00AS FOTOCOPIADORAS NOSSAS AMIGAS<p><br /></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 26pt;">O</span><span style="font-size: 14pt;"> primeiro e mais fascinante salto tecnológico que mudou (para muito melhor) a minha vida foi a fotocopiadora.<o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;">Aí por volta do final dos anos 70, com a popularização e acessibilidade da fotocopiadora, de repente, o mundo abriu-se-nos de maneira absolutamente radiosa. Já não era preciso ir às aulas apanhar o pormenor maroto que o senhor professor guardava para a sua exposição teórica, era só fotocopiar uma boa fonte. Já não era necessário empenhar a mobília para comprar aquele livro técnico importado. A fotocopiadora emparceirava assim, de forma extraordinariamente útil, com o outro meio profundamente democrático da contrafação juvenil: a cassete. A fotocopiadora retirou à nossa preguiça individual, de forma redentora, o terrível peso da culpa de faltar às aulas.<o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;"><br /></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"></p><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEiAQR49EgczxNp4AV9xOfb24yxYtwUZW4tbZsTxF61kQlERY87CoobMHfIjJ_Z0oB_VS3_n4aYhRqL_xN86tp6CnrXmCrVHAflwkFgHeBcYSlW9Uzs5w-kZZcLufenn9txwSc4GOP04g8NtsYLwRNP9nngE2wYxYwlgdE_GLr8VByi1UG_rglpwF93tMoY/s3448/4.fotoc5.jpg" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" data-original-height="3448" data-original-width="3219" height="320" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEiAQR49EgczxNp4AV9xOfb24yxYtwUZW4tbZsTxF61kQlERY87CoobMHfIjJ_Z0oB_VS3_n4aYhRqL_xN86tp6CnrXmCrVHAflwkFgHeBcYSlW9Uzs5w-kZZcLufenn9txwSc4GOP04g8NtsYLwRNP9nngE2wYxYwlgdE_GLr8VByi1UG_rglpwF93tMoY/s320/4.fotoc5.jpg" width="299" /></a></div><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;"> </span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 26pt;">M</span><span style="font-size: 14pt;">uitas coisas fantásticas se inventaram antes e depois da fotocopiadora. Os Walkman, o cartão multibanco, a caneta BIC, a Aspirina, ou o papel higiénico, mas nenhum foi capaz, face à situação anterior, de dar um salto cronológico tão grande. São quase 900 anos que distam entre os monges copistas e as fotocopiadoras. E antes delas só nos restava, ao nível académico, ser monges copistas, e rápidos, pois o caderno fazia sempre falta ao seu legítimo proprietário. Sim, eu sei que existia o interessante papel químico, mas isso só era exequível para corporações empresariais e bordadeiras, não se aplicava a estudantes. </span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: medium;"><br /></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: medium;"><br /></span><span style="font-size: 14pt;"><o:p></o:p></span></p><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEitg-rKaH9flLlwsxlF3alyjj0if0sx74pIh8anfLRWnyLW5H4HGsHzwdpPtg_qeykm2WlNA6TljHiOZ83h3wowNB2efU8pVa8aRlQC4xyFuJ1iNnpM7TiyhZy0xhQrU0V-Z_MGfrBLNbZvQ0H8UNZREOgM4LnY8KQR8I14l2jtRZkDzgig10CGtvWLmcc/s2118/3fotoc2.jpg.webp" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" data-original-height="2118" data-original-width="1588" height="320" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEitg-rKaH9flLlwsxlF3alyjj0if0sx74pIh8anfLRWnyLW5H4HGsHzwdpPtg_qeykm2WlNA6TljHiOZ83h3wowNB2efU8pVa8aRlQC4xyFuJ1iNnpM7TiyhZy0xhQrU0V-Z_MGfrBLNbZvQ0H8UNZREOgM4LnY8KQR8I14l2jtRZkDzgig10CGtvWLmcc/s320/3fotoc2.jpg.webp" width="240" /></a></div><p></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify;"><span style="font-size: 14pt;"> </span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 26pt;">A</span><span style="font-size: 14pt;"> fotocopiadora trouxe, como outras grandes invenções, todo um ambiente novo e próprio às exigências e particularidades da coisa. O “dinheiro para fotocópias” foi, sem dúvida, a mais histriónica das expressões então utilizadas pelos estudantes.<o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;">Como a necessidade de fotocópias era uma espécie de buraco negro, complexo quanto às reais necessidades que implicava, os progenitores, não preparados para esta nova realidade, davam dinheiro para elas -as fotocópias - pois aquilo se lhes afigurava uma necessidade premente a que tinham de atender. E ao bom jeito nacional a coisa ganhou foros de abuso sistemático. Tanto assim o era que, aos poucos, os pais começaram a desconfiar da necessidade de tanto dinheiro para fotocópias, geralmente gasta em copos e outras atividades lúdicas, digamos assim. Na minha República de Coimbra, o pai de um amigo meu, perante os insistentes pedidos de reforço de “dinheiro para fotocópias”, sugeriu ao filho se não seria mais económico ele comprar-lhe uma fotocopiadora. Às vezes era preciso ser mais parcimonioso nas “fotocópias” ...<o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;"><br /></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"></p><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjsYJOLaGAuV4IAOsrf6e73PK-2ZVl-Pm0zEFhG8xHyZYqUfp6IwCZPluHGr0cXRAsqrn3IXun4tPaDnvdE5SDw-nRvXPSx1vL6wSVEvLniK6hnxviSMSHC5CA-Gy0s3a-iJyjEZsNxq2B96f4zrxjc4b4p67IlEbZIHIbDeIIe05TU5KG89FO2SDjYWEQ/s500/3.fotoc1.jpg" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" data-original-height="381" data-original-width="500" height="244" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjsYJOLaGAuV4IAOsrf6e73PK-2ZVl-Pm0zEFhG8xHyZYqUfp6IwCZPluHGr0cXRAsqrn3IXun4tPaDnvdE5SDw-nRvXPSx1vL6wSVEvLniK6hnxviSMSHC5CA-Gy0s3a-iJyjEZsNxq2B96f4zrxjc4b4p67IlEbZIHIbDeIIe05TU5KG89FO2SDjYWEQ/s320/3.fotoc1.jpg" width="320" /></a></div><p></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><br /></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 26pt;">O</span><span style="font-size: 14pt;">s mais novos não têm noção disso, mas, em meados dos anos 80, a profusão de casas de fotocópias era uma espécie de praga comercial que, hoje, só tem paralelo nas casas de venda de óculos. Havia fotocopiadoras por todo o lado, especialmente nas cidades universitárias. Se no início as primeiras fotocopiadoras foram adotadas pelas livrarias e papelarias, rapidamente ganharam autonomia para serem apenas casas de fotocópias e encadernações e passaram a invadir outros negócios inesperados. Quando chegamos então à designação de Centro de Cópias, por substituição da Casa de Fotocópias, a coisa ganhou mesmo um tom estratosférico. Toda a gente queria ter uma fotocopiadora, essa possibilidade era uma espécie de licença da Santa Casa da Misericórdia. Até em Coimbra, juro, vi na porta de uma agência funerária o seguinte cartaz: EXECUTAM-SE FOTOCÓPIAS. Maravilhoso. Entre dois enterros, executavam-se cópias da sebenta de Direito Penal ou do famoso livro de Química Orgânica do Allinger. Mesmo assim, apesar do inusitado local, executar dava ao ato um tom mais nobre e sério à função de fotocopiar, do que o vulgar “tiram-se”. O executar era aristocrático, o tirar plebeu.<o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;"><br /></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"></p><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhmjlRMHJPZODUlnxrRLnK1TqyOMKqcTogEAjh6EK-rRra33Rr4NiYRikuXbvepk1bmcni6MwzNFRAVZdAgBjGCuooklJfVVCeXpeh6TxxnGPaA4RvttTeMedHxJVa2iQLRqaGabVJW3E38l6tVLueyIaQTEL64FLs5JmYz8Ld81tfRe4EvUDLe2c8JZ44/s2046/3.fotoc4.jpg" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" data-original-height="1409" data-original-width="2046" height="220" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhmjlRMHJPZODUlnxrRLnK1TqyOMKqcTogEAjh6EK-rRra33Rr4NiYRikuXbvepk1bmcni6MwzNFRAVZdAgBjGCuooklJfVVCeXpeh6TxxnGPaA4RvttTeMedHxJVa2iQLRqaGabVJW3E38l6tVLueyIaQTEL64FLs5JmYz8Ld81tfRe4EvUDLe2c8JZ44/s320/3.fotoc4.jpg" width="320" /></a></div><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;"> </span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 26pt;">B</span><span style="font-size: 14pt;">ebemos demasiada cultura anglo-americana, tantas vezes com pouca imaginação ou, no mínimo, deslocada da nossa realidade autóctone. A designação de geração, como X, Y ou Z, é de uma infinita pobreza de imaginação. Em Portugal é-se mais imaginativo e deveriam adotar-se as nossas designações, como a de Vicente Jorge Silva, em 1994, para a geração nascida nos meados dos anos 70 como “geração rasca”, e as posteriores adaptações para as atuais como “geração à rasca”. Para a minha, dos nascidos em meados dos anos 60, não me importaria que nos chamassem “geração fotocopiadora”. Teria um duplo significado: o do amor ao dispositivo propriamente dito, mas, igualmente, da nossa capacidade de fotocopiarmos rapidamente o outro. <o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;">A fotocopiadora foi o nosso primeiro amor tecnológico, muito mais útil e impactante que o ZX Spectrum de 8 bits. E os primeiros amores nunca se esquecem.</span><span style="font-size: 14pt;"><o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;"><br /></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;"><br /></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 9pt;"><i><span style="font-size: 9pt;">“A modernidade penetrava em mim como uma torrente selvagem, e eu misturava tudo.”<o:p></o:p></span></i></p><p align="right" class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: right; text-indent: 9pt;"><span style="font-size: 9pt;">César Aira. </span><i><span style="font-size: 9pt;">A Tília.</span></i><span style="font-size: 9pt;"> 2003.</span><span style="font-size: 9pt;"><o:p></o:p></span></p><p align="right" class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: right; text-indent: 9pt;"><span style="font-size: 9pt;"><br /></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: left; text-indent: 9pt;"><span style="font-size: 9pt;">Publicado in O Coméricio de Guimarães a 13 de dezembro de 2023</span></p>Rui Vítor Costahttp://www.blogger.com/profile/07059965221323441539noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-1159177454361764807.post-59453923205935705482023-09-19T21:47:00.002+01:002023-09-19T21:49:29.081+01:00ZODÍACO<p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"></p><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><br /></div><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEiMV_oW4apusw1WTF4bPNLvHlsLafUu3VPYFseamOQtfc5_cAW92wvvpZrWGR-3hS8tuAWhZT6NJshvjME0odp78RSHriGPaZmQWtn6_GlJZuMSUKufniLXfzAUYSnMGrjXmBanXBOfSiUj8Tw0jyuparxBCxkCZ9u-t9dG9dy1aD0FMGtUsZZ1249AB_c/s527/2.%20sinagoga_Beth_AlphasecVI.jpg" imageanchor="1" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" data-original-height="527" data-original-width="519" height="320" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEiMV_oW4apusw1WTF4bPNLvHlsLafUu3VPYFseamOQtfc5_cAW92wvvpZrWGR-3hS8tuAWhZT6NJshvjME0odp78RSHriGPaZmQWtn6_GlJZuMSUKufniLXfzAUYSnMGrjXmBanXBOfSiUj8Tw0jyuparxBCxkCZ9u-t9dG9dy1aD0FMGtUsZZ1249AB_c/s320/2.%20sinagoga_Beth_AlphasecVI.jpg" width="315" /></a></div><p></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 26pt;">S</span><span style="font-size: 14pt;">ou um orgulhoso Balança, com ascendente em Gémeos. Um livrinho que comprei quando fui para a faculdade - e que me permitiu ter conversas muito profícuas com elementos do sexo feminino – diz que terei uma extraordinária habilidade manual, acrescenta e refere a minha tendência para a dispersão, diz que sou inteligente e espirituoso e, ainda, um comunicador agradável e vivo. Sobre as três últimas vou acreditar que sim, apesar de uma delas não ser propriamente favorável. Quanto à primeira é claramente falsa, a única que tenho a certeza de o ser. Mesmo assim compro as três pelo preço de quatro.<o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;"><br /></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"></p><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEj1UMj3Fvqee5mk6fcH8LQT7eAUKXjesk9KtA5ElpE23HHEZG93tqe83Gk8A_pt0zkUwK3QmmPVOA-w0QIZHWzjHjtte6QBLXs7roGGtaghYbWfvpwlQ-ppvysN276aTmWdK0bUq9mHhZeU64MoOpZ2jC3ZDk5Yzn7YMNJGQFKhlb_v_Gikg-Wl3HPbnnk/s800/2.%20Torre%20dell''Orologio_Veneza.jpg" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" data-original-height="600" data-original-width="800" height="240" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEj1UMj3Fvqee5mk6fcH8LQT7eAUKXjesk9KtA5ElpE23HHEZG93tqe83Gk8A_pt0zkUwK3QmmPVOA-w0QIZHWzjHjtte6QBLXs7roGGtaghYbWfvpwlQ-ppvysN276aTmWdK0bUq9mHhZeU64MoOpZ2jC3ZDk5Yzn7YMNJGQFKhlb_v_Gikg-Wl3HPbnnk/s320/2.%20Torre%20dell''Orologio_Veneza.jpg" width="320" /></a></div><span style="font-size: 14pt;"><br /></span><p></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;"> </span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 26pt;">N</span><span style="font-size: 14pt;">a realidade, a conversa sobre signos está completamente fora de moda. Não sei o que aconteceu desde a minha juventude, mas já ninguém se assume como um pragmático Touro, como um particular e difícil Escorpião, como um generoso Aquário, ou um Peixes sonhador. Ninguém. O assunto saiu das conversas e perdeu-se, assim, um dos mais perfeitos desbloqueadores de conversa que já tivemos à nossa disposição. E é pena que se perca esse desbloqueador. Os atuais: ou não existem e ninguém desbloqueia, ou não chegam aos calcanhares do zodíaco. Há sempre o tempo meteorológico, mas esse é um tema claramente muito menos profundo que o dos signos. É mais básico e, assim, menos dado a magnéticas conversas.<o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;">Até a maior parte dos jornais já não têm o horóscopo. Que tragédia!<o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;">A gente saía de casa a saber que, em pleno janeiro, teríamos que ter cuidado com as constipações, ou, na permanente conjuntura de crise, teríamos que ter muito atenção às finanças. Conselhos fantásticos e universais que nos permitiam encarar o novo dia com resoluções sensatas, tirando aquelas que nos agulhavam a dizer que o Sol em Sagitário favorece novos envolvimentos românticos. Mas ainda assim.<o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;"><br /></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"></p><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjqeZSOqHG0ja2UxUgAjecWDDYQMIgqUS_5CQOe4WZk2wAgatT7Cqv69ZnMxh_CncV0bKRTa-Zg_kEfEBoUDnaCPW_cPgNOlUaYAvw6Sn3mrUdo7y5tqGjVOjeYqjx_lP3t4sVrq19AelSfhMETVe8bp-sFaRx9ouj-gIWws108pE66Wc88MyJn-znhWqo/s1000/2.%20escorpia%CC%83o_Templo%20de%20Esna.Egipto_.jpg.webp" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" data-original-height="750" data-original-width="1000" height="240" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjqeZSOqHG0ja2UxUgAjecWDDYQMIgqUS_5CQOe4WZk2wAgatT7Cqv69ZnMxh_CncV0bKRTa-Zg_kEfEBoUDnaCPW_cPgNOlUaYAvw6Sn3mrUdo7y5tqGjVOjeYqjx_lP3t4sVrq19AelSfhMETVe8bp-sFaRx9ouj-gIWws108pE66Wc88MyJn-znhWqo/s320/2.%20escorpia%CC%83o_Templo%20de%20Esna.Egipto_.jpg.webp" width="320" /></a></div><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;"> </span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 26pt;">A</span><span style="font-size: 14pt;">té o grande Fernando Pessoa, Gémeos com ascendente em Escorpião, se deixou seduzir pela Astrologia. Fez cartas astrológicas dos grandes génios da humanidade e, até, a de D.Sebastião. Richard Zenith, na monumental e recente biografia do talentoso poeta, explorou esse aspeto. Isso sim, isso seria o zénite da nossa fé nos astros. Em vez da Maya... termos o Pessoa a analisar-nos.<o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;"> </span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 26pt;">A</span><span style="font-size: 14pt;">pesar da minha “carta” dizer que eu sou hábil de mãos - a não ser que se refira à minha destreza de talheres ao almoço - sempre achei, e ainda acho, que a Astrologia é muito bem achada. Na altura em que lia sobre signos, na tentativa de ser “um comunicador vivo e agradável”, encontrava, sem dificuldades, características comuns a pessoas de um determinado signo. Gostava do bom-humor e descontração dos Sagitários, da clareza dos Leões, do apurado sentido autocrítico dos Virgens, da solidez dos Capricórnios, e conseguia, frequentemente, adivinhar o signo do interlocutor se já há algum tempo o conhecesse. Era divertido e fazia sentido. Já o Einstein havia teorizado sobre as ondas gravitacionais, sem sequer as definir matematicamente. A posição dos planetas, dos seus satélites, altera tudo. E se tem influência em marés e órbitas, por que não o terá nos espíritos de quem nasce?<o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;">E, na verdade, encaixei na perfeição, como prevê a astrologia, na primeira namorada Carneiro que tive (e ainda tenho). A coragem e o instinto do Carneiro completam-me e domesticam a minha tendência para a dispersão. Consigo ir sempre mais longe ao lado de um Carneiro, ou, pelo menos, saber onde estou.<o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;"><br /></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"></p><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhZZZMJuY1QVWRqizDvfLucxvjJg8LNMFNRdhdfFWVp5bNwPxGvN6ertJcrr6QZHjoCYE4y2f-rRiMgPH6RizgD-TJZOYaNZiiK_0F2rNNd0VoJ6aBFs7lY2xc_SgXZQQNESVkhExyIAGFy1ZrW7mDOSHYYhnQeSCvXs66MlUgNcc5SotcaL6oOZdD7wlM/s640/2.%20Zodi%CC%81aco_templo%20hebreu.jpg" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" data-original-height="480" data-original-width="640" height="240" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhZZZMJuY1QVWRqizDvfLucxvjJg8LNMFNRdhdfFWVp5bNwPxGvN6ertJcrr6QZHjoCYE4y2f-rRiMgPH6RizgD-TJZOYaNZiiK_0F2rNNd0VoJ6aBFs7lY2xc_SgXZQQNESVkhExyIAGFy1ZrW7mDOSHYYhnQeSCvXs66MlUgNcc5SotcaL6oOZdD7wlM/s320/2.%20Zodi%CC%81aco_templo%20hebreu.jpg" width="320" /></a></div><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><br /></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 26pt;">O</span><span style="font-size: 14pt;"> falecimento dos signos, o desaparecimento da sua discussão redonda, é mais grave que o <i>déficit </i>das contas públicas ou, arriscaria até, é mais preocupante que o aquecimento global. <o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;">A discussão sobre os signos era, no fundo, já não é, uma discussão sobre nós próprios e, ao mesmo tempo, sobre os outros. Sobre o caráter e não sobre as nalgas. Sobre a maneira como nos encaixamos na vida e não sobre a forma como metemos <i>likes </i>e um algoritmo nos faz a folha em função disso. O horóscopo era um saudável aviso e não esta indignação constante que chateia. <o:p></o:p></span></p><p><span style="font-family: "Times New Roman", serif; font-size: 14pt; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;">Em vez de sermos bombardeados pelos comentadores com o “cada macaco no seu galho” poderíamos, com tranquilidade reflexiva, perceber que o caranguejo António Costa não liga muito bem com o sagitário Marcelo. Os problemas institucionais não têm a gravidade que se lhes atribui, pois tudo resulta apenas da incompatibilidade entre signos de Água e de Fogo. Leio numa página da especialidade: “para que essa combinação possa funcionar, é de grande importância que o Sagitário aprenda a desenvolver a diplomacia, e o Caranguejo deixe de ser um pouco sensível às críticas que pode receber de seu parceiro, aprendendo a toma-las como comentários construtivos”. É isto o que, no fundo, se passa na política nacional. Há que, rapidamente, substituir politólogos por astrólogos. Seria, pelo menos, mais divertido.</span> </p><p><br /></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 9pt;"><i><span style="font-size: 9pt;">“A astrologia é verificável, se alguém se der ao trabalho de a verificar. (...) A razão pela qual [os astros] nos influenciam é de ordem metafísica e não perturba o facto, uma vez que verifiquemos que se trata de um facto.”<o:p></o:p></span></i></p><p align="right" class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: right; text-indent: 9pt;"><span style="font-size: 9pt;">Fernando Pessoa. </span><i><span style="font-size: 9pt;">Heróstrato (inacabado).</span></i><span style="font-size: 9pt;"> 1929.</span><span style="font-size: 9pt;"><o:p></o:p></span></p><p align="right" class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: right; text-indent: 9pt;"><span style="font-size: 9pt;"><br /></span></p><p class="MsoNormal" style="margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 9pt;"><span style="font-family: "Times New Roman", serif; font-size: 12px;">Publicado <i>in</i> O Comércio de Guimarães, a 20 de setembro de 2023</span></p><p class="MsoNormal" style="margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 9pt;"><span style="font-family: "Times New Roman", serif; font-size: 12px;"><br /></span></p><p class="MsoNormal" style="margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 9pt;"><span style="font-family: "Times New Roman", serif; font-size: 12px;">Imagens: Sinagoga séc.VI, Torre </span><span style="font-family: Times New Roman, serif;"><span style="font-size: 12px;">dell'Orlogio - Veneza, Templo de Esna-Egipto, Templo Hebreu</span></span></p>Rui Vítor Costahttp://www.blogger.com/profile/07059965221323441539noreply@blogger.com1tag:blogger.com,1999:blog-1159177454361764807.post-72886102397364020422023-08-15T08:59:00.000+01:002023-08-15T08:59:00.942+01:00Get a life!<p></p><p class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-indent: 7.1pt; text-justify: inter-ideograph;"></p><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEh-pGQTBT3viuM9KYX7Svb9hIT2UpGCcv_BCIKd-7Gd1xlBirT4P6_LhP3fM9gdXospBTxcN3F5oNPA9DTt8cEDl1VzpmwfNmAizhb4nupIiniBiVLfug3Pi1PLXF5TdwJM_8_ofh7kmxT2dRHOChYUZvJOvwZSZiaRpP2TeulyRH7fbrmeVMLmfqcaYm8/s300/elanaveva001.jpg" imageanchor="1" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" data-original-height="200" data-original-width="300" height="224" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEh-pGQTBT3viuM9KYX7Svb9hIT2UpGCcv_BCIKd-7Gd1xlBirT4P6_LhP3fM9gdXospBTxcN3F5oNPA9DTt8cEDl1VzpmwfNmAizhb4nupIiniBiVLfug3Pi1PLXF5TdwJM_8_ofh7kmxT2dRHOChYUZvJOvwZSZiaRpP2TeulyRH7fbrmeVMLmfqcaYm8/w336-h224/elanaveva001.jpg" width="336" /></a></div><br /><span style="font-size: 14.0pt; mso-bidi-font-size: 10.5pt;"><br /></span><p></p><p class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-indent: 7.1pt; text-justify: inter-ideograph;"><span style="font-size: 14.0pt; mso-bidi-font-size: 10.5pt;">Saí
do nosso estádio, no jogo contra os eslovenos, antes do prolongamento. Saí
porque tinha combinado jantar com a minha mulher, às 10 horas, pois julgava ser
esse o tempo suficiente, mas saí, sobretudo, confesso, por cobardia. Não tenho
já coragem para me confrontar com as centenas de apopléticos que destilam ódio
e fel para cima dos profissionais do meu clube, uma minoria ruidosa. Acho isso
indigno. Revolve-me o estômago o pessoal do “Rua Moreno!”, do “Rua Presidente!”,
do filho deste e filho daquele, do pessoal que vai pressurosamente equipado de
lencinho branco para achincalhar, para humilhar. Fico com náuseas quando se
confunde vitorianismo com o insulto gratuito. Deprime-me imenso que o fulano
que acabou de exibir, nas redes sociais, o reluzente cartão do bebé Inácio, recém-nascido,
sócio 38.421 do Vitória Sport Clube, exiba igualmente, passado umas horas, com
o mesmo despropósito, o seu fel envelhecido em cascos de carvalho, mas que, ao
contrário das bebidas espirituosas, se comporta como um espumante agitado.
Salta-lhes a rolha com facilidade. Sim, do Vitória Sport Clube: Vitória de
Guimarães nunca, nem pensar, eu nem sei onde fica Guimarães … alimentando até
ao enjoo a discussão mais estéril e parva do universo vitoriano.<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-indent: 7.1pt; text-justify: inter-ideograph;"><span style="font-size: 14.0pt; mso-bidi-font-size: 10.5pt;"><o:p> </o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-indent: 7.1pt; text-justify: inter-ideograph;"><span style="font-size: 14.0pt; mso-bidi-font-size: 10.5pt;">Já
tenho idade suficiente para ter ouvido um conjunto de torpes justificações
sobre coisas absolutamente injustificáveis. Uma delas era o de bater na mulher,
só porque sim. E havia uma ou outra vítima, que, tolhida de medo, dizia que o
marido lhe batia pelo facto de ainda gostar dela. Pobres mulheres e pobre
intelecto que assim procurava justificar a indignidade de que se foi vítima. Hoje
isso está “fora de moda”: a justificação, não o ato, infelizmente. <o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-indent: 7.1pt; text-justify: inter-ideograph;"><span style="font-size: 14.0pt; mso-bidi-font-size: 10.5pt;">O
futebol é ainda hoje um caldo dessa cultura acéfala, gratuita e violenta. Tudo
o que é ódio vai parar ao futebol. Tudo que é lixo humano, agora ampliado de
forma demente pelas redes sociais, tem nele o seu palco privilegiado.</span></p>
<p class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-indent: 7.1pt; text-justify: inter-ideograph;"><span style="font-size: 14.0pt; mso-bidi-font-size: 10.5pt;">A
demissão de Moreno, com o estado de alma de quem o quis ouvir, é, apesar da
mensagem pessoal de preservação de uma dignidade própria, uma derrota do vitorianismo
em detrimento do insulto. Como é óbvio – e até humano, diria – o Moreno errou
muitas vezes, mas sempre foi um excelente profissional, quer como jogador, quer
como treinador. A época passada foi um claro e comprovado exemplo de
capacidade, perante as limitações da equipa. Por isso, não partilho dos elogios
que agora se fazem – muito deles profundamente hipócritas – e senti-me
desiludido com um treinador que sempre defendi, mesmo na altura em que o pessoal
pegava no lencinho branco antes de assistir ao jogo. Fiquei desiludido e
profundamente preocupado.<o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-justify: inter-ideograph;"><span style="font-size: 14.0pt; mso-bidi-font-size: 10.5pt;"><o:p> </o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-indent: 7.1pt; text-justify: inter-ideograph;"><span style="font-size: 14.0pt; mso-bidi-font-size: 10.5pt;">Não,
não se bate na mulher porque (se diz que) dela se gosta. Bate-se na mulher
porque se é um indivíduo violento e sem carácter, um ser torpe que se compraz
com o sofrimento alheio. Não, não se gosta mais do clube porque se escreve
sobre ele dia sim, dia sim, porque se rasgam vestes e se exibe a fotografia da
mulher que à noite se sova, porque se fala do clube achincalhando sempre
alguém, só porque a vida pessoal de quem assim procede não tem qualquer sentido
que não seja o de fazer da vida dos outros um inferno. Em inglês há a expressão
<i style="mso-bidi-font-style: normal;">get a life!</i> Esta expressão diz-se a
quem só sabe chatear, a quem só sabe dizer mal e nada faz de positivo com a sua
própria existência. Neste caso a expressão bateu do lado errado … e lá foi
Moreno ter a sua vida, em vez dos maldispostos do costume. <o:p></o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-indent: 7.1pt; text-justify: inter-ideograph;"><span style="font-size: 14.0pt; mso-bidi-font-size: 10.5pt;"><o:p> </o:p></span></p>
<p class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-indent: 7.1pt; text-justify: inter-ideograph;"><span style="font-size: 14.0pt; mso-bidi-font-size: 10.5pt;">Há
animais, não sei se aranhas ou víboras, ou se sou eu a inventar, que precisam
de cravar o veneno na vítima com alguma regularidade, senão morrem da própria
malignidade que segregam em abundância. E se não contratássemos treinador
nenhum nas próximas jornadas para ver se o mesmo se aplica a alguns espécimes
do género humano? Para que quem já espuma por mandar para a rua o próximo
treinador sufocasse no seu próprio insulto. <i style="mso-bidi-font-style: normal;">Se
non è vero, è ben trovato</i>, diria o italiano.<o:p></o:p></span></p><br /><p></p><p><br /></p><p></p><p class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-indent: 7.1pt; text-justify: inter-ideograph;"><i><span style="font-size: 10.0pt;">Imagem: E la nave va.
Fellini.1983.<o:p></o:p></span></i></p><p class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-indent: 7.1pt; text-justify: inter-ideograph;"><i><span style="font-size: 10.0pt;"><br /></span></i></p><p class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-indent: 7.1pt; text-justify: inter-ideograph;"><i><span style="font-size: 10.0pt;">Publicado in Desportivo de Guimarães a 14 de agosto de 2023</span></i></p><br /><p></p>Rui Vítor Costahttp://www.blogger.com/profile/07059965221323441539noreply@blogger.com1tag:blogger.com,1999:blog-1159177454361764807.post-28088446992822489202023-07-12T10:01:00.001+01:002023-07-12T10:01:35.712+01:00VÍCIOS PÚBLICOS<p> </p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 26pt;">U</span><span style="font-size: 14pt;">m país que teve, na semana passada, a polémica do Rock in Rio Febras e o presidente da República a comentar, à saída do hospital, com impecável requinte, as causas da sua macacoa, é mesmo um querido país. O humor acima de tudo. O humor para desarmar esta chatice galâmbica que ocupa diariamente os noticiários. <o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;">A linda freguesia de São Salvador de Briteiros, uma das mais bonitas do concelho, banhada pelos pequenos rios Torto e Febras, passou para o noticiário nacional por via de uma embirração de uma megaempresa, e ainda bem. O facto permitiu aos amigos que organizam o festival da freguesia tornarem-se conhecidos e terem a oportunidade de gozarem (soberbamente) com o pagode. Pena é que esta visibilidade não tenha sido há mais tempo, e, quiçá, possibilitasse, assim, terem-se salvado os inúmeros moinhos, centenários, que foram destruídos pelo tempo e pela cegueira das instituições públicas. Apesar do esforço do saudoso Eng. Inácio Vasconcelos e dos seus amigos que vivem <i>around</i>Rio Febras, muitos dos moinhos desapareceram da paisagem ou continuam, ainda hoje, a degradarem-se de forma inglória. <o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;">Noutra latitude de preocupação, o Presidente comentou, de forma impecável o seu piripaque. Quantos habitantes de qualquer país do mundo têm nas declarações do seu presidente motivos para sorrir? Poucos ou nenhuns, tirando nós. Ao que ele acrescentou, sempre com um ar pedagógico, que a coisa correu mal pois depois do seu almoço de iogurte energético acrescentou um moscatel, já quente. Era óbvio que só poderia correr mal, mas fica o aviso. <o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;"> </span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"></p><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhhCDm96boydWPiAjYj9w11Fug9TgYSFumkaCZflpduU_3IooF6_cS2HcujOBeei-FC6RODcjwBQ5q-PvbCezqTS_Gxp4Rpg2xey_fGmWp_sqhnC0RFfMENh1A_zRnUqIF59SxaWZ7FvhOlRgV79sPHgMiLX9zkcl-1BaxYu8EE4ddILAPICwO0fNJYx5s/s754/c2fa78c2ec8bb5200f54536d1885c40d-754x394.jpg" imageanchor="1" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" data-original-height="394" data-original-width="754" height="167" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhhCDm96boydWPiAjYj9w11Fug9TgYSFumkaCZflpduU_3IooF6_cS2HcujOBeei-FC6RODcjwBQ5q-PvbCezqTS_Gxp4Rpg2xey_fGmWp_sqhnC0RFfMENh1A_zRnUqIF59SxaWZ7FvhOlRgV79sPHgMiLX9zkcl-1BaxYu8EE4ddILAPICwO0fNJYx5s/s320/c2fa78c2ec8bb5200f54536d1885c40d-754x394.jpg" width="320" /></a></div><span style="font-size: 14pt;"><br /></span><p></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 26pt;">A</span><span style="font-size: 14pt;"> sacralização dos poderosos é aborrecida, sejam eles empresas ou presidentes. E o sagrado vive sempre de uma noção forte, e bem definida, de pecado. Pertenço a uma geração cuja educação católica ainda dava um sentido pesado de pecado. No entanto, creio, ao contrário de gerações anteriores, a abertura ao mundo, nem que fosse apenas ao rock britânico, deu-nos, já adolescentes, uma tremenda vontade de pecar. E assim, diligentemente, o fizemos.<o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;">A ideia de pecado parece uma coisa antiga, passada, mas não o é. Acredito que os sete pecados mortais já não estão em vigor, já prescreveram com a realidade, ou alguém meteu uma providência cautelar para que – pelo menos - a Ganância, o Orgulho, ou a Ira, não sejam já considerados pecados mortais. Pelo contrário. É só viver no mundo atual e estar atento para ver que esses três pecados passaram, magicamente, a virtudes.<o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;"><br /></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"></p><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhNL8_6vgIdSoNyuXe0M55mllat4sKxoHkqdjcfU3mrW2XZCS8w_H-T0S6e7LYAtV88WE_LodJDHyTmvs37GyHItKkk_xS1JEFsSx7pbZP5iFtW5m5zfmFnhyb0XMsmCtTVE5KXT7Gtj7XRY3i_kjKtAtpNQeAXGKTScfh3u5xbwLyamrmD7y6Sh2TxHvo/s700/Je%CC%81ro%CC%82me_Bosch-Les_7_Pe%CC%81che%CC%81s_Capitaux.jpg" imageanchor="1" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" data-original-height="692" data-original-width="700" height="316" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhNL8_6vgIdSoNyuXe0M55mllat4sKxoHkqdjcfU3mrW2XZCS8w_H-T0S6e7LYAtV88WE_LodJDHyTmvs37GyHItKkk_xS1JEFsSx7pbZP5iFtW5m5zfmFnhyb0XMsmCtTVE5KXT7Gtj7XRY3i_kjKtAtpNQeAXGKTScfh3u5xbwLyamrmD7y6Sh2TxHvo/s320/Je%CC%81ro%CC%82me_Bosch-Les_7_Pe%CC%81che%CC%81s_Capitaux.jpg" width="320" /></a></div><span style="font-size: 14pt;"><br /></span><p></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;"> </span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 26pt;">A</span><span style="font-size: 14pt;">s sociedades por mais modernas que sejam, não escapam -nem querem- à noção de pecado. Chamam-lhe outra coisa, mas a tendência para a evangelização do medo continua intocável. <o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;">O novo pecado é fumar.<o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;">Evolui-se bastante – e ainda bem – nas proibições do fumo. Era absurdo estarmos a comer – o pecado da Gula – e o fumo penetrar nas carnes já diligentemente fumadas. Era absurdo viajarmos de autocarro e o pessoal ir esfumaçando alegremente no nosso sono. No entanto, a coisa está-se a tornar difícil para os fumadores. Sinto-me olhado, muitas vezes de lado, por jovens cheios de saúde como se estivesse a esquartejar um gato vivo em plena rua. Para desgraça dos meus pulmões associo o fumo à criatividade. Não há texto que comece a escrever, nem ideia que me teime em fugir, que eu não aprisione e domestique no mágico intervalo de uma baforada. Há qualquer coisa de sensitivo no queimar do tabaco a que não escapo. Não me vejo a fumar aquelas coisas elétricas. Não têm a elegância de um cigarro. A diferença entre fumadores como eu e os vaporizados é a mesma diferença, de estatuto, que existe entre o músico de orquestra e um tocador de ocarina. Estamos em dimensões diferentes do vício. Não ficamos apenas pela nicotina, necessitamos do ritual. Somos clássicos, somos património.<o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;"><br /></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"></p><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEidyVJRprRa06WezSwIE9OXOSLItg64GELigV-7ZDAaCJvTWe3IRUil4ueeveVLSwXSUrgf1ZtBnnnl20Dr3jgI1vbMWSmYQs0EHr3NkLKvTkpvAHZc1UBqanJKFn-pDdp2o8bvToEijMolAfDwXLBFss-kRfzpYcCPJ4lOrdVnOxFLPXK50C8qi0akG4E/s512/o-albert-camus-facebook.jpg.webp" imageanchor="1" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" data-original-height="320" data-original-width="512" height="200" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEidyVJRprRa06WezSwIE9OXOSLItg64GELigV-7ZDAaCJvTWe3IRUil4ueeveVLSwXSUrgf1ZtBnnnl20Dr3jgI1vbMWSmYQs0EHr3NkLKvTkpvAHZc1UBqanJKFn-pDdp2o8bvToEijMolAfDwXLBFss-kRfzpYcCPJ4lOrdVnOxFLPXK50C8qi0akG4E/s320/o-albert-camus-facebook.jpg.webp" width="320" /></a></div><p></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><br /></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 26pt;">A</span><span style="font-size: 14pt;"> Muralha, com o apoio da Oficina, vai promover a exposição sobre pontes de Guimarães, com fotografia do Miguel Oliveira. A exposição abrirá a 27 de Julho na Escola Francisco de Holanda, fazendo parte do programa das Gualterianas, e estender-se-á até meados de setembro. A visitar, sem dúvida. Nela poderemos ver muitas das pontes romanas, românicas, ou nem uma coisa nem outra, que pontuam a paisagem do concelho de Guimarães, de norte a sul, de este a oeste. Umas conhecidas, outras nem por isso. Umas belas, completamente fundidas na paisagem, outras estragadas pelo utilitarismo cego, umas simples, outras complexas, mas que, cada uma delas, nos contam uma história de tempo, de persistência e de ligação. O <i>Regresso às Pontes de Guimarães</i> mimetiza uma exposição de 2010 (<i>Sobre Pontes</i>), coordenada pelo nosso amigo Dr. Fernando Conceição, que nela pensou e a ela se dedicou. Recordaremos a ideia como homenagem ao seu centenário natalício. A defesa do património comum é um vício bom.<o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;"><br /></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 9pt;"><i><span style="font-size: 9pt;">"</span></i><i><span style="font-family: Calibri, sans-serif; font-size: 10.5pt;">(...)</span></i><i><span style="font-family: Calibri, sans-serif; font-size: 11pt;"> </span></i><i><span style="font-size: 9pt;">não havia muitas coisas que gratificassem mais os depressivos do que as notícias verdadeiramente más.”<o:p></o:p></span></i></p><p align="right" class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: right; text-indent: 9pt;"><span style="font-size: 9pt;">Jonathan Franzen. </span><i><span style="font-size: 9pt;">Liberdade.</span></i><span style="font-size: 9pt;"> 2011.</span><span style="font-size: 9pt;"><o:p></o:p></span></p><p align="right" class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: right; text-indent: 9pt;"><span style="font-size: 9pt;"><br /></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: right; text-indent: 9pt;"><span style="font-size: 9pt;"><br /></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: left; text-indent: 9pt;"><span style="font-size: 9pt;">Publicado in O Comércio de Guimarães a 12 de julho de 2023</span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: left; text-indent: 9pt;"><span style="font-size: 9pt;"><br /></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: left; text-indent: 9pt;"><span style="font-size: 9pt;">Imagens: Rock in Rio Febras//Hieronimus Bosch, os sete pecados capitais//Albert Camus</span></p>Rui Vítor Costahttp://www.blogger.com/profile/07059965221323441539noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-1159177454361764807.post-58263630972274748842023-06-14T07:46:00.001+01:002023-06-14T07:46:50.309+01:00DISTRAÍDOS<p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 26pt;">A</span><span style="font-size: 14pt;"> preocupação de compreender os outros, de não os rotular e desprezar, é um ganho de civilização, e, em muitos casos, acompanha a nossa maturidade enquanto seres humanos que conseguem dominar (com algum esforço) o seu egoísmo natural. Já no meu tempo de estudante do secundário havia algum cuidado para não magoar – pelo menos de forma vigorosa – os colegas. Nada que se compare com a desproporção dos dias de hoje quanto ao politicamente correto, mas havia um vislumbre dessa preocupação, em especial para com os amigos. Distraído era o eufemismo usado para não aplicar diretamente o adjetivo burro. O Euclides é um pouco distraído, coitado, a matemática resvala-lhe na distração.<o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;"><br /></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"></p><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgHsNXm4CFkOzUSfSwVLqHTdUG-6Yu4SlIK2nCsxSOdCIjt_74BQ92fvPOZPxOZLttGHNQk1ucayGQDGiSQR9TIoviLPyoGwZlEQo1pP65kEOaFsFFu8XZERCQTqShd7ye8AXhJuniYHx0ipg_ugHysqqHNMezR-15TZh3WmmfttlbKiQL8WEcBKpKi/s510/distortion-49-1933.jpg" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" data-original-height="398" data-original-width="510" height="250" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgHsNXm4CFkOzUSfSwVLqHTdUG-6Yu4SlIK2nCsxSOdCIjt_74BQ92fvPOZPxOZLttGHNQk1ucayGQDGiSQR9TIoviLPyoGwZlEQo1pP65kEOaFsFFu8XZERCQTqShd7ye8AXhJuniYHx0ipg_ugHysqqHNMezR-15TZh3WmmfttlbKiQL8WEcBKpKi/s320/distortion-49-1933.jpg" width="320" /></a></div><p></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><br /></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 26pt;">A</span><span style="font-size: 14pt;">tualmente nem isso. Os burros desapareceram das escolas por magia das leis integrativas, e até os distraídos deixaram de o ser, pelo surpreendente efeito do despacho de sua excelência, o secretário de estado da coisa. Vivemos, por decreto, num país de génios e, quantas vezes, num país de sobredotados. A vulgaridade, a incompetência, a preguiça, já não existem mais. Seja a vulgaridade messiânica de uma Cristina Ferreira, ou a vulgaridade egocêntrica de um Cristiano Ronaldo, pois quem assim o acha é, simplesmente, um invejoso. E fim de conversa! O sucesso vai substituindo o valor da inteligência, já que a primeira é mensurável e a segunda meramente reflexiva.<o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;"><br /></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"></p><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjJ9-OF0yuXgHY3oioiZHGutnSey-4pjeZWppIkZIZ0wvsiC7XvarCIVECjAZevPpPiSGXdgbI5ixKzXe4ITvjzDt1XEH6K2cUXzOy34qx_coQJwhWjAaAGp3bljeLUhTZ4gwUyKgCCEHHo3oQQ6JC8YYin4IG9Wm-OUA8_L61huC-Pl8-QCwYJpEcm/s468/clock-of-the-acad-mie-fran-aise-paris-1932.jpg" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" data-original-height="430" data-original-width="468" height="294" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjJ9-OF0yuXgHY3oioiZHGutnSey-4pjeZWppIkZIZ0wvsiC7XvarCIVECjAZevPpPiSGXdgbI5ixKzXe4ITvjzDt1XEH6K2cUXzOy34qx_coQJwhWjAaAGp3bljeLUhTZ4gwUyKgCCEHHo3oQQ6JC8YYin4IG9Wm-OUA8_L61huC-Pl8-QCwYJpEcm/s320/clock-of-the-acad-mie-fran-aise-paris-1932.jpg" width="320" /></a></div><p></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;"> </span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 26pt;">N</span><span style="font-size: 14pt;">o fundo, quando a maioria não se consegue concentrar em nada, a vulgaridade vence. Pensar dá trabalho, ver um filme que necessite mais de atenção do que de pipocas dá igualmente trabalho, ler dá trabalho, procurar perceber as ideias dos outros é extenuante. A vida em sociedade assemelha-se a uma aula caótica em que o professor – suponhamos Deus – não consegue captar a mínima atenção dos seus alunos. Passa-se de ano apenas porque não há condições logísticas de chumbar tanta gente. E erra-se constantemente porque não se aprendeu o que se deveria saber. É só olhar para as comissões parlamentares de inquérito. Ninguém leva a sua função a sério, pois estava distraído quando deveria ter estado atento. E o mais incrível e paradoxal é que a mentira que procura dissimular a falha do inquirido é que realmente dá trabalho: para se mentir bem é preciso ver todas as possibilidades de ser apanhado, todas as incongruências, todo o sentido das palavras que se dizem. Perdem-se seguramente dias e longas noites a preparar uma boa mentira, o aparelho de estado pára para se ensaiar a peça que deve ser debitada sem hesitações ou falhas. No fundo, o método é muito parecido com os alunos que gastavam mais horas a fazer cábulas, do que o tempo que seria necessário para aprender aquilo que as cábulas continham. Ou o empregado que trabalha imenso para não trabalhar, que passa apressado para sítio nenhum só para não servir a mesa que desespera perante o serviço. Ficam, por vezes, exaustos, governantes e empregados de mesa, mais a destrabalhar do que a trabalhar. No entanto, O’Neill, à cautela, preferia que o seu burocrata destrabalhasse do que trabalhasse. Não estaria habituado ao trabalho alheio. O país, mesmo sem o O’Neill para nisso reparar, continua a destrabalhar com imensa convicção e proficiência, diga-se.<o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;"> </span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"></p><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjSSsx3imZACf_-tKxX7d15Sl8jSppsGfL8hxoxUlP7R8i9nMk6L0wF0M5DLHyi5GlP2gcXGEShPWGH992Bg9PEk3CnojBN47RCR1v3s7g4g5xNol6253qKC3zVtJsvqBsOVV_iMjlZnSth3RX8C58pbsqqWWitKYdFBClkYybvGnEEGjY8OGKTzMLD/s500/champs-elys-es-paris-1929.jpg" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" data-original-height="395" data-original-width="500" height="253" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjSSsx3imZACf_-tKxX7d15Sl8jSppsGfL8hxoxUlP7R8i9nMk6L0wF0M5DLHyi5GlP2gcXGEShPWGH992Bg9PEk3CnojBN47RCR1v3s7g4g5xNol6253qKC3zVtJsvqBsOVV_iMjlZnSth3RX8C58pbsqqWWitKYdFBClkYybvGnEEGjY8OGKTzMLD/s320/champs-elys-es-paris-1929.jpg" width="320" /></a></div><span style="font-size: 14pt;"><br /></span><p></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 26pt;">E</span><span style="font-size: 14pt;"> porque raio é tanta gente distraída nos dias que passam?<o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;">Paradoxalmente porque está toda a gente imensamente concentrada ... em si mesma. Essa é a forma suprema de estar distraído com tudo o resto. Enquanto o Universo – e com ele o nosso passado – nos abre horizontes por força da tecnologia espacial, cada um de nós passa a fechar-se em si mesmo, no grão atómico que cada existência individual representa.<o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;">Não é estranho que a grande questão filosófica do sentido da vida se tenha evaporado tão facilmente da mente de cada um de nós, das discussões de final de noite? Quantas horas passávamos a discutir esse tema indiscutível? Apesar da inutilidade das respostas era a maneira de sairmos de dentro da nossa existência, para tentar perceber o nosso papel no gigantismo universal e temporal em que estávamos imersos. Hoje o universo é cada um. Hoje todos acham que podem desempenhar o papel principal, já que a incompetência não existe, existe apenas uma síndrome qualquer que a explica e justifica. E quando assim é não há Shakespeare ou Dostoievsky que aguentem, pois, as suas personagens secundárias exigem todas o papel principal. Uma chatice. E faz-se fila para que uma voz esganiçada nos dê respostas aos nossos problemas complexos, por 19€, enquanto as respostas (certas ou erradas) ficam submersas no nosso interior por preguiça, por destrabalho, por injustificável distração. Ou, tantas vezes, pela inqualificável preguiça de chatear um amigo nosso e lhe dizer: <i>não estou nada bem</i>. E conversar sobre isso, com ele, as horas necessárias. Sim, conversar, aquela exótica atividade humana em que um fala e o outro ouve e responde.<o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;"><br /></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 9pt;"><i><span style="font-size: 9pt;">"Mas ... onde estávamos nós? Ah, sim, em que devia continuar os estudos em busca do sentido da vida.”<o:p></o:p></span></i></p><p align="right" class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: right; text-indent: 9pt;"><span style="font-size: 9pt;">Almada Negreiros. </span><i><span style="font-size: 9pt;">Nome de Guerra.</span></i><span style="font-size: 9pt;"> 1925.</span><span style="font-size: 9pt;"><o:p></o:p></span></p><p align="right" class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: right; text-indent: 9pt;"><span style="font-size: 9pt;"><br /></span></p><p class="MsoNormal" style="margin: 0cm; text-align: left; text-indent: 9pt;"><span style="font-family: "Times New Roman", serif; font-size: 9pt;">Imagens do fotógrafo </span><span style="font-family: Times New Roman, serif;"><span style="font-size: 12px;">Andre Kertesz: Distorção #49 (1933), O Relógio da Academia Francesa (1932) e Campos Elísios (1929)</span></span></p><p class="MsoNormal" style="margin: 0cm; text-align: left; text-indent: 9pt;"><span style="font-family: Times New Roman, serif;"><span style="font-size: 12px;"><br /></span></span></p><p class="MsoNormal" style="margin: 0cm; text-align: left; text-indent: 9pt;"><span style="font-family: Times New Roman, serif;"><span style="font-size: 12px;">Publicado in O Comércio de Guimarães a 14 de junho de 2023</span></span></p>Rui Vítor Costahttp://www.blogger.com/profile/07059965221323441539noreply@blogger.com2tag:blogger.com,1999:blog-1159177454361764807.post-45860601562393345712023-05-17T07:59:00.003+01:002023-05-17T07:59:25.976+01:00TEMA LIVRE<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgd2rqiamYxdWnmYcpEa_SYMIjsQvXCoI4rxaMPlh0JVdVqveEKjU8cCvESVRzx0gWu8yf6HN4B26GfwohxMdWaJ9iShNBxLCjwJNZe6b9JQx06GcZ6JwgW9lf_-qE3jbfiTL6SARlIrulbGHti24g_t5RTmNrQMr1qCoCj9IGpjDDQiaHqqYwe6yBY/s1650/2017_NYR_14187_0006B_000cy_twombly_leda_and_the_swan.jpg.webp" imageanchor="1" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" data-original-height="1520" data-original-width="1650" height="295" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgd2rqiamYxdWnmYcpEa_SYMIjsQvXCoI4rxaMPlh0JVdVqveEKjU8cCvESVRzx0gWu8yf6HN4B26GfwohxMdWaJ9iShNBxLCjwJNZe6b9JQx06GcZ6JwgW9lf_-qE3jbfiTL6SARlIrulbGHti24g_t5RTmNrQMr1qCoCj9IGpjDDQiaHqqYwe6yBY/s320/2017_NYR_14187_0006B_000cy_twombly_leda_and_the_swan.jpg.webp" width="320" /></a></div><p> <span style="font-family: "Times New Roman", serif; font-size: 26pt; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;">O</span><span style="font-family: "Times New Roman", serif; font-size: 14pt; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"> momento da redação era um momento especial. A professora, depois da chamada lenta, ordenada e repetitiva dos nomes, comunicava à turma que naquele dia, era dia de redação. Sem a esquizofrenia metodológica dos dias de hoje. Apetecia-lhe, apenas isso.</span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;">Saíamos assim, nesse dia, do torpor habitual das aulas. O som do rasgar das folhas dos cadernos, onde assentaríamos pela escrita a nossa imaginação, ou a falta dela, alastrava pela sala numa a cacofonia de papel. Aquela horinha seria dedicada à fantasia que sobrevivia em cada um de nós. A professora desfolharia tranquilamente o jornal, enquanto a turma se afadigava a pensar coisas e a escrever coisas. Era um saudável exercício de silêncio, mesmo nas turmas mais barulhentas. Uns porque as ideias se atropelavam e era preciso domesticá-las, travando o ímpeto das palavras de uma forma meditativa, outros porque as ideias tinham graves dificuldades para boiarem no pensamento e era preciso esperar, com um intrigante ar bovino, que elas chegassem à tona.<o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;"><br /></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"></p><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgVpGKagyrSYJRG7ngzNe2B9fyJqqPG88376nx3rVRCPmDnkrYCtdK8-jC06AWsFEeQkyyfyOQ3GjkU4SAs_UfJs4KaUJgzw25WtlwGepXjb_wpgt400_yEZkCpxIYVwHC9f3wFE2hmU46igHYGQ_9cN1Y72pzozK26sydm6-AAwjKjkdkkD1a8EVi6/s1074/Vassily_Kandinsky,_1923_-_Circles_in_a_Circle.jpg" imageanchor="1" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" data-original-height="1074" data-original-width="1074" height="320" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgVpGKagyrSYJRG7ngzNe2B9fyJqqPG88376nx3rVRCPmDnkrYCtdK8-jC06AWsFEeQkyyfyOQ3GjkU4SAs_UfJs4KaUJgzw25WtlwGepXjb_wpgt400_yEZkCpxIYVwHC9f3wFE2hmU46igHYGQ_9cN1Y72pzozK26sydm6-AAwjKjkdkkD1a8EVi6/s320/Vassily_Kandinsky,_1923_-_Circles_in_a_Circle.jpg" width="320" /></a></div><p></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><br /></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 26pt;">H</span><span style="font-size: 14pt;">oje diz-se composições: a redação tinha uma sonoridade demasiado operária e foi necessário arranjar uma palavra mais pomposa, que afirme a genialidade (aparente) das novas gerações. Os jovens vão compor, nós, os mais antigos, redigíamos. Aliás, a redação/composição é já uma espécie de cadáver adiado, pois o exercício de escrever textos vai-se assemelhando a uma inútil excentricidade. A redação/composição cinge-se a normas pré-definidas, apertando definitivamente o cerco à imaginação. O cúmulo dessa disposição para a fantasia era, sem dúvida, o tema livre. Quando a professora dizia que o tema era, efetivamente, livre, perpassava pela sala um zum-zum aflito daqueles que não gostavam nada dessa liberdade criativa. No entanto, creio, nada aproximava mais professor e aluno que o tema livre. O aluno abria-se de forma inapelável ao professor e o professor, por entre notas, correções, sublinhados de um vermelho violento e zangado, conhecia um pouco melhor o que bailava na cabecinha dos adolescentes com os quais convivia.<o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;"> </span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"></p><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjfRWshi4M4lTIYRTSqNVIoQJOF8QoSJ3YzSSYKKn-8l71Lc_z3-jHnFaH5s_2jHoF_Ye8iiXZRLOh4HuPbJ9GMmObAk7vrnS5_8kQ4qnEUHNmB5x7eAvA1tSZP_UkZ7UZ0cRuqvfoQKos2etPBDmcibBH5OaqF4pV709dmJDRlVRx9bN_8r5Li0wHo/s560/a8c923e1-078d-4f94-b1f4-0e303afe2155__640.jpg" imageanchor="1" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" data-original-height="560" data-original-width="436" height="320" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjfRWshi4M4lTIYRTSqNVIoQJOF8QoSJ3YzSSYKKn-8l71Lc_z3-jHnFaH5s_2jHoF_Ye8iiXZRLOh4HuPbJ9GMmObAk7vrnS5_8kQ4qnEUHNmB5x7eAvA1tSZP_UkZ7UZ0cRuqvfoQKos2etPBDmcibBH5OaqF4pV709dmJDRlVRx9bN_8r5Li0wHo/s320/a8c923e1-078d-4f94-b1f4-0e303afe2155__640.jpg" width="249" /></a></div><span style="font-size: 14pt;"><br /></span><p></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 26pt;">N</span><span style="font-size: 14pt;">um desses dias de tema livre, provavelmente no 9ºano, enquanto eu me afadigava a escolher palavras que colorissem o meu tema livre, um companheiro de sempre, sentado à minha frente, balançava-se nervosamente na cadeira à procura que o movimento desentorpecesse a sua imaginação. No silêncio da sala pediu-me discretamente um tema livre. Um disparate. Se ele me pedisse a definição de esporos, ou a raiz quadrada de 144, dar-lhos-ia com recatada satisfação, agora um tema livre não se dá a ninguém, tem de sair de dentro. Ele é que não achou piada nenhuma à minha renitência e pediu-me novamente um tema livre, mas, agora, com uma autoridade desagradável que me fez rir, quase gargalhar, perante a aflição alheia. Da terceira vez que mo pediu, já haviam passado quase 20 minutos e a folha dele permanecia imaculada, fê-lo num movimento brusco e violento, já quase a prometer-me pancada, de tal forma que deu um jeito no pescoço e teve de sair da sala aos gritos perante a dor muscular e o olhar atónito, apesar de preocupado, da nossa professora. Foi, mesmo assim, apesar do sofrimento, um final feliz. Ele safou-se daquela redação, eu pude terminar o meu tema livre e a professora condoeu-se dele, já que desconhecia os pormenores da peripécia. <o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;"><br /></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"></p><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjiT6BJoVxaqA-9gPh617TuQnxsgrstVjLEU876VzXgHETcOUlUlUgQFs8yP_d-XCB4Kz-BX0YtTjK9pl-DVMD_wvWCIYWoM1PeET00zzzIReIC3owB2gAg7KrNPfwbx9wl7bJ5GVX9RewRqXOiIYeuRZaUpjJSExsYQTtxeWKTtK29dz1-DXoy6jBi/s685/autumn-rhythm-no-30-jackson%20pollock%20(1950).jpg.webp" imageanchor="1" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" data-original-height="351" data-original-width="685" height="164" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjiT6BJoVxaqA-9gPh617TuQnxsgrstVjLEU876VzXgHETcOUlUlUgQFs8yP_d-XCB4Kz-BX0YtTjK9pl-DVMD_wvWCIYWoM1PeET00zzzIReIC3owB2gAg7KrNPfwbx9wl7bJ5GVX9RewRqXOiIYeuRZaUpjJSExsYQTtxeWKTtK29dz1-DXoy6jBi/s320/autumn-rhythm-no-30-jackson%20pollock%20(1950).jpg.webp" width="320" /></a></div><p></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><br /></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 26pt;">F</span><span style="font-size: 14pt;">az hoje falta o tema livre. Enquanto a redação se afunda nas metodologias modernas, e a nossa realidade mediática anda sempre à volta do mesmo, enquanto as redes sociais tipificam a discussão e a “beleza” do rabo grande e do beicinho, aparelhamo-nos todos, na chamada “era da informação”, a um menu temático absolutamente previsível e enjoativo. A imaginação perde-se na argumentação servida <i>à la carte</i>, papagueada vezes sem conta, até ao pensamento se tornar inócuo e sem sentido. Os estímulos já não vêm de dentro, mas das notificações assobiadas nervosamente pelos telemóveis. Transformamo-nos todos, progressivamente, numa espécie de cão de Pavlov, reagindo a estímulos exteriores à nossa imaginação. Deixamos de ser o cientista para passarmos a ser o cão. Deixamos de ter ironia para passarmos a indignados crónicos. Os temas de discussão acabam por ser tristes variações sobre a mesma coisa e, muito frequentemente, sobre coisas sem importância nenhuma.<o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;">Um outro amigo, que o tempo não arrastou para o meu presente, como o fez com o que torceu o pescoço, mas que revejo sempre que posso com enorme satisfação, perante um tema livre decidiu escrever aquilo que ouvira, uns dias antes, num relato radiofónico de um jogo de futebol. Foi no ano anterior ao torcicolo. O nosso professor de português, homem com humor, na data da entrega das redações, leu a redação desse meu amigo para toda a turma e a hora de aula foi dedicada àquela leitura, uma das mais bem-dispostas que passei no Liceu. Uma galhofa pegada, fita um, finta dois, levanta a cabeça e remata ... e goooooolo. A bola vai ao centro do terreno e o árbitro apita, António passa para Joaquim e este devolve-lhe, novamente, o esférico. E aquilo continuava até se encheram as duas páginas prescritas.<o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;">Provavelmente, hoje em dia, com a falta de humor e a indignação pavloviana das redes sociais, o professor teria de se haver, no dia seguinte, com um pai furibundo que o acusaria de humilhar o filho e ameaçaria com advogado. Sim, isso aconteceria não porque estamos mais atentos e preocupados, mas porque, aos poucos, vamos perdendo a imaginação e, sobretudo, o humor. É urgente resgatar o tema livre, nas composições do básico ou do secundário, e, fundamentalmente, fazer da nossa vida individual, o mais frequentemente possível, um tema livre.<o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;"> </span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;"><br /></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 9pt;"><i><span style="font-size: 9pt;">" ... o x, o y, o z, [existem] para libertar a pessoa do tédio da aritmética.”<o:p></o:p></span></i></p><p align="right" class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: right; text-indent: 9pt;"><span style="font-size: 9pt;">J.M. Coetzee. </span><i><span style="font-size: 9pt;">Verão.</span></i><span style="font-size: 9pt;"> 2011.</span><span style="font-size: 9pt;"><o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;"><br /></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;"><br /></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;"><br /></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: x-small;">Publicado in O Comércio de Guimarães, 17 de maio de 2023</span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: x-small;"><br /></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: x-small;">Imagens:</span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: x-small;">Leda and the Swan (1962) Cy Twombly</span></p><p class="MsoNormal" style="margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-family: "Times New Roman", serif; font-size: x-small;">Circles in a Circle (1923) </span><span style="text-align: left;"><span style="font-family: Times New Roman, serif; font-size: x-small;">Wassily Kandinsky</span></span></p><p class="MsoNormal" style="margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="text-align: left;"><span style="font-family: Times New Roman, serif; font-size: x-small;">Orange and Tan (1954) Mark Rothko </span></span></p><p class="MsoNormal" style="margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-family: Times New Roman, serif; font-size: x-small;">Autumn Rhythm: Number 30 (1950) Jackson Pollock</span></p>Rui Vítor Costahttp://www.blogger.com/profile/07059965221323441539noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-1159177454361764807.post-22595814331969692772023-03-23T09:00:00.002+00:002023-03-23T09:02:55.338+00:00O DILEMA DAS HORMONAS<p> </p><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEh8FOMgB8oEeizRwRdVWwCDk4ix0Jfbo4as--hJDY1y4fBcRROuFjSbw74alOcDtqHi1zeVX-bAxqWwyo5XHRIEZy3yPRpGmwlXlDCBktgzdlVrr-qEeCrA39RHhXQsMPVZ2-bQowgHkIBM_HMcsEqMn4UILyCXrItWs34XdrVd6UYdBW2RWE_KHIEH/s283/283px-Nicotine-2D-skeletal.png" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" data-original-height="240" data-original-width="283" height="240" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEh8FOMgB8oEeizRwRdVWwCDk4ix0Jfbo4as--hJDY1y4fBcRROuFjSbw74alOcDtqHi1zeVX-bAxqWwyo5XHRIEZy3yPRpGmwlXlDCBktgzdlVrr-qEeCrA39RHhXQsMPVZ2-bQowgHkIBM_HMcsEqMn4UILyCXrItWs34XdrVd6UYdBW2RWE_KHIEH/s1600/283px-Nicotine-2D-skeletal.png" width="283" /></a></div><p></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 26pt;">F</span><span style="font-size: 14pt;">oi há já bastante tempo, quando estudava na faculdade, que percebi que aquilo que éramos, interiormente e para os outros, não seria afinal um espelho da nossa alma própria, mas, simplesmente, uma consequência da nossa química interna. Foi, sem dúvida, uma epifania chata e maçadora. Até aí julgara-me um ser próprio e especial, predeterminado por um espírito impalpável que me habitava e que, no fundo, era eu próprio. Julgava então o corpo como um invólucro apenas, assim como as religiões o acham. Mas não. O meu corpo é mais importante que o meu espírito, pois é o corpo que forja o espírito através de um conjunto de reações químicas. Se eu estou bem ou maldisposto é apenas a consequência visível de um equilíbrio químico ou da sua ausência. A ausência de lítio no organismo será assim mais determinante para a depressão do que uma enorme contrariedade.<o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;">Isto não é propriamente excitante, mas, no entanto, permite, por exemplo, encarar a estupidez alheia com a tranquilidade de uma razão médica e não com a brutalidade de uma construção social. Assim, quando se vê alguém a defender acerrimamente teorias da conspiração sobre vacinas ou a forma da Terra, não nos deveremos amofinar. É apenas serotonina a mais, a ser produzida pelas glândulas endócrinas de quem o diz. A culpa é simplesmente de uma molécula, da família das aminas, em que dois átomos de nitrogénio, um oxigénio, dez carbonos e uma dúzia de hidrogénios se ligam de particular forma. Não vale a pena discutir. Tão só recomendar um bom endocrinologista.<o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;"> </span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"></p><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEif_dqjQrckYeLLlpqK7I9W0FFvjFG8Fcogx3cycyI8hFjjiyNcj3nkaiM3ogpEApBTjppChaPLdsm7tgVmwwaddW3iCoVcix22AKinYF2IDfBzP0RVsw8i9CrREkDNWA3DDBbq0TsHvd6DX1RztI-tpSpGrf7uN7-ZDpTICjLoV0-GDs-kl8l_rjse/s448/dopamina-e-serotonina.jpg" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" data-original-height="175" data-original-width="448" height="150" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEif_dqjQrckYeLLlpqK7I9W0FFvjFG8Fcogx3cycyI8hFjjiyNcj3nkaiM3ogpEApBTjppChaPLdsm7tgVmwwaddW3iCoVcix22AKinYF2IDfBzP0RVsw8i9CrREkDNWA3DDBbq0TsHvd6DX1RztI-tpSpGrf7uN7-ZDpTICjLoV0-GDs-kl8l_rjse/w384-h150/dopamina-e-serotonina.jpg" width="384" /></a></div><p></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;"><br /></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 26pt;">A</span><span style="font-size: 14pt;">pesar disso nunca fui muito hormonal. A minha necessidade de adrenalina no sangue sempre foi muito modesta, mesmo enquanto era adolescente. A prazer da adrenalina sempre em mim foi mais clara quando julgava que ia comer uma salada de pepino e, verifico, que, afinal, irei comer papas de sarrabulho, do que propriamente em saltar de para-quedas ou acelerar no carro. Amestrei-a a prazeres bem mais concretos.<o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;">Lê-se ainda (não sei por mais quanto tempo ...) que as mulheres são mais propensas a terem flutuações hormonais. Cá está outra realidade que nos consola a nós homens. Não é feitio, é hormonal. Aquela mania delas pensarem várias coisas ao mesmo tempo, de não se conseguirem concentrar-se em pequenos prazeres como ver a bola na TV e beber cerveja ao fazê-lo, tem explicação. As mulheres pensam demais porque o trânsito hormonal sanguíneo é, nelas, caótico. As hormonas masculinas no sangue assemelham-se, na maior parte dos casos, ao trânsito em Guimarães no início dos anos 70.<o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;"><br /></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"></p><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgf5JN0WepE6LUpguLz-R-xUzl7ZRjIHBDDGZcX5gemoMC3-Ijy_y32HIPZKotWzXE-NIT6nuCypesVF5LyK0HDQLljXXAXwcvWlx1bEBaJhaaY1Zljvy9xezmLeTYjvdOaf5rkaD3Yga5DfvYjNXQ8J7ixQtDqyDDjQzX1oGm29XxPqNZWibPzMNor/s240/endomorfina.png.webp" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" data-original-height="210" data-original-width="240" height="210" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgf5JN0WepE6LUpguLz-R-xUzl7ZRjIHBDDGZcX5gemoMC3-Ijy_y32HIPZKotWzXE-NIT6nuCypesVF5LyK0HDQLljXXAXwcvWlx1bEBaJhaaY1Zljvy9xezmLeTYjvdOaf5rkaD3Yga5DfvYjNXQ8J7ixQtDqyDDjQzX1oGm29XxPqNZWibPzMNor/s1600/endomorfina.png.webp" width="240" /></a></div><p></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><br /></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 26pt;">N</span><span style="font-size: 14pt;">o entanto esta minha teoria de juventude está a mudar. Perante uma sociedade irritantemente conformada à vidinha, em que o encostar-se à situação vale mais do que construir a situação, a minha teoria química não baterá afinal certo. Vejo os poucos e infortunados jovens, cheios de hormonas, mais atentos ao que passa nos telemóveis do que ao que se passa no mundo real que lhes determina o futuro. Ao contrário, vejo uma data de pessoas com cabelos brancos, pela real e arreliante impossibilidade do seu organismo produzir a melanina que lhes dá cor, na rua, a gritar por respeito, a exigir dignidade, a lutar por um futuro que já não será o seu. Não, isto não pode ser só hormonas, não pode ser só químico, não pode ser só fisiológico.<o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;">O sucesso das drogas está relacionado, como nas hormonas endócrinas, com o facto de estas ativarem centros de prazer e de escape à realidade. A atual governação é isso: é uma droga que nada resolve. Na verdade, estamos, em Portugal, perante uma espécie de governação hormonal. <o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;">Na educação chega a ser irritante. Não há sim, não há não. Há apenas uma tentativa de arrastar e iludir como a morfina ou a heroína o fazem. De deixar andar sem nada decidir, de esperar que o corpo se iluda ou, então, que morra definitivamente.<o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;">Sorteiam-se benesses, como um jogo de rifas em que a nossa adrenalina fica em alta. A próxima tômbola será a do apoio ao arrendamento. Nada de estrutural: é só manobrar a conjuntura.<o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;">Por outro lado, o governo dá – de repente - ares de cocaína na TAP, na habitação, nos preços dos bens alimentares. Em vez de serem responsabilizados aqueles que técnica e politicamente afundaram a companhia aérea, em vez de olhar para o imenso parque habitacional do estado, o recuperar e valorizar, em vez de se atuar fiscalmente, procuram-se culpados externos, numa loucura cocainómana.<o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;"> </span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"></p><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgYUOxFIsazt4-iVlK-0t-7hiRgPV2nFqPVimidbc0s0dRdnBRsVvAGOWVavYilDM5BlRaqquNqSKh_qbRurUnTNVN4bN1tn-5fhz0yZwuuuskozEr_-v2s1i5TNEdwwhEdBp9rtV02oV9TiLfrs3795k846mKRKQY6Igjq-Fz-tnRnY6udu0XmwuG6/s1200/Kokain_-_Cocaine.svg.png" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" data-original-height="593" data-original-width="1200" height="158" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgYUOxFIsazt4-iVlK-0t-7hiRgPV2nFqPVimidbc0s0dRdnBRsVvAGOWVavYilDM5BlRaqquNqSKh_qbRurUnTNVN4bN1tn-5fhz0yZwuuuskozEr_-v2s1i5TNEdwwhEdBp9rtV02oV9TiLfrs3795k846mKRKQY6Igjq-Fz-tnRnY6udu0XmwuG6/s320/Kokain_-_Cocaine.svg.png" width="320" /></a></div><p></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;"><br /></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 26pt;">A</span><span style="font-size: 14pt;">s boas drogas, assim como as hormonas mais determinantes da nossa boa ou má disposição, terminam em “ina”. Eu adoro a minha cafeína, a minha nicotina, fiz delas moléculas indispensáveis ao bem-estar das minhas células. No entanto, suponho, mesmo contrariando a minha inicial teoria, ser importante que, como sociedade, produzamos novas hormonas. Com alguma indignaína para produzir a respeitaína que merecemos. É uma questão de justiçaína e de um futuruíno real e não ilusório como aquele que (nos dizem) estão a construir.<o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;"><br /></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><b><span style="font-size: 11pt;">AVISO: qualquer semelhança entre as minhas considerações e a sua intrínseca solidez científica é (ou poderá ser) pura ficção.<o:p></o:p></span></b></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><b><span style="font-size: 11pt;"><br /></span></b></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><b><span style="font-size: 11pt;"><br /></span></b></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><b><span style="font-size: 11pt;"><br /></span></b></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-indent: 9pt;"><i><span style="font-size: 9pt;">"Perdoa-me, não por te deixar, mas por ter ficado tempo demais."<o:p></o:p></span></i></p><p align="right" class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: right; text-indent: 9pt;"><span style="font-size: 9pt;">Marguerite Yourcenar. </span><i><span style="font-size: 9pt;">Alexis ou o tratado do vão combate.</span></i><span style="font-size: 9pt;"> 1929.</span><span style="font-size: 9pt;"><o:p></o:p></span></p><p align="right" class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: right; text-indent: 9pt;"><span style="font-size: 9pt;"><br /></span></p><p align="right" class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: right; text-indent: 9pt;"><span style="font-size: 9pt;"><br /></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: left; text-indent: 9pt;"><span style="font-size: 9pt;">Publicado in O Comércio de Guimarães a 22 de março de 2023</span></p>Rui Vítor Costahttp://www.blogger.com/profile/07059965221323441539noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-1159177454361764807.post-73445057261993279962023-02-23T09:25:00.005+00:002023-02-23T09:25:59.707+00:00Guia breve para não parecer tão velho<p><br /></p><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEj0lbnCG1FZHUG5E_ufBFDX1J9sKIey2NmoHDSHlfW073-IkhiS0wfi-6S6M861GX27MOSAqkEQPC2G-0ujFkOw9NVsbEXPspdIZCMFzDk8fhdpKAD0nS9_r2hStrhTelcE5jAbyaFx87_6EBO5DTuR7-FgxgCdIko07lVdrzMMSWNgPgnWIn8ZBfBb/s1532/Captura%20de%20ecra%CC%83%202023-02-17,%20a%CC%80s%2010.15.23.png" imageanchor="1" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" data-original-height="700" data-original-width="1532" height="181" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEj0lbnCG1FZHUG5E_ufBFDX1J9sKIey2NmoHDSHlfW073-IkhiS0wfi-6S6M861GX27MOSAqkEQPC2G-0ujFkOw9NVsbEXPspdIZCMFzDk8fhdpKAD0nS9_r2hStrhTelcE5jAbyaFx87_6EBO5DTuR7-FgxgCdIko07lVdrzMMSWNgPgnWIn8ZBfBb/w397-h181/Captura%20de%20ecra%CC%83%202023-02-17,%20a%CC%80s%2010.15.23.png" width="397" /></a></div><br /><p></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 26pt;">L</span><span style="font-size: 14pt;">embro-me com razoável nitidez a impressão que tinha, quando era novo, do meu convívio com os mais velhos. Penso que cada um de nós, se a memória for honesta e sem grandes danos, lembrar-se-á. É, assim, necessário puxar a cassete atrás, perceber o filme no seu início para não estragar o final.<o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;">Os mais velhos têm para os mais novos, fundamentalmente, um caráter utilitário. É necessário assumir isso sem complexos. Pagar um copo, não usar de arrogância, dar aquele conselho sobre coisas que já nos incomodaram e agora a eles incomodam, é simples e eficaz. Deve continuar a fazer-se isso: gera um reconhecimento imediato e satisfatório para ambas as partes. Agora querer entrar no mundo dos mais novos, fazer parte por igual é desajustado e gera imensos constrangimentos. Principalmente nos mais novos. Ficam assim alguns conselhos.<o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;"><br /></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"></p><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjm0R6pqP2pf2XRVxFZLsKq6_zj-9yRM7vNiTa6uy7i7DYN5jr6DyXuF5Qhn3E9cT_MJjIP9SGiDwZc42n9hpINqcyqzcdXmDJ54bDDUG5sljPbqJUBCVGR_BtoxHefsAG9IPaAGs0iGeEe_VNlkG4qUnUVPTgVB_ij7ORmUwszpakU_eevKbheF6wy/s1588/Captura%20de%20ecra%CC%83%202023-02-17,%20a%CC%80s%2010.17.30.png" imageanchor="1" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" data-original-height="672" data-original-width="1588" height="147" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjm0R6pqP2pf2XRVxFZLsKq6_zj-9yRM7vNiTa6uy7i7DYN5jr6DyXuF5Qhn3E9cT_MJjIP9SGiDwZc42n9hpINqcyqzcdXmDJ54bDDUG5sljPbqJUBCVGR_BtoxHefsAG9IPaAGs0iGeEe_VNlkG4qUnUVPTgVB_ij7ORmUwszpakU_eevKbheF6wy/w348-h147/Captura%20de%20ecra%CC%83%202023-02-17,%20a%CC%80s%2010.17.30.png" width="348" /></a></div><span style="font-size: 14pt;"><br /></span><p></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;"> </span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><b><span style="font-size: 14pt;">Dos preconceitos</span></b><span style="font-size: 14pt;">. Da nossa educação e vivências ficaram coisas que, mesmo à laia de piada, mesmo não efetivamente sentidas, podem parecer preconceituosas. Há que evitar deslizes, o preconceito é mortal (para nós) numa boa relação com os mais jovens. Parecer racista, homofóbico, pouco amigo do ambiente, sexista, é o maior dos pecados. Por isso nada de piadinhas. Se não soubermos definir o género não devemos atirar para o ar palavras como transgénero, não-binário, pansexual. Isso é perigoso. Fiquem-se pelo heterossexual e homossexual, vocês sabem o que isso é. Para além disso é o pântano!<o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;">Fomos habituados a termos clivagens sérias com assuntos concretos como a semanada, o sair à noite, o sexo. As coisas agora são bem mais complicadas. Mais fluídas. Situações há em que mesmo não dizendo nada de preconceituoso, somos acusados de o sermos. E muitas vezes não pelo que dizemos, mas por aquilo que os jovens acham que, no fundo, pensamos. É dizer-lhes exatamente isso – inverter o ónus da prova - e mudar rapidamente de assunto.<o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;"> </span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><b><span style="font-size: 14pt;">Da linguagem.</span></b><span style="font-size: 14pt;"> Não se pode cair nunca na tentação de querer ter a linguagem dos mais novos. Ela muda muito rapidamente para a nossa lenta atenção. Não se pode mimetizar a simpatia que é aprender a dizer obrigado ou bom-dia em turco ou em croata e replicar isso, feito turista acidental, no jargão dos mais novos. Por isso nada de dizer “bué” ou escrever LOL nas mensagens. Já não se usa. A vossa linguagem é mais segura e basta para se comunicarem com os mais novos. Às vezes atirar mesmo palavras simples, mas para eles complicadas, como profícuo ou excelso, é um bom caminho para os pôr na defensiva. E isso dá, por vezes, jeito. Não apliquem nunca o jargão “como vocês dizem” ... a que se segue, geralmente, um arcaico disparate.<o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;">Nunca digam “no meu tempo”, isso faz-vos parecer personagens de um documentário no Canal História. Refiram-se ao vosso passado como se fosse, apenas, ontem.<o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;"> </span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><b><span style="font-size: 14pt;">Da tecnologia e do elogio.</span></b><span style="font-size: 14pt;"> Pertenço a uma geração que, quando era jovem, ouvi-a com frequência, no mundo analógico, “dá cá isso, que tu não sabes fazer nada”. De repente, passou-se para o endeusamento do que os mais novos sabem fazer e as tecnologias são o terreno em que, hoje, se descobrem os “sobredotados”. Ora vamos lá ver, mau era que eles não tivessem destreza nessa área, quando, para que eles deixassem os pais em paz, se lhes meteu nas mãos à nascença uma parafernália de dispositivos tecnológicos que, a meu ver, embruteceram mais do que distinguiram. Saber pôr o telejornal na box da avozinha, ou fazer uma atualização no telemóvel do pai, não significa que os jovens tenham superlativas capacidades intelectuais. Por isso nada de elogios exagerados que só vos apoucam. É necessário, da nossa parte, alguma contenção no elogio. Se tiverem problemas ao nível tecnológico recorram a amigos vossos - a vossa espécie tem sempre alguém <i>up-to-date</i> - e tentem aprender. Não é assim tão difícil. E por amor de Deus não façam pequenos vídeos para o tiktok. Mostrem-se superiores. Apliquem, a isso, a palavra supérfluo. Vai ser mais eficaz que a brutalidade linguística de que foram vítimas enquanto jovens.<o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;"> </span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><b><span style="font-size: 14pt;">Do desporto.</span></b><span style="font-size: 14pt;"> Não se podem praticar desportos de equipa com os mais novos: essa é uma regra de ouro. Se os vossos ossos ainda permitem mexerem-se num desporto com bola, joguem com alguém da vossa idade, com as mesmas artroses, com a mesma barriga, é mais justo. Jogar com alguém mais novo é um suplício, eles são muito mais rápidos e por isso muito melhores. Não há volta a dar-lhe e o vosso mau perder vai dar cabo da vossa reputação. A evitar.<o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;"> </span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><b><span style="font-size: 14pt;">Do convívio.</span></b><span style="font-size: 14pt;"> Marquem distâncias com educação, mas sejam genuínos e descontraídos. Não peçam cerveja ao jantar para estarem na onda, peçam um vinho. Não se ponham, no entanto, com coisas chatas como este vinho tem muita madeira, ou frutos silvestres, isso é extraordinariamente aborrecido. Como eles não percebem nada de vinho, por vezes basta ler o rótulo e dizer o que lá está, mas com um ar de quem sabe o que diz, mesmo não sabendo. Mas podem sempre arriscar, se estiverem confortáveis, com coisas simples como “gosto muito deste Dão e, em particular, da casta Encruzado”. Dá-vos <i>status</i>, mas paguem a conta por favor, não sejam sovinas. Não frequentam as mesmas discotecas dos mais novos e, sobretudo, nunca bêbados: ficam com um terrível ar de predadores sexuais. Atenham-se ao vosso grupo etário: aí o que seria “figura triste” passa, magicamente, ao estatuto de divertido.<o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;"> </span></p><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjKT-SyF3UnSK_8mOa0qGKwbTMFMo2H4l2gviN3egv2Wcq4ml39phAJO9URbELDYKkUGczph36bp_YRfxWSSZqLNoNBarPoV5OIqaGNWskATMOpE4Pr675E6XGAoex8rIRgljDIjpLpscrI1477wAr5mLZMpQDENapGILdd71ASL5iKUjcI6yDaOsh2/s1700/Captura%20de%20ecra%CC%83%202023-02-17,%20a%CC%80s%2010.16.14.png" imageanchor="1" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" data-original-height="756" data-original-width="1700" height="142" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjKT-SyF3UnSK_8mOa0qGKwbTMFMo2H4l2gviN3egv2Wcq4ml39phAJO9URbELDYKkUGczph36bp_YRfxWSSZqLNoNBarPoV5OIqaGNWskATMOpE4Pr675E6XGAoex8rIRgljDIjpLpscrI1477wAr5mLZMpQDENapGILdd71ASL5iKUjcI6yDaOsh2/s320/Captura%20de%20ecra%CC%83%202023-02-17,%20a%CC%80s%2010.16.14.png" width="320" /></a></div><p></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;"><br /></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 26pt;">N</span><span style="font-size: 14pt;">o entanto, estar com gente mais nova, falar com eles, rir dos seus maravilhosos disparates, da enervante rapidez com que formulam uma ideia, é mais eficaz que um antirrugas ou do que doses maciças de antioxidante. Mas com as cautelas necessárias para não estragar tudo. Ter jovens por perto é a forma mais eficaz de evitar o tédio.<o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;"><br /></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;"><br /></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 9pt;"><i><span style="font-size: 9pt;">“Sabe o que nos faz envelhecer? O tédio<b>.</b> “<o:p></o:p></span></i></p><p align="right" class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: right; text-indent: 9pt;"><span style="font-size: 9pt;">Pai de Marcello para o filho no filme </span><i><span style="font-size: 9pt;">La Dolce Vita</span></i><span style="font-size: 9pt;">. Fellini. 1960.</span><span style="font-size: 9pt;"><o:p></o:p></span></p><p align="right" class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: right; text-indent: 9pt;"><span style="font-size: 9pt;"><br /></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: left; text-indent: 9pt;"><span style="font-size: 9pt;">Publicado in O Comércio de Guimarães a 22 de janeiro de 2023</span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: left; text-indent: 9pt;"><span style="font-size: 9pt;"><br /></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: left; text-indent: 9pt;"><span style="font-size: 9pt;">Imagens: La Dolce Vita. Fellini.1960.</span></p>Rui Vítor Costahttp://www.blogger.com/profile/07059965221323441539noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-1159177454361764807.post-63362187874554650182023-01-26T14:41:00.003+00:002023-01-26T14:42:05.365+00:00MARCELO e o RESPEITO<p> </p><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhVK6kxMxvZvAhiCxIz0dpvd5LMrtOO097Mm3miIeCAACvPH_KRSUbJSceFYCJLcgflS9WUve1fjSyvfRQk-0KRLFnQZLoKujsdwbi1hPdDOqWmZsi2k-LpkR3R_kTg14xhnMt8uncoeAQhX3LT9zNE40Jn7h5j4Qz0JrdkTA12PFYyJAXUDVRUymRE/s1960/Paulo%20Cunha:LUSA.webp" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" data-original-height="1102" data-original-width="1960" height="233" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhVK6kxMxvZvAhiCxIz0dpvd5LMrtOO097Mm3miIeCAACvPH_KRSUbJSceFYCJLcgflS9WUve1fjSyvfRQk-0KRLFnQZLoKujsdwbi1hPdDOqWmZsi2k-LpkR3R_kTg14xhnMt8uncoeAQhX3LT9zNE40Jn7h5j4Qz0JrdkTA12PFYyJAXUDVRUymRE/w414-h233/Paulo%20Cunha:LUSA.webp" width="414" /></a></div><br /><p></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 26pt;">A</span><span style="font-size: 14pt;"> Presidência da República Portuguesa é um dos lugares mais importantes da democracia portuguesa. É-o mais no simbolismo da função do que no poder político efetivo de quem a assegura.<o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;">Desde o 25 de Abril tivemos, apenas, 5 presidentes eleitos: Eanes, Soares, Sampaio, Cavaco e Marcelo. Todos eles foram, sem exceção, reeleitos. <o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;">No difícil caldeirão em que a política se vai tornando, a Presidência da República assume uma constância e uma gravidade próprias. Todos eles, gostemos mais ou menos deste ou daquele, tiveram as condições políticas e a capacidade de serem reconhecidos e escolhidos pelos portugueses. Todos eles, imensamente diferentes uns dos outros, assumiram o cargo e dele fizeram aquilo que supuseram ser melhor para o país. Não me envergonho de nenhum deles, ao contrário de alguns primeiros-ministros que, com mais poder, deslustraram quem os elegeu. Sócrates é esse exemplo claro e límpido de uma péssima escolha por parte dos portugueses. Sócrates exerceu um cargo importante e exigente de forma absolutamente deplorável para connosco, para com o país.<o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;">Quando referi os 5 presidentes da República nomeei-os, na maioria, pelos apelidos. Há exceção de um: Marcelo, que referi, como qualquer um de nós faria, pelo nome próprio. <o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;"> </span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 26pt;">M</span><span style="font-size: 14pt;">arcelo é assim mesmo, define-se pelo nome. É único e (infelizmente) irrepetível.<o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;">Já por uma ou outra vez referi, nestas minhas crónicas, o meu fascínio por Marcelo. Das duas vezes que com ele estive em condições de trocar algumas palavras, antes dele ser eleito para o cargo que atualmente exerce, fiquei sempre como um fã boquiaberto ao escutar o seu ídolo. Gosto mesmo dele, sempre gostei. A sua inteligência, o humor que dela decorre, a sua rapidez, a sua eterna traquinice de criança, são absolutamente fascinantes e desconstroem a imagem de que para exercer altos cargos da nação se tem de ser grave e aborrecido. Soares também nunca o foi.<o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;">Nestes dias de profunda revolução mediática dos “casos e casinhos” que se transformam, progressivamente, em “casos e casões”, escuto o presidente sempre com a atenção de um detetive, pois há sempre qualquer coisa nas entrelinhas que nos explica a afirmação mais importante. Sobre Medina percebi que ele não elogiou o eventual esclarecimento, mas a disponibilidade para esclarecer. Se esclarece ou não, isso já é outra conversa, mas Marcelo sabe, como eu julgo saber, que se Medina cai o Governo cai e a coisa vai ficar mais preta do que o que já está.<o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;">Quem dizia que a vitória retumbante de Costa iria transformar Marcelo numa figura decorativa, enganou-se redondamente. A sua influência política, o seu escrutínio, a pressão para que haja a decência necessária ao exercício de um cargo público é avassaladora. A sua conexão com os portugueses é o combustível necessário a esse desígnio. E ela continua forte.<o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;">O problema de Marcelo é a sua irresistível tentação, devido à traquinice que lhe é tão particular, em tornar-se uma caricatura dele mesmo. Mas, em Murça, há não muito tempo, houve alguém que lhe puxou as orelhas bem puxadas, confrontando-o com a inação clara do governo na mitigação atempada dos fogos florestais, depois do que já vivemos. A caricatura ficou embaraçada, mas o Marcelo, entretanto, ressurgiu.<o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;"><br /></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;"> </span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"></p><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEj1WtL2BvhYr_PRLOVkYEwpFrqn4oqtn9MvrEMSpzD0OVRAde22C2Rkyzv5Wb1z-e36hJ_yeUsGGpELYTAddP7ekaCkd9tfCAOJh6Cq97RfDZfdkS6b1GmPzZqQDi73Gq2XsmeIf3dD6rWWXYcxk2NJqJtuZ36yBqctsxcbSB9-6Wys6v01oaQRDS0_/s800/PEDRO%20SARMENTO%20COSTA:LUSA.jpg" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" data-original-height="450" data-original-width="800" height="207" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEj1WtL2BvhYr_PRLOVkYEwpFrqn4oqtn9MvrEMSpzD0OVRAde22C2Rkyzv5Wb1z-e36hJ_yeUsGGpELYTAddP7ekaCkd9tfCAOJh6Cq97RfDZfdkS6b1GmPzZqQDi73Gq2XsmeIf3dD6rWWXYcxk2NJqJtuZ36yBqctsxcbSB9-6Wys6v01oaQRDS0_/w368-h207/PEDRO%20SARMENTO%20COSTA:LUSA.jpg" width="368" /></a></div><span style="font-size: 14pt;"><br /></span><p></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><br /></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 26pt;">H</span><span style="font-size: 14pt;">á profissionais da comunicação que gastam horas para arranjarem a frase certa, as palavras que mobilizem alguém a acreditar num desígnio, a votar numa proposta. Os professores, de forma mais ou menos caótica, mas de forma, sobretudo, sentida, resumiram a sua luta a uma simples palavra: RESPEITO.<o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;">Não me lembro de algo ser assim tão certeiro e traduzir de forma tão apropriada os diversos “sentires”, preocupações e o desejo mais profundo da generalidade dos seus profissionais.<o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;">E o respeito que se clama, que eu clamo igualmente, não é apenas o respeito pelo trabalho de cada um, pelas condições mínimas para o exercício pleno e motivador da profissão, mas o respeito pelo futuro. Está já lançado o fogo que vai destruir a escola pública para sempre se nada, entretanto, for feito. E é a escola pública que eu frequentei, que as minhas filhas frequentaram, e uma ainda frequenta, a ferramenta indispensável para que Portugal se possa desenvolver de forma justa e equilibrada, sem que seja necessário ter dinheiro para que se tenha acesso a uma educação de qualidade. Se a aproveitamos ou não, isso é outra conversa, mas todos terem essa possibilidade é uma das maiores riquezas da nossa sociedade. E não vai levar muito tempo para que, se nada for feito para reconhecer e dignificar a profissão, vai acabar por acontecer. Esse Pedrógão Educacional está em curso, e os professores são, atualmente, os populares que com baldes e mangueiras tentam apagar o fogo que se avizinha, perante a inação do poder. Um fogo imensamente destrutivo, claramente anunciado, que roubará o futuro ao país. E esta é uma luta de todos e não apenas dos professores. Ainda há tempo, mas não muito, para que a escola pública consiga apagar o fogo que se avizinha, do qual já se sente o calor que esmaga os seus profissionais em tarefas absurdas e desmotivadoras, que nada têm a ver com transmissão sustentada de conhecimentos, mas com exercícios pedagógicos alucinantes e alucinados de quem não conhece o terreno e se diverte a simular na tranquilidade do computador a tal escola inclusiva, que nada de novo inclui além das vampirescas tarefas burocráticas com que se julga iluminar. Tal como os engenheiros que projetam rotundas, através dos <i>Google Maps</i>, sem nunca irem ao terreno e, só mais tarde, verificam que afinal os camiões não as conseguem contornar.<o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;">É de terreno que a governação precisa e não de palavras sem sentido, é de apagar o fogo que se avizinha, já, com ações concretas; é, no fundo, de respeito pela educação e pelo seu papel primordial no futuro do país.<o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;"><br /></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: x-small;">Publicado in O Comércio de Guimarães a 25 de janeiro de 2022</span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: x-small;"><br /></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: x-small;">Imagens: Paulo Cunha e Pedro Sarmento Costa/LUSA</span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><br /></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><br /></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 9pt;"><i><span style="font-size: 9pt;">“Eles [os professores] são fundamentais e queixam-se muitas vezes com razão das suas condições. E, naturalmente, que essa é uma preocupação que eu, como professor, acompanho desde sempre<b>.</b> “<o:p></o:p></span></i></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 9pt; text-align: right; text-indent: 9pt;">Marcelo em Ourém. 12.12.22.</span> </p>Rui Vítor Costahttp://www.blogger.com/profile/07059965221323441539noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-1159177454361764807.post-681204801431395722023-01-24T07:18:00.002+00:002023-01-24T07:18:47.858+00:00VITÓRIA: UM FOGO SEM FIM<p></p><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEj8b5PXH_RtUppaVRGuVmnaAij8HdpgxcY_pbZJ_nhQIOL0hZjm3DkPtBKkzKzfHzTiwt1aeSL-88vL321hSU27YhReoLeELsC8lc4PZWH_7xnJpGrpOu1CrxNtF5jPoh0xByclOgDVPcnWqProVaYzrQmJgad3A_23Pxtb6NT9SgFgFwUUObPjHv1V/s1400/JoanaD'arc.jpeg" imageanchor="1" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" data-original-height="1021" data-original-width="1400" height="233" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEj8b5PXH_RtUppaVRGuVmnaAij8HdpgxcY_pbZJ_nhQIOL0hZjm3DkPtBKkzKzfHzTiwt1aeSL-88vL321hSU27YhReoLeELsC8lc4PZWH_7xnJpGrpOu1CrxNtF5jPoh0xByclOgDVPcnWqProVaYzrQmJgad3A_23Pxtb6NT9SgFgFwUUObPjHv1V/s320/JoanaD'arc.jpeg" width="320" /></a></div><br /> <p></p><p class="MsoNormal" style="font-family: Calibri, sans-serif; font-size: 11pt; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 7.1pt;"><span style="font-size: 14pt;">Um conjunto de maus resultados veio, novamente, atirar o Vitória para a fogueira da maledicência. Ninguém presta. Tem toda a gente de se ir embora, é o que se lê.<o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: Calibri, sans-serif; font-size: 11pt; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 7.1pt;"><span style="font-size: 14pt;">O Vitória tem uma história importante na qual, a sua massa associativa, fiel e dedicada, desempenha um papel central e principal. E assim o acho não pelo que li, mas pelo que vi e vivi, ao longo dos meus anos. <o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: Calibri, sans-serif; font-size: 11pt; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 7.1pt;"><span style="font-size: 14pt;"> </span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: Calibri, sans-serif; font-size: 11pt; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 7.1pt;"><span style="font-size: 14pt;">A narrativa de que ser de Guimarães sempre foi ser do Vitória, não corresponderá inteiramente à verdade. Pelo menos no tempo todo. Sem dúvida que em Guimarães o apego ao clube foi sempre maior do que noutras cidades, mas, lembro-me, ser ainda um pouco exótico, mesmo na minha geração, dizer-se apenas que se era pelo Vitória. No meu grupo de amigos adolescentes, no final dos anos 70, isso era um facto, do qual fazíamos gala, mas noutros grupos era comum algumas simpatias (e às vezes muitas) pelos clubes do regime, o que apenas transmitia hábitos muito enraizados nas gerações que nos precederam. De há umas décadas a esta parte isso mudou, exatamente pela influência daquela geração – que eu acho ser a minha – e, naturalmente das que lhe seguiram. Hoje já é comum que uma grande maioria dos adolescentes e jovens adultos de Guimarães sejam adeptos e sócios do clube da terra. Há até – e eu incluo-me, envergonhadamente, aí – quem tenha preconceitos para quem não o seja.<o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: Calibri, sans-serif; font-size: 11pt; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 7.1pt;"><span style="font-size: 14pt;"> </span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: Calibri, sans-serif; font-size: 11pt; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 7.1pt;"><span style="font-size: 14pt;">O Vitória que eu conheci em miúdo apresentava boas equipas, sempre com um excelente meio-campo, e as direções que passavam pelo clube baseavam-se em homens da cidade e do concelho que, algumas vezes a contragosto, davam o seu contributo pelo clube, pois estavam a dá-lo igualmente pela terra que os viu nascer. E se digo a contragosto não o digo por não gostarem do Vitória, mas porque o clube lhes dava um conjunto de responsabilidades (especialmente as financeiras) que exigia muito deles, em prejuízo também da sua vida profissional e familiar. Isto, numa altura, em que não havia défice nas contas, pois se o houvesse, era à direção que caberia arranjar dinheiro para o eliminar. Ser presidente era, apesar da canseira, um cargo de prestígio na sociedade vimaranense. Havia, devido à exigência, uma rotatividade entre homens com sentido de clube e de responsabilidade, que saltavam para a presidência depois de terem exercido cargos diversos no clube. Nunca se era, exclusivamente, presidente do Vitória.<o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: Calibri, sans-serif; font-size: 11pt; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 7.1pt;"><span style="font-size: 14pt;"> </span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: Calibri, sans-serif; font-size: 11pt; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 7.1pt;"><span style="font-size: 14pt;">Essa postura fiel, amadora e dedicada, mudou com a eleição de António Pimenta Machado, em março de 1980. Andava eu ainda no início do secundário. A postura generosa, de grande dedicação à causa comum, foi mudando também noutros setores da sociedade vimaranense. A política, em Guimarães dominada praticamente desde os alvores da democracia por um único partido político, foi desempenhado progressivamente o seu papel democrático e, muitas vezes, foi para além disso, numa lógica pouco saudável de perpetuação do poder. São os mais visíveis defeitos de um sistema inegavelmente virtuoso: o democrático. E foi tendo, também, implicações nas próprias gestões do clube, nas tensões e subserviências que aconteceram. <o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: Calibri, sans-serif; font-size: 11pt; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 7.1pt;"><span style="font-size: 14pt;"> </span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: Calibri, sans-serif; font-size: 11pt; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 7.1pt;"><span style="font-size: 14pt;">António Pimenta Machado traz o Vitória para um mediatismo incomum. Umas vezes por bons motivos, outras por maus motivos. O Vitória dos anos 70 era um clube muito querido pela generalidade dos adeptos de futebol em todo o país, reconheciam-nos a paixão, o bom futebol, mas, no fundo, ao nível superior, enterravam-nos sempre que era preciso. Não me lembro, não tinha idade para construir memória disso, mas, dizem-me, a época 68/69 foi uma vergonha e tiraram-nos qualquer hipótese de lutar pelo título. Mas lembro-me, aí sim, das vergonhosas atuações de António Garrido no último jogo do campeonato em 1975 e na final da Taça de 1976, ambas contra o Boavista. Cortavam-nos as asas sempre que era preciso, sempre que estávamos fortes e esses dois momentos, se corressem com a normalidade que deveriam ter decorrido, dar-nos-iam o alento e o músculo de ambição que merecíamos, os resultados que, em jogo jogado, tudo fizemos para alcançar. Pimenta Machado veio corporizar essa ambição. Ele foi presidente durante 24 anos, o que hoje representa um quarto da história do nosso clube e, na altura que saiu representava quase um terço da história do Vitória. Mais indelével, era difícil.<o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: Calibri, sans-serif; font-size: 11pt; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 7.1pt;"><span style="font-size: 14pt;"> </span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: Calibri, sans-serif; font-size: 11pt; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 7.1pt;"><span style="font-size: 14pt;">No entanto, todo a forma afirmativa de como António Pimenta Machado conduziu a instituição, não conseguiu derrubar os muros antigos nos quais esbarramos e, pior, vimos, ainda nos seus anos de presidência, o Boavista conquistar um título pelo qual ambicionamos, muito provavelmente, mais do que eles. Pimenta só sai porque se demite, não perdeu nenhumas das eleições a que concorreu. Méritos teve muitos, mas deméritos também. Os últimos mandatos são um reflexo disso. Não reconhece ninguém, além dele mesmo. Daí que muita gente que o apoiou, que trabalhou para o clube, como sempre havia acontecido, se afastasse do presidente, e alguns até – corajosamente - o combateram. A ideia anterior - a que o clube se havia habituado – de existir um grupo de pessoas unidas em torno de uma causa, desaparece com ele. Pimenta é omnipotente e omnisciente, apropria-se do clube e desrespeita, progressivamente, quem com ele trabalha, os associados, a sua voz. Noutras até os intimida, como aconteceu, de forma absolutamente infame, na assembleia dos capangas, a 6 de setembro de 2002. A saída de Pimenta levou muitos vitorianos a reconciliarem-se com o clube e assim, na presidência de Vítor Magalhães, o clube rapidamente duplica o número de sócios perante a abertura. Havia, então, uma ânsia de participação, de envolvimento, que se desencantou perante a estranha descida de divisão em 2006 que, muito à Vitória, fez aumentar ainda mais o número de associados. No tempo de António Pimenta Machado também se passaram épocas difíceis em que só nos safamos da descida de divisão na última ou na penúltima jornada (84/85, 87/88, 90/91 e 03/04). Mas não descemos.<o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: Calibri, sans-serif; font-size: 11pt; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 7.1pt;"><span style="font-size: 14pt;"> </span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: Calibri, sans-serif; font-size: 11pt; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 7.1pt;"><span style="font-size: 14pt;">Uma presidência assim, forte e longa, marca de forma perene o clube e condicionou o que se lhe seguiu. Nuca mais houve paz no clube, à exceção, talvez, do primeiro mandato de Júlio Mendes. A perda de um “pai” autoritário arrasou os “padrastos” que se lhe seguiram. O presidente do Vitória passou, nas novas circunstâncias, a assumir o papel de alvo ambulante, quando a época de caça, por força dos resultados, abria. Participar nos órgãos sociais também. O advento dos blogues e, mais tarde, das redes sociais trouxe em alguns casos – poucos – a possibilidade de participação mais ampla e democrática, mas, trouxe, acima de tudo o alimento gordo da insídia e do ódio entre os adeptos do Vitória. As Assembleias Gerais passaram a ser não um lugar onde se colocavam as questões, as divergências, mas o eco das barricadas que se foram formando na internet, e mesmo assim um palco secundário de discussão. Uma discussão que se transforma rapidamente em antagonismo, que balcaniza e enfraquece. Se eu apoio X, vou ter que ser contra Y. Se eu apoiei Y, vou ter que dizer mal de Z, e por aí adiante, como se o apoio pessoal a um candidato nos tirasse a possibilidade de escrutínio e crítica a esse mesmo projeto, ou impelisse a dizimar todos os outros projetos ou opções, só porque sim. E a coisa foi-se extremando não pelo pensamento de cada um, bom ou mau, mas pela voracidade de matilha que se estabeleceu atrás de alguns gurus que, com desvelo, tentam conduzir as massas enfurecidas pelos resultados menos abonatórios ... a sítio nenhum. Nunca vi, como neste clube, treinadores de grande classe serem arrasados nas redes sociais, na rua, como o foram aqui. Nem Rui Vitória escapou. Nada serve quando o caldo fermenta no ódio. Tudo isto levou a que muitas pessoas válidas e capazes se fossem afastando do clube. Há, hoje, infelizmente muito pouca gente que queira servir o clube e sujeitar-se a que os seus filhos sejam perseguidos e insultados na rua, que o seu nome seja enlameado pela turba acéfala, perante a falta de indignação da maioria. Sujeitar-se a que lhe escrevam no muro de casa, como escreveram na casa do Dr. Fernando Alberto, “morre velho!”. Ele, infelizmente, já morreu, mas lembro-me da dor que ele sentiu quando lhe fizeram isso. Ele que dedicou grande parte da sua vida, de uma forma honesta e exemplar, a servir o país e Guimarães, foi vilipendiado de forma torpe – ele que em vida tanto fez em prol do Vitória -, perante o silêncio dos “inocentes”, o absoluto mutismo, inação e falta de memória e agradecimento que um homem como ele deveria ter merecido dos adeptos do seu clube. Muito poucos o defenderam na altura, pois o clube estava a caminho da 2ª liga, e Fernando Alberto era presidente da Assembleia Geral, um dos muitos cargos que desempenhou no Vitória. A coisa queimava. Na Assembleia Geral, concorridíssima, de junho de 2006, o então presidente sujeita-se uma moção de confiança que ganha com larga votação entre os muitos sócios que lá foram, mas a fogueira estava ateada cá fora, na internet, na ameaça de rua, no insulto torpe, na insídia e ele cai. Quando a coisa queima há poucos homens e mulheres dispostos a imolar-se no fogo que não é deles. Infelizmente.<o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: Calibri, sans-serif; font-size: 11pt; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 7.1pt;"><span style="font-size: 14pt;"> </span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: Calibri, sans-serif; font-size: 11pt; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 7.1pt;"><span style="font-size: 14pt;">Ainda recentemente, e com muito menos impacto e gravidade, Esser Jorge escreveu, a propósito das alegações de racismo por parte de Boateng, que estava um elefante na nossa sala. Foi sovado verbalmente nas redes sociais. Depois do caso Marega, empolado de forma artificial, mas que tomou as proporções que tomou por inabilidade própria, depois do palerma de Portimão ter justificado o seu injustificável ato com o mesmo tipo de alegações, mais um caso destes, mesmo que inventado, tem de ter um tratamento de pinças da nossa parte, refletir pelo menos, mesmo não concordando. O Vitória é, nesta matéria, um alvo. Um ponto vermelho está apontado à nossa cabeça há muito e não falta quem, com vontade, queira puxar o gatilho. Se não for agora, será daqui a pouco. É fatal como o destino ... e aquele setor só nos tem causado problemas. Mas a narrativa que surge é outra, continua a ser nós contra o mundo. Por ser simples, tende a ser popular. Se uns o atacaram porque a inteligência não dá para mais, outros fizeram-no premeditadamente com a voracidade das hienas. Com mais um banquete de insultos, até ficarem apenas os ossos. Não se diverge, não se discute, procura-se apenas humilhar.<o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: Calibri, sans-serif; font-size: 11pt; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 7.1pt;"><span style="font-size: 14pt;"> </span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: Calibri, sans-serif; font-size: 11pt; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 7.1pt;"><span style="font-size: 14pt;">A lógica do amar-te-ei até te matar, continua viva e não augura nada de bom para o futuro do clube. A soma de desilusões vai continuar e, provavelmente, agravar-se. A incomodativa sensação de irrelevância também. E essa para mim é a que mais dói. Passamos do céu ao inferno em minutos, o que transforma a sensação em sentimento. Se não convivermos, mesmo lacrimejantes, com essa impotência e com esta maldita irrelevância, como uma família que se apoia, mas como família que se recrimina, a coisa vai ficar insustentável.<o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: Calibri, sans-serif; font-size: 11pt; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 7.1pt;"><span style="font-size: 14pt;">Nesta época, sob a direção de António Miguel Cardoso, as coisas, apesar das últimas derrotas, até nem têm corrido nada mal. Perdemos nos últimos tempos jogadores talentosos e/ou importantes como Edwards, Rochinha, André Almeida, Estupiñan, Sacko, Rafa Soares, que não foram substituídos por jogadores à altura. E mesmo com esses jogadores não fomos a nenhum sítio de especial. Não é expectável que agora isso aconteça, é só fazer as contas. Portanto a coisa, mais tarde ou mais cedo, vai quebrar, para além da boa vontade de dirigentes, do treinador e jogadores atuais, da sua superação ocasional. Não há classe para mais e não estou a ver, com base nas possibilidades de recrutamento, a incomodidade que os jovens devem sentir quando falham, que tão cedo este arrastar de asa se esfume. A par deste festim de sangue anunciado para breve, só falta saber quando, o presidente já veio avisar que não está aqui para se sujeitar a tudo. Está feito o aviso. Se me chateiam, chateio-me a sério, pelo menos foi isso que eu percebi. Suponho que está a batalhar, com enorme dificuldade, para pôr as contas do clube em ordem, com as principais receitas comprometidas, para vivermos de acordo com as nossas possibilidades, como se diz. E tentar viver de acordo com isso é, sobretudo, confiar na sorte e apelar a mais uns anos de eterna paciência. Os sócios escolheram de forma maioritária e legítima que o destino da SAD deve pertencer ao clube, e, como sabemos, não há ninguém que invista aqui para ser mandado sem controlar. Especialmente aqui. Daí que o barco vá abanar violentamente, mais tarde ou mais cedo.<o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: Calibri, sans-serif; font-size: 11pt; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 7.1pt;"><span style="font-size: 14pt;">Para mim é claro que vamos viver tempos difíceis, já hoje isso se pressente. Que os resultados desportivos, muito provavelmente, vão continuar muito aquém da nossa história, da nossa dedicação, da nossa alma. Que a irrelevância e a impotência vão corroer a nossa paixão. Podemos vociferar contra o presidente, contra o treinador, contra um ou outro jogador, mas sem qualquer esperança de vermos surgir, tão cedo, como que por milagre, uma solução. As pessoas, de boa fé, que ainda se aguentam num clima de permanente guerra civil vão acabar por desistir, e depois disso será o vazio ou o pasto para as hienas que irão tirar os últimos e parcos pedaços de carne que ainda restem agarrados aos ossos do clube e depois partirão, em manada. É aguentar ou rebentar.<o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: Calibri, sans-serif; font-size: 11pt; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 7.1pt;"><span style="font-size: 14pt;"> </span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: Calibri, sans-serif; font-size: 11pt; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 7.1pt;"><span style="font-size: 14pt;">Por mim aguento. Não estou disponível para fazer abanar o barco mais do que a maré o fará e, acho, que a maioria dos adeptos deveria fazer o mesmo. Sem dramas, atentos, interventivos, mas apoiando o Vitória de forma a salvaguardar a instituição, muito mais importante que qualquer homem ou mulher, do que qualquer circunstância, do que qualquer estado de espírito pessoal, sem histerismos e sem queimas públicas, sem divisões estúpidas, para ver se a tradição de servir o clube, seja, como já foi há muito tempo, uma honra e não uma condenação. Mas igualmente sem silêncios cobardes que nos entreguem, definitivamente, às hienas.<o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: Calibri, sans-serif; font-size: 11pt; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 7.1pt;"><span style="font-size: 14pt;"> </span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: Calibri, sans-serif; font-size: 11pt; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 7.1pt;"><span style="font-size: 14pt;">Quando se é jovem a coisa dói ainda mais. Sinto a desilusão desses jovens que acompanham o Vitória, semelhante a outras desilusões que vivi quando também o era. Saibam que eu, e muitos de nós, vitorianos, já passamos por muitas deceções e sobrevivemos e continuamos aqui. É a nossa união, a nossa resiliência, que nos distingue e nos faz mais fortes, e não a violência ou o insulto, a destruição gratuita de um património coletivo com cem anos. Aos jogadores jovens que, seguramente, leem na internet muita verborreia inútil, que são insultados quando cometem erros, que tudo fazem para que tudo saia bem e muitas vezes não sai, saibam que a maioria está do vosso lado e aprecia o vosso crescimento, e torce pelo vosso sucesso, apesar de se irritar com os erros que vocês cometem, é natural. Mas que saibam, igualmente, porque já são homens, que ganham numa semana um salário superior ao que a esmagadora maioria dos sócios do clube aufere num mês. E muitos deles, muitos dos sócios, fazem sacrifícios para o serem. Perceber essa realidade, mas sobretudo essa responsabilidade, é crescer. O fanatismo do ódio nas redes sociais não traduz, seguramente, o sentir da maioria dos vitorianos. A vida é complicada, mas nada é impossível. Quando Dani Silva, no fim do jogo em Braga, afirma “estamos arrasados”, mostra a sua desilusão e estica-a aos limites de um jovem empenhado e corajoso, quando a assume de forma tão clara e brutal. Podemos até estar arrasados, mas vamo-nos todos levantar, com a vossa dedicação e esforço, connosco na bancada, emulando a coragem do homem que figura no nosso símbolo e que, apesar de derrotas e contratempos, nunca desistiu. Arrasados hoje, mas persistentes, pois há sempre futuro se não dinamitarmos o presente. E essa é uma tarefa de todos, ou, pelo menos, da maioria dos adeptos do Vitória, da sua dedicação, da sua ímpar paixão e respeito pelo clube e pela sua história.<o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: Calibri, sans-serif; font-size: 11pt; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 7.1pt;"><span style="font-size: 14pt;"> </span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: Calibri, sans-serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 7.1pt;"><span style="font-size: x-small;">Imagem: Do filme <i>A Paixão de Joana D’Arc.</i> Carl Theodor Dreyer. 1928.</span><i style="font-size: 11pt;"><span style="font-size: 12pt;"><o:p></o:p></span></i></p><p class="MsoNormal" style="font-family: Calibri, sans-serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 7.1pt;"><span style="font-size: x-small;"><br /></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: Calibri, sans-serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 7.1pt;"><span style="font-size: x-small;">Crónica publicada no Desportivo de Guimarães a 24 de janeiro de 2022</span></p>Rui Vítor Costahttp://www.blogger.com/profile/07059965221323441539noreply@blogger.com1tag:blogger.com,1999:blog-1159177454361764807.post-35956070588874609292022-12-28T10:23:00.002+00:002022-12-28T10:23:37.274+00:00CONFISSÕES<p> </p><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjOZuFg968BZZe6ykwaLfmVZrmcq8T5cXSBtjOHF-2kd91z3awMCxYdU5aZg5egXEwCZzD2qjbuCCMbt4OlEQKFxmDBAX7Akxcr5t3QFRqVFLKzYT9ixHZtZtGijKFC9kB40ORSAjGjzCVYmCshKwQ9pq9BE_A8aG8TWeC1GPgBmnuVV5Gnphi5Hue3/s1280/1.%20maxresdefault.jpg" imageanchor="1" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" data-original-height="720" data-original-width="1280" height="204" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjOZuFg968BZZe6ykwaLfmVZrmcq8T5cXSBtjOHF-2kd91z3awMCxYdU5aZg5egXEwCZzD2qjbuCCMbt4OlEQKFxmDBAX7Akxcr5t3QFRqVFLKzYT9ixHZtZtGijKFC9kB40ORSAjGjzCVYmCshKwQ9pq9BE_A8aG8TWeC1GPgBmnuVV5Gnphi5Hue3/w363-h204/1.%20maxresdefault.jpg" width="363" /></a></div><br /><p></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 26pt;">A</span><span style="font-size: 14pt;"> época do Natal é imbatível para quem tem a ventura de o celebrar em família. Desde miúdo que sou um fã do Natal, sobretudo porque o Natal me trazia presentes... e os primos. Tenho, confesso, com a religião católica - a minha – uma relação fundamentalmente comercial: porto-me bem e quero o devido retorno. Tão simples quanto isso. Por outro lado, sempre me encantou, a acalmia emocional com que o Natal investe as pessoas. A ternura, a atenção ao próximo, os desejos sinceros de felicidades, surgem, no Natal como borbulhas em adolescentes, visíveis e brutais, mas que se diluem rapidamente no tempo, como o acne. Não acreditar em Deus é apenas um pormenor, um pormenor meu, que nada afeta a magnífica e redentora história do menino nascido em Belém para salvar o mundo.</span><span style="font-size: 14pt;"><o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;"><br /></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"></p><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgmwS2DQseSIDVwQ-FV2wd7kRQXx5EE6DX5a_Q7DR6jiYD6HjeKqHy6dUNacYq8idwjzjLrjIX9fMR2rG0DB6_bBBmk84HpDZB_4wPnq4cW4PkMc5dojPj-BPwq0rIBFu3AAOtNQASBlYzmF1tyWoiG2Vp_ZKoZ5a4L5PuDXj59TbM9J0lKio8eDkQw/s411/1.%20le-petit-monde-de-don-camillo-french-movie-poster-md.jpg" imageanchor="1" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" data-original-height="411" data-original-width="297" height="380" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgmwS2DQseSIDVwQ-FV2wd7kRQXx5EE6DX5a_Q7DR6jiYD6HjeKqHy6dUNacYq8idwjzjLrjIX9fMR2rG0DB6_bBBmk84HpDZB_4wPnq4cW4PkMc5dojPj-BPwq0rIBFu3AAOtNQASBlYzmF1tyWoiG2Vp_ZKoZ5a4L5PuDXj59TbM9J0lKio8eDkQw/w274-h380/1.%20le-petit-monde-de-don-camillo-french-movie-poster-md.jpg" width="274" /></a></div><p></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;"> </span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 26pt;">L</span><span style="font-size: 14pt;">embro-me com uma certa saudade de quando me confessava. Na época de Natal era praticamente obrigatório confessarmo-nos. Havia ali uma espécie de Relatório e Contas do pecado que me encantava. Ora senhor padre fiz de mal isto e aquilo e, depois, simplesmente uma redentora absolvição e uma penitência traduzida numa aritmética de ave-marias e padre-nossos. Reparei, com o tempo, de que não havia ali uma tabela estruturada, um algoritmo, já que para os mesmos pecados tinha, com diferentes padres, distintas penitências. Mas sentia-me indubitavelmente leve após a confissão. Nunca laborei demasiado nos meus pecados, nos meus pensamentos íntimos, eventualmente impuros, pois sentia que isso me iria causar problemas. Entregava o trivial e recebia o trivial, sem qualquer sermão exaustivo. Arreliei a minha tia, arreliei a minha mãe, disse palavrões, menti quando disse que dei dinheiro a um pobre, quando, em vez disso, fui comprar mais cromos daquela coleção em que me haviam proibido de continuar a torrar as minhas poupanças. Mas saía da confissão, sempre, com uma leveza extraordinária e, algumas das vezes, com um halo de santidade invisível (mas magnífico) por cima da minha cabeça. E sentia-me bem assim. Contudo, quando as confissões eram em grupo era mais difícil manter a santidade. Algum colega mais atrevido provocava-me o palavrão e o halo lá se ia, puf. No entanto, como os bons fiscais de estacionamento, sentia que havia da parte de Deus uma tolerância de meia-hora em que poderia pecar sem ter de tornar à confissão. Tenho saudades dessa leveza, da simplicidade que uma religião nos pode dar, da nossa existência ser, tão simplesmente, um caderno de contabilidade antiga, com as impecáveis colunas do deve e do haver e sempre com a bondosa possibilidade de perdão, de voltar com as contas a zero.<o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;"><br /></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"></p><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjEPP08Rc2UtXt-3nX0rbIUHSWC4vPNs9R6GX4I8rCqCfqn7Z4LU_ttiqdlvZZyMH6FDIO5nS-Y-3eJ8lOfz8iSXvEq-s-1TdycnnTwH1gwaL_L20JS5hsxCtlFmOzgVta7r5pIPsVx4Tqkk780ns9KTaigu-8_8YQ7ThDuNwlVnVLPbk_OWBWwDEzg/s901/1.%20le-petit-monde-de-don-camillo-poster.jpg.webp" imageanchor="1" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" data-original-height="901" data-original-width="640" height="378" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjEPP08Rc2UtXt-3nX0rbIUHSWC4vPNs9R6GX4I8rCqCfqn7Z4LU_ttiqdlvZZyMH6FDIO5nS-Y-3eJ8lOfz8iSXvEq-s-1TdycnnTwH1gwaL_L20JS5hsxCtlFmOzgVta7r5pIPsVx4Tqkk780ns9KTaigu-8_8YQ7ThDuNwlVnVLPbk_OWBWwDEzg/w268-h378/1.%20le-petit-monde-de-don-camillo-poster.jpg.webp" width="268" /></a></div><p></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><br /></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 26pt;">N</span><span style="font-size: 14pt;">a religião católica dividiam-se os pecados em pecados mortais e pecados veniais. Dos mortais tratava, sem perdão (assim se esperava), o sistema judicial. Dos veniais, da inveja, da mentira, da maledicência, tratava, com tolerante bondade, a religião. Hoje, provavelmente, já nem isso. Esse tipo de pecado já não existe: o pecado virou afirmação da personalidade.<o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;">É-se parvo e é-se intriguista não por qualquer deformação de caráter, mas por formação de caráter. Transformamo-nos na sociedade do cada um é como é. Uma sociedade inconfessável em que as pessoas dizem “ponto” para iluminar o seu discurso verbal, para nos dizerem que não querem ouvir, só querem afirmar. Para quando a “vírgula” e o “ponto e vírgula” no discurso oral? As conversas fenecem na estenografia moderna da afirmação pessoal. Sem pecado algum.<o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;">Como pode haver pecado num país que se transforma alegre e progressivamente num imenso bingo? A educação, a saúde, o futuro dos jovens, fenecem na incompetência de quem nos governa, mas o cidadão anseia apenas pelo novo cartão da sorte. Aquele em que António Costa distribuirá o prémio eventual. Um país que não procura a sorte, mas espera, como um viciado em raspadinhas, a sorte. Linha! Ora são 120€ para aquele senhor ali ao fundo. Bingo! Ora são 240€ para aquele casal à minha esquerda. Num país em que, na realidade, o verdadeiro pecado – capital e irremissível – é achar que o Ronaldo e os “seus problemas” são a consagração do patético.<o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;">Se me confessasse hoje, teria eu a capacidade de simplificar os meus pecados em palavras, atos e omissões inteligíveis como outrora o fiz?</span><span style="font-size: 14pt;"><o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;"> </span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 26pt;">N</span><span style="font-size: 14pt;">ão sei. Confesso apenas que gostaria de me concentrar mais no futuro do que no passado. Só isso. O passado é já a frase anterior. Olhar, então, para os dias e para a mulher que amo e verbalizar: dois pontos, mudar de linha, travessão. Tornando assim interminável aquilo que é, dizem, finito.<o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;"><br /></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;"><br /></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 9pt;"><i><span style="font-size: 9pt;">“A maior parte das vezes (...) confessamo-nos aos que se parecem connosco e partilham as nossas fraquezas. Não desejamos, pois, corrigir-nos, nem tornar-nos melhores: seria preciso, antes de tudo, que fossemos considerados fracos. Desejamos apenas ser lastimados e encorajados no nosso caminho.”<o:p></o:p></span></i></p><p align="right" class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: right; text-indent: 9pt;"><span style="font-size: 9pt;">Albert Camus. </span><i><span style="font-size: 9pt;">A Queda.</span></i><span style="font-size: 9pt;"> 1956.</span><span style="font-size: 9pt;"><o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: right; text-indent: 9pt;"><span style="font-size: 9pt;"><br /></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: right; text-indent: 9pt;"><span style="font-size: 9pt;"><br /></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: left; text-indent: 9pt;"><span style="font-size: 9pt;">Publicado a 28 de dezembro de 2022 in O Comércio de Guimarães</span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: left; text-indent: 9pt;"><span style="font-size: 9pt;"><br /></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: left; text-indent: 9pt;"><span style="font-size: 9pt;">Imagens: Fernandel em D.Camilo, realizado por Jean Duvivier, 1952</span></p>Rui Vítor Costahttp://www.blogger.com/profile/07059965221323441539noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-1159177454361764807.post-28247143745477092972022-12-01T09:48:00.005+00:002022-12-02T09:09:19.595+00:00A ESTONTEANTE FORÇA DA ESTUPIDEZ<p> </p><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhkme_8YlYoCEZ8eqGmKH66veprU76ZMrtofolS_rWs5Umbrbn4aF5bL4qmDGrPS6BZUo0iW00ExSi6bRP4dRbWv9BUCZ6WXE6WCDuhMww-xiMCZNmzrm-BcI1ZwTuNr8PmBRfNJVKxHt5lFr1kaIQSBirDxCltgUyuBSuWMig6rtkggl2BFY2XE9w2/s1456/einstein%20e%20elsa%20viagem%20a%CC%80%20America%201930.webp" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" data-original-height="1020" data-original-width="1456" height="273" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhkme_8YlYoCEZ8eqGmKH66veprU76ZMrtofolS_rWs5Umbrbn4aF5bL4qmDGrPS6BZUo0iW00ExSi6bRP4dRbWv9BUCZ6WXE6WCDuhMww-xiMCZNmzrm-BcI1ZwTuNr8PmBRfNJVKxHt5lFr1kaIQSBirDxCltgUyuBSuWMig6rtkggl2BFY2XE9w2/w390-h273/einstein%20e%20elsa%20viagem%20a%CC%80%20America%201930.webp" width="390" /></a></div><p></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 26pt;">H</span><span style="font-size: 14pt;">á mais de duas décadas atrás era relativamente fácil distinguir se uma pessoa, qualquer que ela fosse, </span><span style="font-size: 14pt;">pertencia ao clã dos estúpidos, ou ao clã dos inteligentes. A estupidez de alguém dava-se ao outro sem grandes prolegómenos, a inteligência, mais escorregadia, demorava um bocadinho mais de tempo a perceber, mas percebia-se. Por outro lado, a estupidez ou a inteligência, nunca tiveram, para mim, a ver com cultura ou ausência dela. Confundir cultura com inteligência era então um erro comum. O acumular de informação, como a acumulação de capital, não tem interesse nenhum (pelo menos para os outros) se não for investido. <o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;">O século XXI, no entanto, confundiu os palcos em que cada uma das espécies se movimentava. O valor da fama substitui o valor da razão e as coisas complicaram-se, enevoaram-se. Começaram a surgir subcategorias híbridas que se afirmam mais do que as categorias puras. A inteligência estúpida ou a estupidez inteligente tomaram conta do palco público e vieram confundir, pelo menos em mim, a simplicidade da antiga dicotomia.<o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;"> </span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 26pt;">M</span><span style="font-size: 14pt;">as essa possibilidade híbrida sempre existiu em potência. Qualquer um de nós, por muito que uma das características se afirmasse como predominante, é uma espécie de <i>blended </i>desses dois estados. Um sobrepõe-se, mas o outro está lá: sempre pronto a desabrochar.<o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;">As pessoas sempre inteligentes são profundamente maçadoras. As pessoas sempre estúpidas são igualmente cansativas. Optei, desde miúdo, por ecossistemas mais inteligentes, mas, em boa verdade, diverti-me superiormente quando a estupidez aflorava. A cretinice do “que se lixe, vamos experimentar” ensinou-me muita coisa que, de forma ponderada, nunca aprenderia. <o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;"> </span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"></p><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgvf4-cECEiVjuLWy-_cH3XwEMjm4XfBLbDVHqMHNkwJCrVQ2opTMcIykauE1O4K-wG_LQb4ZqS12eSJbuBx0V0vc9iwlxGzpH6BFfUOqBWRvFd3dBEfvX2-lyeE7RI2zqmaefj4guU3svtTQ5PzMemOGlFadWpNX4MW7twmJMDpUCYjDsQgooDAiKv/s800/Einstein%20NY1921.jpeg" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" data-original-height="637" data-original-width="800" height="255" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgvf4-cECEiVjuLWy-_cH3XwEMjm4XfBLbDVHqMHNkwJCrVQ2opTMcIykauE1O4K-wG_LQb4ZqS12eSJbuBx0V0vc9iwlxGzpH6BFfUOqBWRvFd3dBEfvX2-lyeE7RI2zqmaefj4guU3svtTQ5PzMemOGlFadWpNX4MW7twmJMDpUCYjDsQgooDAiKv/s320/Einstein%20NY1921.jpeg" width="320" /></a></div><p></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;"><br /></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;"><br /></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 26pt;">O</span><span style="font-size: 14pt;"> iluminismo do século XVIII veio trazer para a arena social a importância da razão. A força da inteligência por oposição à força bruta, o domínio da ciência sobre a crença. Nestes últimos séculos, apesar da abundância de pessoas estúpidas, valorizavam-se imenso as pessoas verdadeiramente inteligentes. Até os estúpidos as valorizavam. Einstein foi uma superestrela, recebida apoteoticamente nos Estados Unidos, mesmo que ninguém percebesse patavina da sua Teoria da Relatividade. Mas lá está: era uma pessoa inteligente e merecia crédito e fama por isso. Tão inteligente era que muitas das suas teorias – como as ondas gravitacionais - só conseguiram ser cientificamente provadas em 2017, cem anos depois da sua visionária formulação. Ao ler, recentemente, a autobiografia do genial químico e escritor Jorge Calado, <i>Mocidade Portuguesa</i>, percebi, pelos relatos da sua infância, o valor e reconhecimento social que homens como Almirante Gago Coutinho então gozavam, da admiração que ele granjeava nos cidadãos que com ele se cruzavam. Gago Coutinho era efetivamente um homem capaz e inteligente, que há cem anos empreendeu, com Sacadura Cabral, a mais louca viagem aérea entre Portugal e o Brasil e foram bem-sucedidos, apesar da estupidez aventureira de o terem feito. Marilyn, agora em voga com o filme <i>Blonde</i>, casou com Arthur Miller, um famoso dramaturgo norte-americano, muito provavelmente pela caução de inteligência que essa união lhe poderia trazer.<o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;"><br /></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"></p><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgYpl17w_ZpvDhQa-pjgQBud86JxtNgHZF1JndH54CtqaXTH7f479S45aDGe3Y562XQrkOblqFql_zhJ4BrAAgIgJVeLL7WBEtoC1UWIhvJJuEFsxF_zI7r2tB4X6F-PbhjRpo3eRptmIFrhTBRL-NeifPz9lzAoUrkYDCJKvJfj-0vnYzNqJ8kHYRY/s690/einstein%20e%20chaplin%20na%20estreia%20de%20luzes%20da%20ribalta%201931.jpeg.webp" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" data-original-height="388" data-original-width="690" height="180" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgYpl17w_ZpvDhQa-pjgQBud86JxtNgHZF1JndH54CtqaXTH7f479S45aDGe3Y562XQrkOblqFql_zhJ4BrAAgIgJVeLL7WBEtoC1UWIhvJJuEFsxF_zI7r2tB4X6F-PbhjRpo3eRptmIFrhTBRL-NeifPz9lzAoUrkYDCJKvJfj-0vnYzNqJ8kHYRY/s320/einstein%20e%20chaplin%20na%20estreia%20de%20luzes%20da%20ribalta%201931.jpeg.webp" width="320" /></a></div><p></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify;"><span style="font-size: 14pt;"> </span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 26pt;">A</span><span style="font-size: 14pt;"> inteligência só existe se for reconhecida e o reconhecimento tem hoje outros alvos. Se dermos uma vista de olhos pelas pessoas mais populares do planeta não encontramos grande inteligência. O Trump provou, sem margem para qualquer dúvida, que a estupidez, a atração preguiçosa pelo obscurantismo, o “é assim porque é assim”, constitui hoje uma marca imbatível. Trump, é justo dizê-lo, libertou a estupidez reprimida e envergonhada, alardeando-a com orgulho, tornando-a uma impante declaração de princípio. É, bem vistas as coisas, um revolucionário libertador. E é à volta deste tipo de personagens, sem nenhum contributo válido para o progresso do mundo, que se constrói o nosso dia-a-dia e o futuro das nações. Existirão, seguramente, mentes brilhantes, mas ninguém as reconhece. A estupidez apoderou-se, definitivamente, do palco mediático.<o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;">O domínio da estupidez é hoje um facto ineludível. E não falo apenas da estupidez estúpida – com essa posso eu bem-, mas fundamentalmente da que mais me irrita: a inteligência estúpida. A inteligência estúpida dos cancelamentos, do politicamente correto, das teorias da conspiração em que a negação da Covid, recentemente, foi uma das mais cintilantes causas.<o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;"> </span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 26pt;">S</span><span style="font-size: 14pt;">alva-se, por estes dias, o humor: uma das mais interessantes formas de inteligência. O humor é o último reduto para denunciar a estupidez, sempre difícil de perceber, sempre bem camuflada na realidade que ganha progressivamente a mesma folhagem que a estupidez tem. Só mesmo rindo é que se aguenta. Daí que o humor, e os humoristas, sejam hoje tão atacados e tão cancelados. <o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;"><br /></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"></p><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgeSHbfCynEe3nSQ-5chJa-ADtYDfvqJ6Mccuhx-DrC2Ny5K2ugJ951QqQPHvdvhlYZZXtFwM1R0-xDjELrpAzRphGJq_M4dn7sMp1qUkZRHVSOrJzjzg8Gq1Om1lef_r683VHeCguhJFgfNRBuvXPfcZP_3Bf0ar8zh8kdPfp5kUaxRDKcP7IZp9sj/s935/capaNYT3.2.29.jpg" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" data-original-height="570" data-original-width="935" height="226" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgeSHbfCynEe3nSQ-5chJa-ADtYDfvqJ6Mccuhx-DrC2Ny5K2ugJ951QqQPHvdvhlYZZXtFwM1R0-xDjELrpAzRphGJq_M4dn7sMp1qUkZRHVSOrJzjzg8Gq1Om1lef_r683VHeCguhJFgfNRBuvXPfcZP_3Bf0ar8zh8kdPfp5kUaxRDKcP7IZp9sj/w370-h226/capaNYT3.2.29.jpg" width="370" /></a></div><p></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><br /></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 26pt;">A</span><span style="font-size: 14pt;">o escrever isto psicanaliso-me. Escrevo-o, pois, no fundo, tenho a mania de que sou inteligente. Então porque o escrevo eu isto, se me vou dessa forma enterrar, escrevendo-o? Porque entro eu neste pântano, quando julgo perceber que o triunfo da estupidez, como o triunfo dos porcos, no brilhante livro de Orwell, não foi mais do que uma reação jacobina à tirania da inteligência, ao mal-estar que ela convoca nos outros? Escrevo-o, pois, acima de tudo, prezo muito a minha estupidez particular. E é preciso cuidar dela. Nunca se sabe se ela não me será, mais do que a inteligência, profundamente útil no futuro próximo.<o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;"><br /></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;"><br /></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: x-small;">Publicado in O Comércio de Guimarães a 30 de novembro de 2022</span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: x-small;"><br /></span></p><p class="MsoNormal" style="margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: x-small;"><span style="font-family: Times New Roman, serif;">Imagens de Albert Einstein (de cima para baixo): viagem de barco para os EUA com Elsa (1930); entrada triunfal nas ruas de Nova Iorque (1920), com Chaplin na estreia de Luzes da Cidade (1931) e notícia do New York Times (3.2.1929).</span></span></p>Rui Vítor Costahttp://www.blogger.com/profile/07059965221323441539noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-1159177454361764807.post-29270475459210189462022-11-04T17:50:00.003+00:002022-11-04T17:50:52.206+00:00PREÇOS<p> <span style="font-family: "Times New Roman", serif; font-size: 26pt; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;">H</span><span style="font-family: "Times New Roman", serif; font-size: 14pt; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;">á</span><span style="font-family: "Times New Roman", serif; font-size: 16pt; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"> </span><span style="font-family: "Times New Roman", serif; font-size: 14pt; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;">sempre uma crise, tão inevitável quanto os dias que ela caracteriza e habilita. Desde miúdo que não ouço outra coisa. Da crise do petróleo até à Covid, da dívida soberana à guerra da Ucrânia, há sempre um motivo para se usarem adjetivos pesados, para os preços dispararem, para o rendimento baixar. E a crise é sempre notícia. Dá-se assim relevo noticioso ao permanente e não ao excecional.</span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;"> </span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 26pt;">N</span><span style="font-size: 14pt;">ão vou, ainda assim, falar sobre coisas importantes como o preço do pão ou do gasóleo, mas sobre a cultura, sobre o acesso a ela. Preocupa-me claro que o <i>bijou</i> tenha disparado de 11 para 17 cêntimos, e que o gasóleo consiga ser mais caro que a gasolina. Mas paciência. Tenho que comer menos pão e usar menos o carro: ambas decisões contribuirão aliás para eu melhorar a minha forma física, ou pelo menos para não a piorar. Há que tentar ver algo de positivo nesta permanência.<o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;">Mas com crise, ou sem ela, há uma coisa que me irrita solenemente: o preço da cultura!<o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;"> </span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"></p><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjp0LZZ-qSL7wUCM_GqY8Ord7ZkJdEJN68nTS-QjuoYzW6D6CZ93gnP_tZlF6QfvIbJdB38DJgau6R5CYmoS015qa9p0x1ZEaObogd_21MTVaEKsU-5Nxdi0skUcsH4WhTp-Q_vvVpa6y5DIO2j3lbH6FIbytSyz4ceXUYuUZW7fxdlQW2wc-gHmjoN/s924/2263-good-luck-to-you-leo-grande-photo-nick-wall.jpg.webp" imageanchor="1" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" data-original-height="722" data-original-width="924" height="274" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjp0LZZ-qSL7wUCM_GqY8Ord7ZkJdEJN68nTS-QjuoYzW6D6CZ93gnP_tZlF6QfvIbJdB38DJgau6R5CYmoS015qa9p0x1ZEaObogd_21MTVaEKsU-5Nxdi0skUcsH4WhTp-Q_vvVpa6y5DIO2j3lbH6FIbytSyz4ceXUYuUZW7fxdlQW2wc-gHmjoN/w350-h274/2263-good-luck-to-you-leo-grande-photo-nick-wall.jpg.webp" width="350" /></a></div><p></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><br /></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;"><br /></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 26pt;">Q</span><span style="font-size: 14pt;">uando saio da bolha confortável do Cineclube, irrito-me sempre. Dois bilhetes de cinema, um para mim e outro para a Ana, para ver a fabulosa interpretação de Emma Thompson em “Boa sorte, Leo grande”: 15 euros! Só não gritei ladrões pois não saberia contra quem vociferar e o filme foi mesmo bom e mesmo original. O que me acalmou.<o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;">Acho que me viciei em cinema porque muitas vezes o vi: era acessível. Apesar de não ter uma mesada particularmente generosa, o dinheiro que gastava para ir ver umas quantas sessões não me fazia entrar em <i>default</i> financeiro. Era barato ir ao cinema e os cinemas estavam, por essa altura, cheios de pessoas e não cheios de pipocas. Dessa forma pude engolir dezenas de comédias italianas, dezenas de êxitos de Hollywood, longos filmes bíblicos, o <i>Marcelino Pão e Vinho</i>, algumas cópias já gastas de filmes de espadachim, e, numa noite particularmente especial, ver igualmente <i>O Touro Enraivecido</i> do Scorsese, e, com dezasseis aninhos, ter a brutal epifania de perceber a diferença entre filmes e Cinema. Se o cinema estivesse aos preços de hoje, com a mesada que tinha, nunca poderia ter feito essa magnífica descoberta. Limitar-me-ia, como qualquer adolescente, a “piratear” a Netflix e a achar que cinema era aquilo. E não é. O cinema é propósito, é partilha, é entrar naquela realidade bidimensional e habitá-la tridimensionalmente sem óculos. O <i>streaming</i> não possui magia nenhuma.<o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;">O preço de uma sessão de cinema é absolutamente escandaloso. O cinema sempre foi um escape barato e esse trunfo popularizou-o de forma extraordinária em quase todo o século XX. Com muita xaropada é certo, mas com obras primas que nos eram servidas, em tardes ociosas, ao preço de um croissant e de um café e não para fazer concorrência a uma meia dose de bacalhau à Zé do Pipo, numa tasca competente, como acontece agora. Vou ver o último filme do Clooney, ou comer uma bacalhauzada? Decisão difícil, sem dúvida. Por isso os cinemas estão vazios. Ainda por cima enchem-nos com publicidade e <i>trailers </i>absurdos, ao contrário do bacalhau que se nos apresenta sempre pronto e percetível. Há uns anos quando ia ver um filme do Bergman passavam imagens de um filme do Truffaut que habitaria mais à frente aquele espaço. Agora não, vou ver a elegante Emma e convidam-me a ver o Adão Negro ou o Curral de Moinas, a assinar a NOS. Não há pachorra.<o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;"><br /></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"></p><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjuYcL0X6DpLMRByNPTasFKo94qRvyiVfI59tnzlDX0oOrFW7xb0Eza31pvqw6MS0ZhqbCvpDu5GTZlhcCF-g9Assx14Lo5Zacxs05qBbw0m6LtzxAEeC7_UHzxJg6mQarHW58IkNKcCBlI9EFmfOZlbFrsdM3GEu3yI9leOcR2ncYqMv9446kgH55k/s672/500x.jpeg" imageanchor="1" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" data-original-height="672" data-original-width="500" height="320" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjuYcL0X6DpLMRByNPTasFKo94qRvyiVfI59tnzlDX0oOrFW7xb0Eza31pvqw6MS0ZhqbCvpDu5GTZlhcCF-g9Assx14Lo5Zacxs05qBbw0m6LtzxAEeC7_UHzxJg6mQarHW58IkNKcCBlI9EFmfOZlbFrsdM3GEu3yI9leOcR2ncYqMv9446kgH55k/s320/500x.jpeg" width="238" /></a></div><span style="font-size: 14pt;"><br /></span><p></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify;"><span style="font-size: 14pt;"> </span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 26pt;">N</span><span style="font-size: 14pt;">os livros é a mesma coisa. Ou nos desmultiplicamos em promoções, cartões e saldos acumulados, ou gastamos uma nota das verdes, para levarmos quatro livros que achamos importantes ler. É absurdo!<o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;">Devo às coleções Europa América, Unibolso, RTP, entre outras, a possibilidade de ter lido livros fantásticos ao preço de um pequeno almoço tomado ao balcão de uma confeitaria. Livros interessantes, sem as lombadas que impressionem as visitas de casa, é certo, mas que tinham as letras e as palavras impressas em papel barato. E nem por isso aquelas letras, aquelas palavras, deixavam de ser importantes e decisivas para conhecermos um pouco mais da vida, para viajarmos sem sair do sofá. Hoje é o contrário. A editora Guerra e Paz por exemplo tem uma coleção de “livros amarelos”, muito bonitos - <i>A decadência da mentira</i> de Oscar Wilde é uma pérola-, mas que esticam as letras e as palavras para fazerem de pequenos ensaios um livro caro, quando, parcimoniosamente, o poderiam ter editado por 5€.<o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;">A cultura já não é sequer para remediados (linda palavra esta). Aceder à cultura, sim senhor, mas com sofrimento financeiro.<o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;">Já nem falo do LP e do CD, confinados agora a uns envergonhados metros quadrados nos hipermercados da cultura, sempre a preços absurdos. A caixa que reeditou o<i> Movement</i> dos New Order, lançada em 2019, já esteve a mais de 120€. Queria muito comprá-la, apesar de ter o vinil da altura, pois ela encerra em si um conjunto de preciosidades de um álbum fabuloso e marcante, pelo menos para mim. Vejo agora, na escrita desta crónica, que a caixa (com apenas um vinil, dois CD e um DVD) já está a 75,98€ num desses hipermercados. Perco a cabeça ou espero até 2030 para a comprar numa feira de velharias, num ocioso domingo?<o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;"> </span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"></p><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgDj2jaw6eCuLXTBrhoOfNWjtWQMVmBwCWp5mXXn7Pae1tKaWQvxoe6c7QjFBxRGFMTc1Gs5CUoTDIEga5phDJzWpoRcRDdI8VIYphFez4vvSTBbBcHvPDmx4M9lRYD_nEjKf7IA-AA6cnwIbMhT4o9b9ncyuuIkdXwJej4Afiaz1eAGblMT8rPuE-A/s600/New_Order_Movement_Cover.jpg" imageanchor="1" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" data-original-height="600" data-original-width="600" height="320" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgDj2jaw6eCuLXTBrhoOfNWjtWQMVmBwCWp5mXXn7Pae1tKaWQvxoe6c7QjFBxRGFMTc1Gs5CUoTDIEga5phDJzWpoRcRDdI8VIYphFez4vvSTBbBcHvPDmx4M9lRYD_nEjKf7IA-AA6cnwIbMhT4o9b9ncyuuIkdXwJej4Afiaz1eAGblMT8rPuE-A/s320/New_Order_Movement_Cover.jpg" width="320" /></a></div><p></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;"><br /></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;"><br /></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 26pt;">A</span><span style="font-size: 14pt;"> cultura é uma palavra pesada e, por estes dias, cara. Haverá, no entanto, sempre, malgrado o preço, uma frase, um quadro, uma melodia que nos aproxima de nós mesmos, que nos abre a cabeça e nos revela a estranha essência de que somos feitos. Que nos faz perceber melhor as coisas, a existência e até mesmo entender o pornográfico preço dos <i>bijous</i>. Sim, essas joias feitas de farinha, água e sal.<o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;"><br /></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;"><br /></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 9pt;"><i><span style="font-size: 9pt;">“O universo é apenas uma ideia passageira na mente de Deus – um pensamento bonito e incómodo, sobretudo se se acabou de pagar a entrada para comprar uma casa.”<o:p></o:p></span></i></p><p align="right" class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: right; text-indent: 9pt;"><span style="font-size: 9pt;">Woody Allen. </span><i><span style="font-size: 9pt;">Para acabar de vez com a cultura.</span></i><span style="font-size: 9pt;"> 1971.</span><span style="font-size: 9pt;"><o:p></o:p></span></p><p align="right" class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: right; text-indent: 9pt;"><span style="font-size: 9pt;"><br /></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: right; text-indent: 9pt;"><span style="font-size: 9pt;"><br /></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: left; text-indent: 9pt;"><span style="font-size: 9pt;">Publicado in O Comércio de Guimarães, dia 4 de novembro de 2022</span></p>Rui Vítor Costahttp://www.blogger.com/profile/07059965221323441539noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-1159177454361764807.post-89801723359786116592022-10-07T11:27:00.002+01:002022-10-07T11:27:45.283+01:00VIVER DOS RENDIMENTOS<p></p><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEie5dLVocXNRzy2qSsCBjorZco62E4R2PIq-d2s2y49LSXBkrsmn0NAqj0HhtxjeJckjsobWJ8FG75YIcroIB3XT7dznrW2hnr7N30p5rAx_MMDE8yI0YLvTsQDcjowbkfOCsiKE_fkTu9YTTQkxFjG6cI0FxaQ9LaixyLGc1DbtoSGu6wSK337oa4j/s2000/SAAM-1986.6.92_3.jpg" imageanchor="1" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" data-original-height="1686" data-original-width="2000" height="327" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEie5dLVocXNRzy2qSsCBjorZco62E4R2PIq-d2s2y49LSXBkrsmn0NAqj0HhtxjeJckjsobWJ8FG75YIcroIB3XT7dznrW2hnr7N30p5rAx_MMDE8yI0YLvTsQDcjowbkfOCsiKE_fkTu9YTTQkxFjG6cI0FxaQ9LaixyLGc1DbtoSGu6wSK337oa4j/w388-h327/SAAM-1986.6.92_3.jpg" width="388" /></a></div><br /> <span style="font-family: "Times New Roman", serif; font-size: 10.5pt; text-align: right; text-indent: 9pt;"> </span><p></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 26pt;">N</span><span style="font-size: 14pt;">ão haverá forma mais tranquila de viver a vida que não seja a de usufruir os rendimentos que nos deixaram. Alguém, de família, algures na linha genealógica, fez fortuna e os seus descendentes aproveitam a bênção. Uns, poucos, acrescentam, outros mantêm e a maior parte, por ócio, desinteresse ou inabilidade, desbarata. Não tenho, por natureza pessoal, qualquer reparo a fazer ao caminho escolhido. São, todas elas, escolhas pessoais e legítimas. Mas, pelo menos, que disso haja a consciência!<o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify;"><span style="font-size: 14pt;"> </span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 26pt;">G</span><span style="font-size: 14pt;">uimarães vive muito dos seus rendimentos passados enquanto comunidade. D. Afonso Henriques é o pai principal dessa herança comum. Ao longo do tempo que lhe sobreveio, fomos, entretanto, acumulando um capital social, comunitário e histórico digno de se constituir como uma herança muito, mas mesmo muito, estimável.<o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;">Recentemente, por iniciativa da Assembleia de Guimarães, publicou-se um livro sobre a Unidade Vimaranense. Nesse livro faz-se luz sobre uma iniciativa notável, profundamente enraizada no sentir orgânico da sociedade vimaranense, que, num regime não democrático, teve a coragem de – com muito jeito e inteligência – dizer basta, agindo em conformidade, sem esperar pelas “benesses” da governação nacional ou regional. Esser Jorge descreve com elegância, no livro, esse extraordinário acontecimento, não escondendo, acho eu, alguma angústia na sua escrita pelo facto da comunidade já não ser assim: genuína e generosa.<o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;">Ainda mais recentemente, por iniciativa da Muralha, foi dada a conhecer e/ou a relembrar a saga extraordinária da reconstrução da Praça de Toiros, ardida a 28 de julho de 1947, na exposição A Reconstrução, integrada nas Festas Gualterianas. Apesar de, comparada com a gesta da Unidade, esse movimento comunitário não ter de um alcance estratégico tão grande e marcado, mas na verdade a reconstrução da tourada, em 5 dias, bebe da mesma nobreza de caráter e apego à comunidade. Alinha pela mesma coragem e solidariedade dentro da nossa identidade, de que a Unidade Vimaranense foi, mais tarde, um vivo exemplo.<o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify;"><span style="font-size: 14pt;"> </span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 26pt;">O</span><span style="font-size: 14pt;">lhando para nós hoje, enquanto comunidade, fico deveras angustiado. Às vezes parece-me que somos todos – ou pelo menos a maioria – os estroinas e mimados netos que lembram, em conversa, o sangue azul da família, ou o dinheiro do avô, mas nada fazem para honrar a linhagem ou a fortuna. Preguiçosos e muito pouco dados a desempenhar um papel individual no esforço coletivo, entretemo-nos sempre com coisas menores. E se a queda vertiginosa da imponência social e do carácter orgânico e solidário da sociedade vimaranense se afunda, nada vejo que aplaque essa decadência. Pelo contrário, as redes sociais vieram dar voz a um vimaranensismo medido pelo que se grita e não pelo que efetivamente se diz ou faz. Quando alguém tem coragem de dizer que “o rei vai nu” é exposto à fúria da turba ociosa e a apatia reflexiva transforma-se, como que por milagre, num bulício irracional que não aproveita a ninguém.<o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;"> </span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 26pt;">D</span><span style="font-size: 14pt;">antes ainda nos agarrávamos às estatísticas. Tínhamos mais população, tínhamos mais indústria, tínhamos mais dinamismo social, tínhamos mais história. Tínhamos ... agora já nem isso.<o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;">E como qualquer ocioso neto agarramo-nos ao passado, mas sem inteligência nem rasgo. Comprazemo-nos com a memória das coisas e não construímos memória nenhuma que seja digna de registar. Pelo contrário. E quando assim se procede só sobra uma coisa: a fanfarronice. Olhemos, com olhos de ver, para os últimos minutos da gala do nosso Vitória. Quando o bairrismo é confundido com atitudes estéreis e não como uma afirmação de um propósito comum, que acrescente futuro, estamo-nos a reduzir a uma caricatura daquilo que fomos.<o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;">Paradoxalmente, releio alguns dos discursos da Unidade Vimaranense, a 10 de dezembro de 1970. Na varanda da Câmara juntam-se homens com diferentes percursos e estatutos – há o cuidado até de dar a palavra ao presidente da Junta de Gondar, Benjamim Rodrigues, que transmite à multidão as dificuldades gritantes das populações rurais-, e alguns, que sabem o quão subversiva é aquela manifestação, como Fernando Roriz ou Fernando Alberto Ribeiro da Silva, sublinham nos seus discursos o caráter não político da iniciativa. Uma mentira, claro, mas uma mentira piedosa, num tempo em que se poderia ir preso por afrontar o regime. Essa coragem e visão de agir em vez de reagir, de incluir em vez de ostracizar, de encarar as dificuldades em vez de ficar submerso nelas ou, pior, de esperar que alguém as resolva, escasseia hoje como a água, ou o bom-senso. As elites cumpriam então a sua mais nobre função: a de verbalizarem uma inquietação comunitária, de a liderarem, em vez de se atulharem nas suas idiossincrasias e nos seus medos.<o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;">Mas talvez tudo isto resulte apenas de uma má disposição minha, quem sabe? Vendam-se então as pratas que sobraram da herança e espere-se dos dias a generosidade que deles já não merecemos.<o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;"><br /></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;"><br /></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 9pt;"><i><span style="font-size: 9pt;">“Os de Guimarães envolvem-se fortemente nesses laços de identificação e apertam-nos comunitariamente fazendo-se reconhecer entre si, num singular sentimento generalizado, impossível de ser replicado noutra região.”<o:p></o:p></span></i></p><p align="right" class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: right; text-indent: 9pt;"><span style="font-size: 9pt;">Esser Jorge. </span><i><span style="font-size: 9pt;">Nascimento da Unidade Vimaranense.</span></i><span style="font-size: 9pt;"> 2021.</span><span style="font-size: 9pt;"><o:p></o:p></span></p><p align="right" class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: right; text-indent: 9pt;"><span style="font-size: 9pt;"><br /></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: left; text-indent: 9pt;"><span style="font-size: 9pt;">Publicado in O Comércio de Guimarães de 5 de outubro de 2022</span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: left; text-indent: 9pt;"><span style="font-size: 9pt;"><br /></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: left; text-indent: 9pt;"><span style="font-size: 9pt;">Imagem: </span><span style="caret-color: rgb(96, 106, 115); color: #606a73; font-family: basier, sans-serif; font-size: 12px; letter-spacing: -0.27px;">Edward Hopper, </span><span style="border: 0px; box-sizing: inherit; color: #4d5761; font-family: basier, sans-serif; font-size: 12px; font-stretch: inherit; font-style: italic; letter-spacing: -0.27px; line-height: inherit; list-style: none; margin: 0px; padding: 0px; vertical-align: baseline;"><a href="https://americanart.si.edu/artwork/cape-cod-morning-10760" rel="noreferrer noopener" style="border: 0px; box-sizing: inherit; color: rgb(243, 0, 58) !important; font-family: inherit; font-size: inherit; font-stretch: inherit; font-style: inherit; font-variant-caps: inherit; line-height: inherit; list-style: none; margin: 0px; padding: 0px; text-decoration: none; vertical-align: baseline;" target="_blank">Cape Cod Morning</a></span><span style="caret-color: rgb(96, 106, 115); color: #606a73; font-family: basier, sans-serif; font-size: 12px; letter-spacing: -0.27px;">, ca. 1950 © Smithsonian American Art Museum, Washington DC, USA.</span></p>Rui Vítor Costahttp://www.blogger.com/profile/07059965221323441539noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-1159177454361764807.post-49577188901035560112022-09-07T10:30:00.001+01:002022-09-07T10:30:24.074+01:00DOUTOR GOOGLE<p> </p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 26pt;">P</span><span style="font-size: 14pt;">erdi horas – que todas juntas dariam dias, ou mesmo meses – a discutir factos, quando sobre eles havia discordância.<o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;">Bastava que dois discordassem sobre uma coisa qualquer para se acender a fogueira da discussão. Sobre se um escritor era afinal do séc.XIX ou não, sobre se as nêsperas ou os magnórios são a mesma coisa ou frutos distintos, sobre se um particular golo do Paulinho Cascavel foi marcado ao Covilhã ou ao Aves, sobre qual seria aquela palavra mastigada pela voz do Ian Curtis, e a discordância era transformada numa acalorada discussão em que as partes se digladiavam para convencer a outra da sua razão. A cabeça afadigava-se a encontrar o argumento incontornável. Quando encontrava era a satisfação plena, quando não se encontrava ateava-se o fogo de uma discussão interminável, mas sempre produtiva.<o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;">O Dr. Google matou, entretanto, essa velha retórica. Alguém saca de um telemóvel e logo ali esclarece que o Billy Wilder não era afinal austríaco, nem americano, mas polaco. E o pessoal cala a controvérsia e faz <i>scroll</i> sobre coisas sem interesse nenhum ... alheando-se da vida real e do treino mental que uma boa desinteligência oferece, de borla. O Dr.Google mata hoje até a controvérsia mais banal. O Dr. Google é uma rolha!<o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;"><br /></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"></p><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEil2ycjOBVng4QAn_iuq1aF9xo2YGXjc5zYaokX0cJjMBRIXegNcKt3WSbny3qFzF52MZDk1ZjnOKSGn92gJLJOzU9hFYd_7v5YN4XdbPUgzqFVjw6WM7cQiIVVbpD1JzTK_-pOMCDXfaVom6Z-D1FquI3tgzhKsXarDhOX55oce6jPHIN81O-1j_qM/s900/%C2%A9%20Chappatte%20in%20Le%20Temps%20(Switzerland).jpg" imageanchor="1" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" data-original-height="595" data-original-width="900" height="321" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEil2ycjOBVng4QAn_iuq1aF9xo2YGXjc5zYaokX0cJjMBRIXegNcKt3WSbny3qFzF52MZDk1ZjnOKSGn92gJLJOzU9hFYd_7v5YN4XdbPUgzqFVjw6WM7cQiIVVbpD1JzTK_-pOMCDXfaVom6Z-D1FquI3tgzhKsXarDhOX55oce6jPHIN81O-1j_qM/w486-h321/%C2%A9%20Chappatte%20in%20Le%20Temps%20(Switzerland).jpg" width="486" /></a></div><span style="font-size: 14pt;"><br /></span><p></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><br /></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 26pt;">A</span><span style="font-size: 14pt;"> empresa Google nasceu em setembro de 1998, ancorada nas brilhantes mentes de Larry Page e Sergey Brin. Não sei se ainda nesse ano, ou apenas em inícios de 1999, aderi a um ainda simpático Dr.Google. Utilizava até aí o Yahoo. Troquei-o pelo novo motor de busca e ele foi tomando conta de mim também.<o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;">Em <i>O Médico e o Monstro</i>, a popular novela do escocês Stevenson, o afável Dr. Jeckyl transformava-se inapelavelmente no tenebroso Mr.Hyde que espancava e matava sem remorso algum. Eles habitavam o mesmo corpo e eram duas facetas opostas de uma mesma pessoa. O sucesso literário desta história deveu-se não apenas à ideia simples e genial do autor, mas igualmente àquilo que a estória em nós desperta: o medo pelo Mr. Hyde que há em cada um de nós, ou nos outros.<o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;">O Dr.Google transforma-se, cada vez mais, no seu Mr.Hyde, que nos condiciona e vigia incessantemente. Basta pesquisarmos alguma coisa que implique negócio que isso – sobre o qual ainda não sabemos se queremos - nos aparece sem cessar a cada página visitada. <o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;"><br /></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"></p><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjjx5Ghy6VZskBiJpesZdKFfAkd1fzLfAd5OwjI3CG5k-u0JzpPc05UCUkxWCgLXZtoPFpfgGAVSSMMWxgPxsxG_kqEGG-ycWC6p4nlDm56pzGC08KoEgt-6Y43wgfEV6msHQLlQ8EjnVoko4HOEZRMkQYvelhMnS-7kU8UCSBhmqc85f8ImXdVjax1/s1080/@%20Ben%20Garrison.jpg" imageanchor="1" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" data-original-height="491" data-original-width="1080" height="194" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjjx5Ghy6VZskBiJpesZdKFfAkd1fzLfAd5OwjI3CG5k-u0JzpPc05UCUkxWCgLXZtoPFpfgGAVSSMMWxgPxsxG_kqEGG-ycWC6p4nlDm56pzGC08KoEgt-6Y43wgfEV6msHQLlQ8EjnVoko4HOEZRMkQYvelhMnS-7kU8UCSBhmqc85f8ImXdVjax1/w428-h194/@%20Ben%20Garrison.jpg" width="428" /></a></div><span style="font-size: 14pt;"><br /></span><p></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify;"><span style="font-size: 14pt;"> </span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 26pt;">A</span><span style="font-size: 14pt;"> enorme popularidade do Google deve-se ao facto de ser um perfeito veículo para uma cábula legal e permanente para as nossas falhas de memória … ou até mesmo de cultura. Não há nada que ele não nos ajude a encontrar: seja a forma ideal de confecionar ameijoas à Bolhão Pato ou que o jovem faraó Tutankamon tinha de altura 1,67m.<o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;">Os jovens artesãos da minha geração que passavam mais tempo a fazer cábulas do que eu a estudar – só pelo gozo da malandrice, creio – estariam longe de imaginar que um dia tudo caberia num aparelho que, espante-se, até dá para fazer chamadas telefónicas.<o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;">Havia, no entanto, outros, menos dados aos trabalhos manuais, a quem o Dr.Google nunca seria útil. Era a malta que ia para os testes à espera que alguém lhe passasse a resolução, sempre com aquele ar aflito de fim do mundo. Estão infelizmente em vias de extinção e ninguém se preocupa com isso. Lembro-me que num teste de Física e Química tive tempo para fazer o meu teste e passar as perguntas para uma folha de rascunho que atirei pela janela para dois meliantes que me haviam solicitado a tarefa. Quando os questionei sobre se tinha corrido bem, disseram-me logo que não e repreenderam-me gravemente: não passaste a resolução, como querias que tivesse corrido bem? Ingenuidade a minha.<o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;"><br /></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"></p><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEje9LzwONelwxoinV0onklHavmnYGOOu0snLrCj3DKyDEqU9b91HM85DbG7n6JcKvOcUN9L1tgPQWDk_ZG3Sqf1Xy8smlZNWfsjFz2zdWvmyW_WhMcU7knqmRQ3-5I1_ZvDyzqDiv5-htWUh-Lidc-qp3p4z8YLxLpX94Jv7Ex-qtxI21DCjKDugH-D/s500/@%20Mark%20Linch.jpg" imageanchor="1" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" data-original-height="500" data-original-width="499" height="320" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEje9LzwONelwxoinV0onklHavmnYGOOu0snLrCj3DKyDEqU9b91HM85DbG7n6JcKvOcUN9L1tgPQWDk_ZG3Sqf1Xy8smlZNWfsjFz2zdWvmyW_WhMcU7knqmRQ3-5I1_ZvDyzqDiv5-htWUh-Lidc-qp3p4z8YLxLpX94Jv7Ex-qtxI21DCjKDugH-D/s320/@%20Mark%20Linch.jpg" width="319" /></a></div><span style="font-size: 14pt;"><br /></span><p></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;"> </span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 26pt;">H</span><span style="font-size: 14pt;">á quem fique desesperado pelo facto de não se lembrar de um nome, de uma palavra. Amofinam-se por achar que é a impiedade do tempo cronológico que sobre eles passa, mas não é. Trata-se apenas da falta de espaço disponível na cabeça que, tal como nos computadores, dificulta a pesquisa e a rapidez da coisa.<o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;">Quando eu era jovem lembrava-me de todos os nomes das pessoas que conhecia, não falhava. No entanto, quantas conhecia? Seiscentas, oitocentas, mil? Hoje já devo ter conversado com mais de 10 mil pessoas, talvez mesmo o dobro disso, ou o quádruplo quem sabe. Não me lembrar do nome de alguém não será por isso assim tão grave. Mesmo assim arrisco quase sempre: como está Sr. Santos? Não sou Santos, sou Martins. Desculpe lá ... Sr. Santos. Olá Dina! Não sou a Dina, sou a irmã. OK, irmã da Dina, tão bom rever-te.<o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;">Mas quando acerto no nome, quando acerto – nem que demore tempo – no enquadramento em que conheci a pessoa que tenho surpreendentemente em frente a mim, todo eu deliro, como delirava quando ganhava uma discussão antes do chato do Dr. Google aparecer.<o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;"><br /></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;"><br /></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 9pt;"><i><span style="font-size: 9pt;">“O trabalho intelectual está a acontecer no ecrã e não fora dele.”<o:p></o:p></span></i></p><p align="right" class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: right; text-indent: 9pt;"><span style="font-size: 9pt;">Steven Johnson. </span><i><span style="font-size: 9pt;">Tudo o que é mau faz bem.</span></i><span style="font-size: 9pt;"> 2006.</span><span style="font-size: 9pt;"><o:p></o:p></span></p><p align="right" class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: right; text-indent: 9pt;"><span style="font-size: 9pt;"><br /></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: left; text-indent: 9pt;"><span style="font-size: 9pt;">Publicado in O Comércio de Guimarães a 7 de setembro de 2022</span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: left; text-indent: 9pt;"><span style="font-size: 9pt;"><br /></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: left; text-indent: 9pt;"><span style="font-size: 9pt;"><br /></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: left; text-indent: 9pt;"><span style="font-size: 9pt;">Cartoons (de cima para baixo):</span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: left; text-indent: 9pt;"><span style="font-size: 9pt;"><br /></span></p><p class="MsoNormal" style="margin: 0cm; text-align: left; text-indent: 0px;"><span style="color: #484848; font-family: Source Sans Pro, Arial, sans-serif; font-size: x-small;"><span style="caret-color: rgb(72, 72, 72);">© Chappatte in Le Temps (Suíça)</span></span></p><p class="MsoNormal" style="margin: 0cm; text-align: left; text-indent: 0px;">Ben Garrison</p><p class="MsoNormal" style="margin: 0cm; text-align: left; text-indent: 0px;">Mark Lynch</p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: left; text-indent: 9pt;"><span style="font-size: 9pt;"><br /></span></p>Rui Vítor Costahttp://www.blogger.com/profile/07059965221323441539noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-1159177454361764807.post-18062644559057474842022-07-27T08:36:00.007+01:002022-07-27T08:36:52.530+01:00A RECONSTRUÇÃO<p> </p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 26pt;">A</span><span style="font-size: 14pt;"> Colecção de Fotografia da Muralha (CFM) tem uma história que se confunde com a fundação da Muralha, associação de Guimarães para a defesa do património, em 1981. Na altura, perante a possibilidade do desaparecimento do importante espólio fotográfico de Domingos Alves Machado, a Muralha adquire esses importantes registos de imagem, completados ao longo dos anos.<o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;">A CFM foi digitalizada apenas 3 décadas depois, em 2011, no âmbito da capital Europeia da Cultura, e tem servido, até hoje, para preservar a memória das pessoas e dos espaços que Guimarães comportou, através de exposições, de partilhas e de estudos que sobre ela se fazem de forma sistemática. No entanto, a CFM foi incorporando novas imagens contemporâneas resultantes das suas exposições, mas estando, igualmente, atenta a outros espólios que, entretanto, se poderiam perder.<o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;">Um desses importantes espólios pertence à família de João Gualdino Pereira (1923-1991), um jovem que com 23 anos sentiu um forte apelo para documentar fotograficamente o extraordinário feito da comunidade vimaranense que, entre os dias 29 de julho e 2 de agosto de 1947, reconstruiu de forma absolutamente extraordinária a Praça de Toiros ardida e que albergaria um dos números das Festas Gualterianas desse ano. Através da generosidade e interesse da família do fotógrafo amador, e em particular da D. Maria Madalena Pereira, foi possível, através de um protocolo, digitalizar, estudar e tratar essas magníficas imagens que, doravante, integrarão a CFM. <o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;">Assim, será possível fazer-se este ano de 2022 uma exposição pública integrada nas Festas Gualterianas, no Largo de S. Francisco, que, esperamos, constitua um importante contributo histórico para as Festas. Inaugurar-se-á na noite de 28 de julho e ficará até 24 de agosto naquele esplêndido espaço aberto.<o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;"><br /></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"></p><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhGL-IlhCLNTTfk1ZAuTDKQhAHGQ01ICr9gpQasI4eEh7WsLN9vTnTkUTd7gaURGYM_gR3KUCADlQpFyJFfKBvLTgUdXVpr6nUlkLQSDAQj0VA35aYWlWbM4ScSh-EHNp9HgCVRotfU2nx7dfm0rrxjYvaQQUNxgN4ecn9Gd7gwZGso7iurMCwa-bWa/s1280/PTJGPCFM012.jpeg" imageanchor="1" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" data-original-height="1280" data-original-width="1280" height="320" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhGL-IlhCLNTTfk1ZAuTDKQhAHGQ01ICr9gpQasI4eEh7WsLN9vTnTkUTd7gaURGYM_gR3KUCADlQpFyJFfKBvLTgUdXVpr6nUlkLQSDAQj0VA35aYWlWbM4ScSh-EHNp9HgCVRotfU2nx7dfm0rrxjYvaQQUNxgN4ecn9Gd7gwZGso7iurMCwa-bWa/s320/PTJGPCFM012.jpeg" width="320" /></a></div><span style="font-size: 14pt;"><br /></span><p></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;"> </span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 26pt;">A</span><span style="font-size: 14pt;">o estudar este magnífico empreendimento comunitário tive, confesso, algum receio pelo atavismo inerente à tarefa de trazer ao conhecimento de todos, 75 anos depois, tão heroica realização. O facto é tão extraordinário, tão inacreditável, que temos sempre o medo de perpetuar alguma autocontemplação comunitária que nos impeça de estar mais atentos e críticos em relação ao presente. Mas a história é tão boa...<o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;"><br /></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"></p><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEimOKMbKufhouVkN-tEFAt2ZYQOycb5BZZXlW6Wbo-olevv_nugpIQXi_j2gF7tIE4bpRUL8Uo2XyKS6I9koMauDmXuxdAqxKYREdbBkIRgx6ewrMAbRe9SE2f_Uffp8GzUexwlbKMj2_REYg2hoyFzdRrtIvLZWU381fDSgOgsFekvDSBXr5dswTxT/s1280/PTJGPCFM055.jpeg" imageanchor="1" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" data-original-height="897" data-original-width="1280" height="224" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEimOKMbKufhouVkN-tEFAt2ZYQOycb5BZZXlW6Wbo-olevv_nugpIQXi_j2gF7tIE4bpRUL8Uo2XyKS6I9koMauDmXuxdAqxKYREdbBkIRgx6ewrMAbRe9SE2f_Uffp8GzUexwlbKMj2_REYg2hoyFzdRrtIvLZWU381fDSgOgsFekvDSBXr5dswTxT/s320/PTJGPCFM055.jpeg" width="320" /></a></div><p></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><br /></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 26pt;">N</span><span style="font-size: 14pt;">a madrugada do dia 28 de julho de 1947 um incêndio destruiu a Praça de Toiros que então existia, em madeira, no Campo da Perdiz, em local muito próximo ao Cemitério da Atouguia, tendo ficado apenas aquilo que não era combustível: a terra e as pedras que delimitavam o círculo da arena.<o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;">A desolação que então se sentiu em Guimarães foi tremenda. A festa brava aprazada para os dias 3 e 4 de agosto, já com tudo contratado, não se realizaria, pois era impossível arranjar alternativa.<o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;">Nos jornais da época há relatos dessa desolação e da loucura de alguns, logo naquela infausta manhã, em sonharem reconstruir a Praça de Toiros. Os relatos das conversas dessa manhã são esclarecedores: era impossível reconstruir, não existiam nem meios, nem gente, nem tecnologia que ajudasse à tarefa.<o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;">No entanto, às primeiras horas da tarde, começa a consubstanciar-se a hipótese de fintar o impossível. Neste jornal, a 1 de agosto de 1947, escreve-se o seguinte sobre esse dia zero:<o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;"> </span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><i><span style="font-size: 14pt;">(...) Entretanto, passava o tempo, e nem ao menos se sabia qual a solução a tomar. <o:p></o:p></span></i></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><i><span style="font-size: 14pt;">Alguém, com as lágrimas nos olhos e a fé no coração, balbuciou: E se tentássemos o milagre de reconstruirmos a Praça em cinco dias? Quando os Vimaranenses querem, não há barreiras que não transponham! <o:p></o:p></span></i></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><i><span style="font-size: 14pt;">Surgiu a esperança, e às 3 horas da tarde repicam os sinos, e os nossos motoristas, a briosa classe dos trabalhadores do volante, fazem silvar as sirenes dos seus carros e atravessam em fila algumas ruas da Cidade, anunciando a boa nova: <o:p></o:p></span></i></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><i><span style="font-size: 14pt;">VAI RECONSTRUIR-SE A PRAÇA DE TOIROS DE GUIMARÃES! <o:p></o:p></span></i></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><i><span style="font-size: 14pt;">Far-se-á o milagre! <o:p></o:p></span></i></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><i><span style="font-size: 14pt;">E o povo acorre ao local do sinistro. <o:p></o:p></span></i></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><i><span style="font-size: 14pt;">Centenas de mulheres, homens e creanças, removem os destroços, e num momento, o local ficou limpo, pronto a trabalhar-se. (...)<o:p></o:p></span></i></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;"> </span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"></p><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjAivPJ99pB9St8Q0IlmLzHHA2A5vYVFTYQIvuX1brs3_swJlXeBUpDbzQaOsxg33h7pi3lPKIC8lYtuVJrNpeVoWGcpZbA9Hdoghp6vFDjMhpiYlgrN1llqRRPrVz1BppIJO6B8L98md7Kwx6YUqvk-slukeRtS55eRUATrgMwiG5fzJnw7W48KHst/s1280/PTJGPCFM077.jpeg" imageanchor="1" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" data-original-height="866" data-original-width="1280" height="217" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjAivPJ99pB9St8Q0IlmLzHHA2A5vYVFTYQIvuX1brs3_swJlXeBUpDbzQaOsxg33h7pi3lPKIC8lYtuVJrNpeVoWGcpZbA9Hdoghp6vFDjMhpiYlgrN1llqRRPrVz1BppIJO6B8L98md7Kwx6YUqvk-slukeRtS55eRUATrgMwiG5fzJnw7W48KHst/s320/PTJGPCFM077.jpeg" width="320" /></a></div><span style="font-size: 14pt;"><br /></span><p></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 26pt;">O</span><span style="font-size: 14pt;">s relatos dos jornais locais e nacionais da época impressionam. E quem escreve já não o faz de uma forma contida, própria à seriedade de que o jornalismo se investe, mas carrega os textos de adjetivos e de pasmo.<o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;">Os <i>serrinhas</i> vão para Aldão cortar árvores que servirão de suporte à estrutura da Praça e entram na cidade, precedidos pela Banda das Oficinas de S.José, como heróis, aplaudidos pela multidão que, também ela se afadiga. Novos e velhos, ricos e pobres, doutores e analfabetos, empreiteiros desavindos que entram no local da reconstrução abraçados, crianças que levam pequenos mealheiros para fazerem peditórios, cantinas improvisadas aonde aparece vinho e alimentos para saciar os trabalhadores, mulheres simples e da alta sociedade vimaranense que se afadigam a cozinhar e a servir quem trabalha, a cabine de som, no Toural, na voz de Abílio Gouveia, faz os pedidos necessários - gasolina, alimentos, boleias aos jornalistas de fora-, prontamente satisfeitos e se anuncia de forma eufórica de que foram cumpridas tais solicitações, para gáudio de uma população inebriada com a sua própria força e determinação, são a imagem desses cinco dias absolutamente inacreditáveis.<o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;"><br /></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"></p><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEiSNjEi0hcL718JtzKy_LBD8OTkloBnNJKjzGoxVVm86ZSKHMqMglSixjFwSStibUHPahFrJfkzAr8UmmkXDUiFGWYWKJLk7dKrj9aLt2CG6wAlYGhN7uGnnI8121cGmq-Ca2X2z6do_6i6NhMKFjHNiBvkjxbqOZhAJXHcnzZN-g9IpJKXjR8qE97u/s1280/PTJGPCFM130.jpeg" imageanchor="1" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" data-original-height="881" data-original-width="1280" height="220" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEiSNjEi0hcL718JtzKy_LBD8OTkloBnNJKjzGoxVVm86ZSKHMqMglSixjFwSStibUHPahFrJfkzAr8UmmkXDUiFGWYWKJLk7dKrj9aLt2CG6wAlYGhN7uGnnI8121cGmq-Ca2X2z6do_6i6NhMKFjHNiBvkjxbqOZhAJXHcnzZN-g9IpJKXjR8qE97u/s320/PTJGPCFM130.jpeg" width="320" /></a></div><p></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;"> </span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 26pt;">N</span><span style="font-size: 14pt;">o dia 2 de agosto de 1947, a um dia da primeira corrida, a Praça de Toiros está de pé e tem pormenores de graça que os operários não descuraram, apesar da urgência. No Jornal de Notícias escreve-se que, inclusivamente, 40 trolhas foram dispensados, tal era a generosidade que atravessou a comunidade: não havia que dar-lhes a fazer, relata o diário. No exterior da Praça aparece uma frase simples, mas significativa: OBRIGADO OPERÁRIOS.<o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;">Quando a Praça ficou pronta para receber a população festiva, não foi propriamente a festa brava o motivo de regozijo, mas, seguramente, a capacidade de uma comunidade ter fintado o impossível.<o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;">A nossa comunidade.<o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;"><br /></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 9pt;"><i><span style="font-size: 9pt;">“O fogo não nos venceu! Apenas ateou mais a chama de amor que arde em nossa alma”<o:p></o:p></span></i></p><p align="right" class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: right; text-indent: 9pt;"><span style="font-size: 9pt;">J.Gualberto Freitas. </span><i><span style="font-size: 9pt;">Notícias de Guimarães.</span></i><span style="font-size: 9pt;"> 10.08.1947.</span><span style="font-size: 9pt;"><o:p></o:p></span></p><p align="right" class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: right; text-indent: 9pt;"><span style="font-size: 9pt;"><br /></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: left; text-indent: 9pt;"><span style="font-size: 9pt;">Publicado in O Comércio de Guimarães a 27 de julho de 2022</span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: left; text-indent: 9pt;"><span style="font-size: 9pt;"><br /></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: left; text-indent: 9pt;"><span style="font-size: 9pt;">Imagens Muralha / João Gualdino Pereira (de cima para baixo):</span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: left; text-indent: 9pt;"><span style="font-size: 9pt;"><br /></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: Calibri, sans-serif; margin: 0cm;"><span style="color: #c45911;"><span style="font-size: xx-small;"><b>PTJGPCFM012 – Trabalhos de limpeza do recinto ardido (Campo da Perdiz). 29 de julho de 1947. Guimarães.<o:p></o:p></b></span></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: Calibri, sans-serif; margin: 0cm;"><span style="color: #c45911;"><span style="font-size: xx-small;"><b>PTJGPCFM055 – Almoço dos trabalhadores durante pausa de trabalho. 31 de julho de 1947. Guimarães.<o:p></o:p></b></span></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: Calibri, sans-serif; margin: 0cm;"><span style="color: #c45911;"><span style="font-size: xx-small;"><b>PTJGPCFM077 – Panorâmica geral dos trabalhos de reconstrução da Praça de Toiros. 1 de agosto de 1947. Guimarães.<o:p></o:p></b></span></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: Calibri, sans-serif; margin: 0cm;"><span style="color: #c45911;"><span style="font-size: xx-small;"><b>PTJGPCFM130 – Vista panorâmica da cidade de Guimarães e da parte superior da Praça de Toiros (à esquerda inscrição Obrigado Operários!), no último dia de trabalhos. 2 de agosto de 1947. Guimarães.</b></span><span style="font-size: 10.5pt;"><o:p></o:p></span></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;"> </span></p>Rui Vítor Costahttp://www.blogger.com/profile/07059965221323441539noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-1159177454361764807.post-55131904049212238832022-06-29T10:07:00.001+01:002022-06-30T08:45:33.944+01:00ELOGIO DA TOLERÂNCIA<p> </p><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjbReoN-8iSm0ZBNVB-v8bUm7_r6fochQUz_4zy9K06dlUZqjts-mUjltnI1LcRp5j-U3tXU3uxvoHhztPZ-ISRyaU0rjsJst5AjaJgaDdWT__wvXi2cYX-wkhyjsChMzYDRIxj9XP3T7pvUmMg2MSxenjdYpxKPm2qogaU6Ya52H4q5BPLjeCInamQ/s1078/asas-do-desejo.jpg" imageanchor="1" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" data-original-height="642" data-original-width="1078" height="240" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjbReoN-8iSm0ZBNVB-v8bUm7_r6fochQUz_4zy9K06dlUZqjts-mUjltnI1LcRp5j-U3tXU3uxvoHhztPZ-ISRyaU0rjsJst5AjaJgaDdWT__wvXi2cYX-wkhyjsChMzYDRIxj9XP3T7pvUmMg2MSxenjdYpxKPm2qogaU6Ya52H4q5BPLjeCInamQ/w402-h240/asas-do-desejo.jpg" width="402" /></a></div><br /><p></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 26pt;">Q</span><span style="font-size: 14pt;">uando assumi a maravilhosa – apesar de extenuante - tarefa de ser pai, deparei-me com um conjunto de problemas que as crianças tinham e das quais não me apercebera até então: as intolerâncias alimentares. Felizmente apenas as ouvi de outros.<o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;">A intolerância à lactose, ou ao glúten, as mais populares das intolerâncias, sempre me surpreenderam, pois delas só tive conhecimento nos anos 90 e sempre me perguntei porque raio na minha infância essas tolerâncias não existiam, já que a espécie é a mesma. As únicas intolerâncias infantis que, sem custo, me lembro, eram a intolerância à sopa e ao peixe cozido. Porém, essas intolerâncias eram sempre resolvidas medicamente com um berro, uma ameaça, ou, nos casos mais agudos, com um par de estalos.<o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;"> </span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 26pt;">N</span><span style="font-size: 14pt;">ão pretendo, obviamente, dar uma de bota de elástico e dizer que as intolerâncias são inventadas. Não o serão com certeza, mas, na minha perceção, ao longo dos anos, assisti à profissionalização da desgraça, escrutinando-se nas crianças problemas reais, mas, igualmente, problemas imaginários, que fazem da parentalidade um exercício de medo, tensão e preocupação, quando poderia ser – muitas das vezes – uma coisa divertida.</span><span style="font-size: 14pt;"><o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;">Ao longo dos anos assisti assim ao nascer de intolerâncias que desconhecia. A alimentar não me atrapalha, as outras sim, porque nunca me habituei a elas. Nem quero habituar.<o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;">Tive a felicidade de me formar enquanto adulto nos anos 80 portugueses, o que foi fantástico. Os anos 80 em Portugal foram particularmente interessantes. Neles houve, seguramente, mais dificuldades económicas do que as que hoje existem (o FMI esteve por cá em 1983 e 1984 e a CEE ainda estava a acontecer), mas nessa década começaram a esboroar-se muitos dos preconceitos e certezas que marcaram Portugal até então. Pareciam, à maior parte de nós, absolutamente patéticas as envergonhadas, mas existentes, saudades do antigo regime e do respeitinho é que é bonito, mas, igualmente, se nos afigurava execrável o jacobinismo pós 25 de abril e a pobreza intelectual do pensamento único.<o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;"> </span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 26pt;">A</span><span style="font-size: 14pt;">pesar do meu posicionamento ideológico, fortemente influenciado pelo meio familiar, e só depois pela compreensão das ideias, sempre tive uma atração magnética pelos meios de esquerda, onde pudesse estar claramente em minoria. A entrada para uma República em Coimbra, e o convívio com outros repúblicos, foi uma decisão feliz, que me enriqueceu culturalmente e ideologicamente. Nunca tive problemas nas discussões políticas, a não ser com pessoas estúpidas. E os problemas que com elas tive não foi pelo posicionamento ideológico delas, mas pela sua estupidez. Ainda hoje os tenho, seja para discutir a intolerância ao pepino (a minha secreta intolerância), a intolerância a uma cor de pele, a uma ideia.<o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;">Quando</span><span style="font-size: 14pt;"> entrei em Coimbra para fazer o meu curso universitário, fi-lo com a mesma e exata disposição com que Sir David Attenborough encarou a sua entrada na selva do Bornéu. Ou seja, estava ali para ver e aprender, para me maravilhar, não tanto pelas matérias curriculares que diretamente me diziam respeito, mas, sobretudo, para me embrenhar na fauna de rapazes e raparigas universitárias que, como eu, ali aterraram, e a quem achava piada por serem, precisamente, diversos de mim.<o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;">Tive vontade, mas também a sorte, de fazer parte de um mundo novo e aberto em que nada era impossível e em que o experimentar era a única e legítima forma de conhecer. No fundo aplicámos, com rigoroso critério, o método científico à nossa própria vida. Daí que namorar uma <i>hippie </i>tardia ou, passados dias, uma betinha irrepreensível, não era nenhum paradoxo irresolúvel, mas a forma mais perfeita de perceber o mundo e a diversidade que nele habita. Digo eu.<o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;"> </span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 26pt;">H</span><span style="font-size: 14pt;">oje a intolerância está por todo o lado, até mesmo a intolerância aos intolerantes que eu nesta crónica professo. Dão-me saudades, por estes dias, das inocentes anedotas que começavam por “era uma vez um português, um francês e um inglês”, sem ninguém ao lado a dizer que aquilo lhe parece um pouco xenófobo. <o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;">A intolerância é o fundo do poço da convivência humana e o mais eficaz coveiro do humor. A intolerância é chata e nada se aprende com ela. Por outro lado, a tolerância é sempre esclarecida, mesmo que o não seja.<o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;"><br /></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;"><br /></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 9pt;"><i><span style="font-size: 9pt;">“Substituímos o diálogo pelo comunicado. Esta é a verdade, dizemos.”<o:p></o:p></span></i></p><p align="right" class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: right; text-indent: 9pt;"><span style="font-size: 9pt;">Albert Camus. </span><i><span style="font-size: 9pt;">A Queda.</span></i><span style="font-size: 9pt;"> 1956.</span><span style="font-size: 9pt;"><o:p></o:p></span></p><p align="right" class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: right; text-indent: 9pt;"><span style="font-size: 9pt;"><br /></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: left; text-indent: 9pt;"><span style="font-size: 9pt;">Publicado in O Comércio de Guimarães a 29 de junho de 2022</span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: left; text-indent: 9pt;"><span style="font-size: 9pt;">Imagem: Bruno Ganz em As asas do Desejo. Wim Wenders. 1987.</span></p><p align="right" class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: right; text-indent: 9pt;"><span style="font-size: 9pt;"><br /></span></p><p align="right" class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: right; text-indent: 9pt;"><span style="font-size: 9pt;"><br /></span></p>Rui Vítor Costahttp://www.blogger.com/profile/07059965221323441539noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-1159177454361764807.post-22820491317480482272022-05-31T19:07:00.002+01:002022-05-31T19:07:55.985+01:00Tempo<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhvrbnWSWrGZnPr3i92nu8hlWoq5HKE-RgtqnKilaa70nmrrcaGK8ysM2jy_e11uCJ0u8udjutceLh7v7_JsS8iXIbwSkoljuu8rqR4IT23A8H2Y5vEHC-HKfKlt2zoBFES8jSaji-ddYGzYNoyfXHIgWYHB6bSVe5FyID9sreszTXe77O_nP2s4L28/s1280/captura-de-ecra-2020-12-18-as-161535.jpg" imageanchor="1" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" data-original-height="864" data-original-width="1280" height="243" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhvrbnWSWrGZnPr3i92nu8hlWoq5HKE-RgtqnKilaa70nmrrcaGK8ysM2jy_e11uCJ0u8udjutceLh7v7_JsS8iXIbwSkoljuu8rqR4IT23A8H2Y5vEHC-HKfKlt2zoBFES8jSaji-ddYGzYNoyfXHIgWYHB6bSVe5FyID9sreszTXe77O_nP2s4L28/w360-h243/captura-de-ecra-2020-12-18-as-161535.jpg" width="360" /></a></div><p> <span style="font-family: "Times New Roman", serif; font-size: 26pt; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;">T</span><span style="font-family: "Times New Roman", serif; font-size: 14pt; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;">enho alguma dificuldade em entender a preocupação geral com o tempo meteorológico. Não sendo nenhum de nós nem agricultor, nem pescador, nem noiva nas proximidades do casamento, a obsessão pelo tempo parece-me sempre exagerada. </span></p><p><span style="font-family: "Times New Roman", serif; font-size: 14pt; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;">Como vai estar o tempo? Já viste este tempo? São frases de uma retórica escusada que de nada adianta ao próprio tempo, preenchendo, quando muito, o espaço de conversas indolentes. O tempo, esse tempo meteorológico que tanto nos consome, será sempre afinal adivinhável quando se abre a janela pela manhã. Para quê sofrer por antecipação e esmiuçar as previsões a dez dias? Fará o tempo que tiver que fazer.</span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;"> </span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 26pt;">N</span><span style="font-size: 14pt;">o entanto, a centralidade desse tempo é constante nas nossas vidas. Não há jornal que não refira a sua previsão, nem televisão que o não faça igualmente. Às vezes parece que existe uma lei que obriga a fazê-lo, tal como os períodos de antena nas eleições, mas essa lei não existe. Existe apenas o hábito de falar do tempo que vai fazer amanhã, no ontem. Dia após dia. Já puseram raparigas a despir-se para nos distrairmos dessa antecipada realidade, já vimos a previsão ser tão analógica como a vida e, de repente, começar a deslizar furiosamente para o digital e para quadros tão coloridos que magoam a vista e o gosto. Nos mais velhos, seguramente, ficou cravada na memória a gentil presença de Anthímio de Azevedo, um senhor. Cheguei-o a ver apontado com uma espécie de batuta em quadros de ardósia branqueados a giz pelo anticiclone dos Açores, pelas frentes frias, pelas frentes quentes, pela graciosidade das curvas isobáricas. Um maestro do amanhã. Desapareceu hoje a elegância da previsão meteorológica engravatada, mas não a contínua preocupação de a fazer, em quadros animados, nos quais a chuva é sempre, e estranhamente, oblíqua.<o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;"> </span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 26pt;">N</span><span style="font-size: 14pt;">as línguas dos países do Norte há palavras distintas que separam o tempo meteorológico do tempo cronológico. Nos países latinos, como o nosso, isso não existe, já que a amenidade do tempo meteorológico convida à preguiça de o confundir com o tempo cronológico.<o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;">Na língua portuguesa abundam as palavras, mas estranhamente decidimos poupar aqui. Tanto tempo já passou, que tempo está hoje, são frases diversas, e até opostas em termos da profundidade que revelam, mas utilizam ambas o mesmo vocábulo: tempo.<o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;">O tempo que realmente nos preocupa não é seguramente o tempo da chuva ou do sol, mas o nosso tempo em existência, o tempo daqueles que amamos, daqueles com quem conversarmos, daqueles a quem o tempo priva, muitas vezes, da realidade física dos outros, obrigando a memória a preencher vazios ou, na mais inapelável das hipóteses, a abrir feridas ... a que só o tempo pode dar resposta.<o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;">Por isso falar do tempo meteorológico, preocuparmo-nos com ele, é uma espécie de exercício de ilusão para nos referirmos de forma leve ao tempo que realmente nos oprime, preocupa e tantas vezes entristece. Mas, por outras vezes, nos é também generoso.<o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;"> </span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 26pt;">H</span><span style="font-size: 14pt;">abitar a substância do tempo – na feliz expressão de Sophia – é como habitar uma casa. Há quem as transforme e pessoalize, há quem as atafulhe, há quem as minimalize, e há quem pura e simplesmente se acomode ao espaço pré-existente. Uma opção não é necessariamente melhor do que a outra, são apenas diferentes e legítimas as escolhas que têm a ver com cada um de nós, com a nossa vontade, com a nossa disposição, com o nosso tempo interior.<o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;">Quando uma casa fica vazia de alguém que a habitou, é a ela que recorremos para perceber o que se perdeu no tempo e pelo tempo. A casa do tempo cronológico de cada um constrói-se na memória dos outros e, tantas vezes, essa memória metamorfoseia-se em saudade. A palavra que, ao contrário do tempo, verdadeiramente nos sobra.<o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;"><br /></span></p><p align="right" class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: right; text-indent: 14.2pt;"><i><span style="font-size: 11pt;">À memória de João Gomes Alves, um amigo.<o:p></o:p></span></i></p><p align="right" class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: right; text-indent: 14.2pt;"><i><span style="font-size: 11pt;"><br /></span></i></p><p align="right" class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: right; text-indent: 14.2pt;"><i><span style="font-size: 11pt;"><br /></span></i></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 9pt;"><i><span style="font-size: 9pt;">“A nossa ignorância permitia-nos viver, tal como quando estamos na montanha e a corda está gasta e prestes a rebentar, mas nós não sabemos e prosseguimos a escalada.”<o:p></o:p></span></i></p><p align="right" class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: right; text-indent: 9pt;"><span style="font-size: 9pt;">Primo Levi. O </span><i><span style="font-size: 9pt;">Sistema Periódico.</span></i><span style="font-size: 9pt;"> 1975.</span><span style="font-size: 9pt;"><o:p></o:p></span></p><p align="right" class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: right; text-indent: 9pt;"><span style="font-size: 9pt;"><br /></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: left; text-indent: 9pt;"><span style="font-size: 9pt;"><br /></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: left; text-indent: 9pt;"><span style="font-size: 9pt;">Imagem: RTP</span></p><p class="MsoNormal" style="margin: 0cm; text-align: left; text-indent: 9pt;"><span style="font-family: Times New Roman, serif;"><span style="font-size: 9pt;">Publicado in O Comércio de Guimarães, a 1 de </span><span style="font-size: 12px;">junho</span><span style="font-size: 9pt;"> de 2022</span></span></p>Rui Vítor Costahttp://www.blogger.com/profile/07059965221323441539noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-1159177454361764807.post-7345019933513869722022-05-04T20:46:00.001+01:002022-05-04T20:46:14.711+01:00REMAR CONTRA A MARÉ<p></p><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEi5xMXTw_p6IYGX9ViZIfjlQUgQsnYQQKyHqSAVaA6MVKUpUv5zWorAvOIQ-slQ9hBvJgykSLxYw-QrSpuOOKrxxc5yeyeoYeolGO9vER4v1zwM3Po2qB-iDqXuPSwOwonTYaNw9fane7qChxhmYJu0zmoH6wPllCIwyLmzywWKQzCtPgLYUp4hHNjP/s600/Robert%20Delaunay_Homem%20com%20tulipa_1906.jpg" imageanchor="1" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" data-original-height="600" data-original-width="394" height="320" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEi5xMXTw_p6IYGX9ViZIfjlQUgQsnYQQKyHqSAVaA6MVKUpUv5zWorAvOIQ-slQ9hBvJgykSLxYw-QrSpuOOKrxxc5yeyeoYeolGO9vER4v1zwM3Po2qB-iDqXuPSwOwonTYaNw9fane7qChxhmYJu0zmoH6wPllCIwyLmzywWKQzCtPgLYUp4hHNjP/s320/Robert%20Delaunay_Homem%20com%20tulipa_1906.jpg" width="210" /></a></div><br /><p></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 26pt;">H</span><span style="font-size: 14pt;">á umas décadas atrás era de bom tom, para alguns, parecer mais velho. Havia neles a convicção de que ser mais velho é que era bom. Por isso, quando eu era mais jovem, assisti, com um razoável grau de estupefação, à tentativa de - pelo vestir ou pelo falar - algumas pessoas jovens quererem parecer sempre mais velhas e, com isso, adquirirem o grau de respeitabilidade que, segundo quem assim procedia, não lhes era devidamente creditado.<o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;">Ora, quando somos jovens, a honorabilidade não é propriamente a maior das nossas preocupações. Era-o, no entanto, para alguns da minha geração, ainda na inércia da geração que os precedeu, mas a maioria já não estava preocupado com essa pesada herança que nos aprisionava em longos almoços ou jantares de família, com aquelas perguntas aborrecidas do que queremos fazer na vida, quando o que queríamos efetivamente fazer era o pormo-nos a andar dali para fora e fazermos coisas relativamente pouco respeitáveis. Como não existiam telemóveis para desviar as atenções, ficávamos ali, debaixo daquele fogo cruzado, à espera de uma altura já não tão escandalosa para ir ter com os amigos sob um pretexto mais ou menos jovem, apesar de compreensível aos outros.<o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;">Como as regras desses almoços eram rígidas não era fácil escapar, mas a gente fazia por isso.<o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;"> </span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"></p><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhIflEgQ1YdAGeHZ3m2VGgdjXNJiSZG57RR-ri3923ELFuCl6HAqeHsZvLKsQGSupFpkov-iit7Eieh0JLT5wUUz3vntvNm_sEKxEH72Evr6pb8gG9MsGWZIv3utqMf_7o-1moYKEdn4NH1hv5B3mE0KGfHfc1qXuAdBdagvD-Qt_21lsUG_gi8b5jN/s612/Robert%20Delaunay_Ritmo_1912.jpg" imageanchor="1" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" data-original-height="600" data-original-width="612" height="314" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhIflEgQ1YdAGeHZ3m2VGgdjXNJiSZG57RR-ri3923ELFuCl6HAqeHsZvLKsQGSupFpkov-iit7Eieh0JLT5wUUz3vntvNm_sEKxEH72Evr6pb8gG9MsGWZIv3utqMf_7o-1moYKEdn4NH1hv5B3mE0KGfHfc1qXuAdBdagvD-Qt_21lsUG_gi8b5jN/s320/Robert%20Delaunay_Ritmo_1912.jpg" width="320" /></a></div><p></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;"><br /></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 26pt;">O</span><span style="font-size: 14pt;"> que me irritava naqueles que, com a minha idade, queriam ser e, sobretudo, parecer respeitáveis é que deitavam frequentemente por terra todas as mudanças de costumes que nós dizíamos, em casa, serem já inevitáveis. Se um “amigo” teu aparece a tua casa, em calças de fazenda e ficava a ouvir, pacientemente, os teus familiares a queixarem-se da espondilose, sabias logo que não irias ter muita sorte para convenceres o agregado familiar da importância sagrada do concerto dos <i>The Clash</i> no Dramático de Cascais. Assim comigo aconteceu, para muita pena minha. E a culpa não era das companhias com as quais iria ao concerto, mas das companhias que nem sequer sabiam do concerto.<o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;"><br /></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"></p><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgW0AvOPn9srxBA9J1-NXW8TXSEsHYIP8SwPiJZ15wEXT2r8aH4YVAXVQn507OlCw4D7id8a3s7cBhVTRi34BkW8HQHCUayHquc4Grrel7XXZWiP97KV0NEpndVweC5wlZqY1i2gRZtSrugdA6GiJrfkPIN6D7uztLyPTXq2YFTcyVF8W2oWi28jSpI/s673/Robert%20Delaunay_Mulher%20portuguesa%20alta_1916.jpg" imageanchor="1" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" data-original-height="600" data-original-width="673" height="285" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgW0AvOPn9srxBA9J1-NXW8TXSEsHYIP8SwPiJZ15wEXT2r8aH4YVAXVQn507OlCw4D7id8a3s7cBhVTRi34BkW8HQHCUayHquc4Grrel7XXZWiP97KV0NEpndVweC5wlZqY1i2gRZtSrugdA6GiJrfkPIN6D7uztLyPTXq2YFTcyVF8W2oWi28jSpI/s320/Robert%20Delaunay_Mulher%20portuguesa%20alta_1916.jpg" width="320" /></a></div><p></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;"> </span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 26pt;">H</span><span style="font-size: 14pt;">oje a loucura é ao contrário. Toda a gente, mesmo os jovens, quer parecer mais jovem.<o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;">No fundo é uma questão de compreensível raridade. Quando abundavam os jovens queria ser-se mais velho, agora, com a escassez de juventude, quer-se estar na faixa etária menos abundante.<o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;">E já não falo sequer dos menos jovens que irrompem pelas festas de adolescentes a quererem dar um passinho de dança, ou do estranho pessoal que insiste nas camisas <i>slim</i> apesar da barriga <i>extra-large</i>, falo em pessoal como eu, com um certo horror ao ridículo, que insiste em fazer coisas pouco recomendáveis para a idade, como desporto ou noitadas com os amigos. Não me parece certo, apesar de o fazer. No desporto pode até ter-se uma cabeça competitiva, mas as pernas é que já não o são há muito. Como nunca me deu para a tranquilidade sedentária das cartas, ainda gosto de jogar umas partidinhas de futebol ou mesmo de voleibol. Havendo uma impossibilidade prática de eu ver a figura que efetivamente faço quando jogo em equipa, continuo, na ignorância, a fazê-la. E aquilo que, quando eu era jovem, era impossível de verbalizar, aparece agora com frequência na boca dos mais jovens: o meu pai está lesionado! Caiu pelas escadas, pergunta alguém mais lógico e assertivo. Não, foi a jogar à bola. E faz-se um silêncio confrangedor.<o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;"><br /></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"></p><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhcur9NO_p6_Idjk7bag3IYtaD-d3p5VE3PVKPiuNglCBFSNj6SOUdqTUVnWLUHiRp3NJzhT7jQM2flsDJDZ6Bq1Cqn3GgK-yCXPg-PpY2FNyzX9wJR5VqTGe_AClAIQp6Kc07TYY5Vlb79EYnA6rO-i9D4EqvJxn8uIaXDvnh-i6ciDzPtpCkpPV7C/s600/Robert%20Delaunay_A%20equipa%20de%20Cardiff_1912-13.jpg" imageanchor="1" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" data-original-height="600" data-original-width="382" height="320" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhcur9NO_p6_Idjk7bag3IYtaD-d3p5VE3PVKPiuNglCBFSNj6SOUdqTUVnWLUHiRp3NJzhT7jQM2flsDJDZ6Bq1Cqn3GgK-yCXPg-PpY2FNyzX9wJR5VqTGe_AClAIQp6Kc07TYY5Vlb79EYnA6rO-i9D4EqvJxn8uIaXDvnh-i6ciDzPtpCkpPV7C/s320/Robert%20Delaunay_A%20equipa%20de%20Cardiff_1912-13.jpg" width="204" /></a></div><p></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><br /></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 26pt;">N</span><span style="font-size: 14pt;">a verdade, se resisti à tentativa de quando era miúdo querer parecer um senhor, hoje não resisto ao inverso. E, modéstia à parte, acho que procedi e procedo, num e noutro caso, com um propósito compreensível. A experiência não deixa nenhum encantamento particular, já a falta dela é um poderoso aditivo para a vida, para se errar alarvemente, para se aprender, para se viver.<o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;">Repetir à exaustão as coisas que sempre nos encantaram, apesar das limitações que sobrevêm, pode parecer um pouco ridículo, mas sucumbir às limitações parece-me bem pior. E enquanto a cabeça não se rende, o resto do corpo tem a obrigação de fazer a necessária companhia. Por isso não viemos nós às peças.<o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;"><br /></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;"><br /></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;"><br /></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 9pt;"><i><span style="font-size: 9pt;">“Sim, podia-se dizer que toda a sua evolução fora uma ascensão consciente e tenaz para a honra, que eliminara pelo caminho todas as inibições da dúvida e da ironia.”<o:p></o:p></span></i></p><p align="right" class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: right; text-indent: 9pt;"><span style="font-size: 9pt;">Thomas Mann. </span><i><span style="font-size: 9pt;">Morte em Veneza.</span></i><span style="font-size: 9pt;"> 1912.</span><span style="font-size: 9pt;"><o:p></o:p></span></p><p align="right" class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: right; text-indent: 9pt;"><span style="font-size: 9pt;"><br /></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: left; text-indent: 9pt;"><span style="font-size: 9pt;">Publicado in O Comércio de Guimarães a 3 de maio de 2022</span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: left; text-indent: 9pt;"><span style="font-size: 9pt;"><br /></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: left; text-indent: 9pt;"><span style="font-size: 9pt;">Imagens de Robert Delaunay:</span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: left; text-indent: 9pt;"><span style="font-size: 9pt;"><br /></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: left; text-indent: 9pt;"><span style="font-size: 9pt;">Homem com tulipa (1906)</span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: left; text-indent: 9pt;"><span style="font-size: 9pt;">Ritmo (1912)</span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: left; text-indent: 9pt;"><span style="font-size: 9pt;">Mulher portuguesa alta (1912)</span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: left; text-indent: 9pt;"><span style="font-size: 9pt;">A equipa de Cardiff (1912-13) </span></p>Rui Vítor Costahttp://www.blogger.com/profile/07059965221323441539noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-1159177454361764807.post-62175270034101500982022-04-26T07:01:00.003+01:002022-04-26T07:01:29.090+01:0025 de abril sempre<p> </p><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEj3NjVoD-0B2lRKxj3_BOeSRrk6uAGHNwQxgiKZHdWVsAScSd5yEmCcd54sou1lEb2yk4G7pmW3Jkz3jIe7pAfqUgFuoynEmtiIvA2Kj378ISSF7pkFlyMVT1njogoZg-S8iXFkGTyvJwNLRYyfLwnr0ToPlnDFGumJOnkNlDqIiZLRgchxdOwvuUpc/s2115/unnamed.jpg" imageanchor="1" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" data-original-height="1437" data-original-width="2115" height="266" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEj3NjVoD-0B2lRKxj3_BOeSRrk6uAGHNwQxgiKZHdWVsAScSd5yEmCcd54sou1lEb2yk4G7pmW3Jkz3jIe7pAfqUgFuoynEmtiIvA2Kj378ISSF7pkFlyMVT1njogoZg-S8iXFkGTyvJwNLRYyfLwnr0ToPlnDFGumJOnkNlDqIiZLRgchxdOwvuUpc/w392-h266/unnamed.jpg" width="392" /></a></div><br /><p></p><p class="MsoNormal" style="font-family: Calibri, sans-serif; font-size: 11pt; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 7.1pt;"><span style="font-size: 12pt;">A 24 de março de 2022 Portugal completou 17500 dias passados sobre o 25 de abril de 1974, ganhando assim, por um dia, ao período anterior que se estendeu desde o golpe de Estado de 28 de maio de 1926 até à data em que o Estado Novo caiu. <o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: Calibri, sans-serif; font-size: 11pt; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 7.1pt;"><span style="font-size: 12pt;">É para mim absolutamente surpreendente esse marco. Quando eu era pequeno, ouvia repetidamente falar dos 48 anos de ditadura, como um período de tempo tão longo, tão grande, tão intransponível, tão granítico, que a minha imaginação não se atrevia a prever uma ultrapassagem numérica dos dias em democracia sobre os dias em ditadura. Mas aconteceu, e ainda bem para o país e para mim que, de forma tão abismada, o testemunho.<o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: Calibri, sans-serif; font-size: 11pt; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 7.1pt;"><span style="font-size: 12pt;">Era muito pequeno quando se deu o 25 de abril, e pertenço a uma família que entrou em paranoia com os desmandos do PREC, mas mesmo muito jovem nunca desdenhei, pelo contrário, do valor da liberdade. Ouvia com o interesse possível para a minha juventude os debates políticos, ouvia também as notícias em português da BBC, em onda média, como anos antes os opositores da ditadura o faziam, e aquele fervor revolucionário dos primeiros anos de democracia era tão vibrante e estimulante que eu parecia habitar num país novo. Espreitava o Expresso, espreitava o jornal Tempo que entrava em minha casa à quinta-feira, espreitava as capas satíricas da Gaiola Aberta que amontoavam transeuntes no eterno Quiosque do Cantinho, ali mesmo ao pé de minha casa, espreitava também, de forma furtiva, algumas revistas francesas, com mulheres nuas que negligentemente eram deixadas ao meu olhar na Livraria Raúl Brandão. Que país fantástico se construía enquanto eu fixava, boquiaberto, as mamas de uma escultural mulher. <o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: Calibri, sans-serif; font-size: 11pt; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 7.1pt;"><span style="font-size: 12pt;">Não alinho, nunca alinhei, com a tentativa injusta e maniqueísta de reduzir o 25 de abril a um casual episódio que libertou na arena política uma data de gente pouco recomendável. Fez parte. E o 25 de novembro de 1975 é, apesar de importante, o abrir mais a porta que abril destrancou. <i>O dia inicial inteiro e limpo</i> de Sophia, continua o mesmo.<o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: Calibri, sans-serif; font-size: 11pt; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 7.1pt;"><span style="font-size: 12pt;">A conquista da democracia é, para mim, uma realização absoluta e ainda devo, hoje, isso aos homens saíram para a rua e depuseram aquele regime obsoleto. Os Salgados, os Sócrates, os Vieiras, não são um resultado da democracia, mas uma consequência da falta de vergonha, da ambição desmedida, enfim, da natureza do homem. Atacar a democracia só porque estas coisas existem é desonesto. Hoje sabemos, pelo menos, que assim é. Noutros tempos nem isso. E, olhando para o mundo hoje, saberemos igualmente que a luta pela democracia não é uma coisa datada, ultrapassada, mas uma luta de hoje e uma luta de sempre.<o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: Calibri, sans-serif; font-size: 11pt; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 7.1pt;"><span style="font-size: 12pt;"> </span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: Calibri, sans-serif; font-size: 11pt; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 7.1pt;"><span style="font-size: 12pt;">O país mudou imenso, entretanto. Um conjunto de valorosos políticos conseguiu que aderíssemos à então CEE. Eu sei que a nossa prestação não foi, e não o é hoje, económica e socialmente, a melhor, mas ainda sou do tempo em que a realidade dos países do centro da Europa relativamente a nós era absurdamente diferente. Hoje já não o é, apesar de tudo.<o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: Calibri, sans-serif; font-size: 11pt; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 7.1pt;"><span style="font-size: 12pt;">No entanto, como gente apegada ao património que somos, mesmo o mais anquilosado e descartável património, foi conservado: a ditadura no futebol.<o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: Calibri, sans-serif; font-size: 11pt; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 7.1pt;"><span style="font-size: 12pt;">Se antes do 25 de abril tivemos um campeão fora dos três eucaliptos do costume (o Belenenses) <i>não emergimos da noite e do silêncio</i> nestes 17500 dias de futebol. Tivemos um novo campeão (o Boavista) pois o major decidiu arregaçar as mangas e, episodicamente, conseguiu - controlando o poder da Liga - beber da poção mágica que se consubstancia na falta de lisura e de verdade desportiva no campeonato português de futebol, que alimenta, à vez, os três eucaliptos.<o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: Calibri, sans-serif; font-size: 11pt; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 7.1pt;"><span style="font-size: 12pt;">Quando o futebol é, acima de tudo, um jogo em que nem sempre os mais ricos e históricos ganham, pois é exatamente isso - um jogo-, porque carga de água temos tão poucos campeões? A Alemanha tem 29 campeões diferentes, a Inglaterra 24, a França 19, a Itália e a Bélgica 16, e até a Espanha do <i>generalíssimo </i>Franco conseguiu ter 9 campeões. <o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: Calibri, sans-serif; font-size: 11pt; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 7.1pt;"><span style="font-size: 12pt;">Se antes do 25 de abril havia uma certa mansidão na forma como se encarava a ditadura dos três, era de bom tom não questionar, depois do 25 de abril é absurdo pensar que clubes como o Vitória (em particular nas épocas de 85/86, 86/87 ou 89/90, ou mesmo através das magníficas equipas do pós-25 de abril), ou o Braga, não tenham conseguido ganhar campeonatos. Mesmo o Boavista mais do que uma vez, ou, há mais tempo, o Vitória de Setúbal ou a Académica. No momento certo, creio firmemente, tiraram-lhes a possibilidade de lutar pelo título, quer por criativas arbitragens ou por absurdos castigos decididos pela oligarquia do futebol nacional. Lembro-me, por exemplo, no nosso caso, do escandaloso castigo ao Jeremias, precisamente na época ... do 25 de abril (74/75). O Diário de Lisboa, por essa altura, escrevia títulos como estes: “Jeremias na prateleira para alívio da concorrência” (9.1.75, p.21) ou “Guimarães protesta com a razão pelo seu lado” (10.1.75, p.20). Hoje, igualmente em democracia, não vejo qual o jornal que se atrevesse a dar títulos contra a “verdade” dos três, a justiça do penalti que a favor deles marcam, ou do jogador adversário que oportunamente expulsam. <o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: Calibri, sans-serif; font-size: 11pt; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 7.1pt;"><span style="font-size: 12pt;">Hoje, esse estado de coisas, essa ditadura de Porto, Benfica e Sporting, continua aflitiva. A máquina de propaganda dos eucaliptos é esquizofrénica e tentam-nos convencer, dia a dia, de que somos nós a estar malucos. E, se reparem, é dos três crónicos que se ouvem mais queixas sobre as arbitragens – eles que controlam as classificações dos árbitros e o que se diz e escreve-, amplificadas pela acefalia muito <i>orwelliana</i>dos seus seguidores.<o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: Calibri, sans-serif; font-size: 11pt; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 7.1pt;"><span style="font-size: 12pt;">Tenho um imenso orgulho em pertencer a um clube que subiu o número de associados e de assistência aos jogos, quando caiu, de forma absurda, mas possível, porque o futebol é um jogo, na segunda divisão. Tenho pena que outros clubes históricos não tenham igualmente essa capacidade de resistência, precisamente porque a lavagem cerebral (mesmo em democracia) é um facto ineludível, pesado e ditatorial. Os três, à força de venderem mais umas camisolinhas, tomaram conta, como os regimes ditatoriais o fazem, do espaço mediático e permitem assim aos tristes que se alegram, a tonta e pueril satisfação de se dizerem campeões. Campeões gritam eles, ufanos, por um clube de Lisboa ou do Porto, mesmo não sendo eles de Lisboa ou do Porto, ou não tendo raízes que os liguem a essas cidades. E essa tendência de se ser pelos crónicos continua, em democracia, a alastrar como um cancro e a reduzir os restantes clubes a ocasionais convidados de um triste espetáculo que, jornada a jornada, outros orquestram. E para o qual o Vitória e outros clubes são convidados para abrilhantarem um guião previamente escrito e definido, que não admite variações à norma.<o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: Calibri, sans-serif; font-size: 11pt; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 7.1pt;"><span style="font-size: 12pt;">Resta-nos, assim e sempre, a resistência firme e convicta, esperando um dia, como aconteceu em abril, habitar, finalmente,<i> a substância do tempo.</i> Como o perfeito poema de Sophia também a habita.<o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: Calibri, sans-serif; font-size: 11pt; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 7.1pt;"><span style="font-size: 12pt;"><br /></span></p><p class="MsoNormal" style="margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 7.1pt;"><span style="font-family: Calibri, sans-serif; font-size: x-small;">Publicado in Desportivo de Guimarães a 26 de abril de 2022</span></p><p class="MsoNormal" style="margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 7.1pt;"><span style="font-family: Calibri, sans-serif; font-size: x-small;">Imagem: </span><span style="font-family: Calibri, sans-serif; font-size: x-small;">Eduardo Gajeiro</span></p>Rui Vítor Costahttp://www.blogger.com/profile/07059965221323441539noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-1159177454361764807.post-9230841805295017472022-04-06T07:07:00.004+01:002022-04-06T07:51:24.080+01:00O fim do mundo<p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 26pt;">Q</span><span style="font-size: 14pt;">uando eu era pequenito circulava, com frequência, na boca das pessoas mais apopléticas a expressão <i>vem aí o fim do mundo</i>.<o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;">A vir mesmo, e já passaram, entretanto, cinquenta anos, eu estarei provavelmente mais próximo do fim do mundo do que estava na altura em que tal se falava. O que não me consola particularmente. Apesar desse facto, e do diabo do Putin estar hoje particularmente ativo, fala-se menos do apocalipse bíblico do que então se falava. <o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;">O medo é, talvez, o mais poderoso dos instintos humanos. Veja-se a recente pandemia e a figura de tontos que a grande parte de nós de si fez. O medo é mais fácil de instilar na alma humana do que a coragem. A coragem exige um espírito forte e muitas vezes alguma dose de loucura. O medo não, o medo é instantâneo e faz o seu caminho em nós sem qualquer dificuldade.<o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;"><br /></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"></p><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEiuxqIMl7N7bZxYrRMSp1LmflKNNYwx1vCXOSy2yCdozzhyYDiUfmLBxU9bvanqdYKzQe2S80biS1j0wEJQrBBQPnaF0xcBVXmvIm9fIYsfA9Nj9YBGDj8ivhT8mXUZ1Pj9hxrQZ2JhIU8mq4nuNKDhCDAULVyDuI0lukvpvEXiU4XnGItmL6ErBiqw/s639/La%20commedia%20illumina%20Firenze_Domenico%20di%20Michelino_(1465).jpg" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" data-original-height="480" data-original-width="639" height="282" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEiuxqIMl7N7bZxYrRMSp1LmflKNNYwx1vCXOSy2yCdozzhyYDiUfmLBxU9bvanqdYKzQe2S80biS1j0wEJQrBBQPnaF0xcBVXmvIm9fIYsfA9Nj9YBGDj8ivhT8mXUZ1Pj9hxrQZ2JhIU8mq4nuNKDhCDAULVyDuI0lukvpvEXiU4XnGItmL6ErBiqw/w376-h282/La%20commedia%20illumina%20Firenze_Domenico%20di%20Michelino_(1465).jpg" width="376" /></a></div><p></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><br /></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 26pt;">N</span><span style="font-size: 14pt;">esses tempos em que se falava, sem eufemismos, do <i>fim do mundo</i>, a minha avó tinha a fixação de, muitas vezes, me levar com ela, durante alguns dias da semana, a uma missa de fim de tarde na Igreja de S.Pedro. Eu seguia-a porque, fundamentalmente, gostava dela. Ainda assim praticava o meu catolicismo. Lembro-me de me fixar, com o fascínio que o medo muitas vezes convoca, numa das imagens laterais que representava o Inferno. Na base da imagem estavam um conjunto de representações de pessoas suplicantes, gritando no meio das labaredas encarnadas, apesar da tinta ter já oxidado a um grená mais elegante, mas igualmente assustador. A imagem de bispos no meio dos condenados dava um toque transversal e democrático àquele Inferno.<o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;">No entanto, esse exercício espiritual começou a enfadar-me um pouco e, num particular dia, disse que não à minha avó. Fiquei interiormente com sentimento de culpa, com aquele medo de que Deus, num dia particularmente mal disposto para Ele, separasse os bons dos maus e eu ficasse do lado destes últimos. Ainda a minha avó estava na missa e eu apanhei com um cavaco na cabeça quando, incauto, tentei a minha sorte ao passar por baixo da descarga de lenha que então se fazia em minha casa. O sangue jorrou abundantemente e acabei na Ordem de S. Domingos a receber um cuidadoso curativo de uma freira/enfermeira. Não faltei a mais nenhuma missa.<o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;"><br /></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"></p><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjbK8OMCaKk4UqSYeP2jNQ1i33XxZMijXW0Z-1iCXng3rIgLVjr4_KXwqjwcdLV4VBplNeiHiavvsro1jdWHolpfA6CwikxABpDnmGzAo-XYZkwxPzGquBcLSPiQU1bG3l-nT-560VTg_0WRZymOPvPkO35MdUwJCjX-pl4RVINmrtYYDNhXY_R5UjV/s1215/Detalhe%20do%20jardim%20das%20Deli%CC%81cias-hieronymus-bosch.-inferno.-detalhe-de-o-jardin-das-delc3adcias-terrenas.-1495-1505.jpg" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" data-original-height="1000" data-original-width="1215" height="263" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjbK8OMCaKk4UqSYeP2jNQ1i33XxZMijXW0Z-1iCXng3rIgLVjr4_KXwqjwcdLV4VBplNeiHiavvsro1jdWHolpfA6CwikxABpDnmGzAo-XYZkwxPzGquBcLSPiQU1bG3l-nT-560VTg_0WRZymOPvPkO35MdUwJCjX-pl4RVINmrtYYDNhXY_R5UjV/s320/Detalhe%20do%20jardim%20das%20Deli%CC%81cias-hieronymus-bosch.-inferno.-detalhe-de-o-jardin-das-delc3adcias-terrenas.-1495-1505.jpg" width="320" /></a></div><span style="font-size: 14pt;"><br /></span><p></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;"> </span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 26pt;">N</span><span style="font-size: 14pt;">o entanto, eu e os meus amigos, tínhamos, por essa altura, uma imagem pouco bíblica do fim do mundo. Com o amplo sucesso da cultura de massas anglo-saxónica, a nossa imagem de <i>fim do mundo </i>tinha mais a ver com os filmes de série B ou bandas desenhadas que davam um toque mais moderno ao apocalipse. Normalmente, era uma invasão de extraterrestres que fazia com que o mundo acabasse, ou quase, pois havia sempre um herói que lhes encontrava o ponto fraco. Eles com armas poderosíssimas, com naves absolutamente destruidoras, e havia sempre um esperto que descobria que eles não resistiam à aguarrás, ou a um pedaço de toucinho. Tanto fazia. Mas havia sempre um ponto fraco.<o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;">Em bom rigor os extraterrestres também desapareceram de circulação. Dantes enchiam-se páginas sobre o avistamento de OVNI’s, sobre corpos alienígenas a serem estudados em secretas instalações militares norte-americanas, com os olhos esbugalhados e gastavam-se páginas de jornais sensacionalistas nessas andanças. Não sei se será pelo preço do gasóleo ou porque o nosso mundo se tornou efetivamente pouco apetecível para a malta de outras galáxias, mas não há notícias de que tenham voltado para se alimentarem dos nossos pobres miolos. As cabeças já não olham para o céu à procura de disparates alienígenas. As cabeças fixam-se hoje para baixo, no telemóvel, à procura de outras coisas ... igualmente disparatadas.<o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;"> </span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"></p><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhvVtkT0upRArfr7VRcvc2ZujJ-OHw_UsonZ570LVkWinolQ0J2nnn5M0iWlbj0gjlzzyewXUk66H6McdCviGTlyYIr_7Pnx3gZDmUrvHrIFcB9Rg_cSIqBfxM-w33qqHgjMeyHrW-rzViZqzLbW3u_HnKfA7FzVumdm-bo3JccU7UoR51gq8J__DP3/s2560/Tentac%CC%A7a%CC%83o%20de%20Santo%20Anto%CC%81nio_Joos_van_Craesbeeck_(1650).jpg" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" data-original-height="1717" data-original-width="2560" height="237" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhvVtkT0upRArfr7VRcvc2ZujJ-OHw_UsonZ570LVkWinolQ0J2nnn5M0iWlbj0gjlzzyewXUk66H6McdCviGTlyYIr_7Pnx3gZDmUrvHrIFcB9Rg_cSIqBfxM-w33qqHgjMeyHrW-rzViZqzLbW3u_HnKfA7FzVumdm-bo3JccU7UoR51gq8J__DP3/w353-h237/Tentac%CC%A7a%CC%83o%20de%20Santo%20Anto%CC%81nio_Joos_van_Craesbeeck_(1650).jpg" width="353" /></a></div><br /><span style="font-size: 14pt;"><br /></span><p></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 26pt;">O</span><span style="font-size: 14pt;"> nosso Inferno comum é, por estes dias, televisionado. As imagens de corpos prostrados sem remissão nas estradas da Ucrânia dão-nos esse particular e horrendo efeito. Mas, tal como os extraterrestres de outros tempos, também essas imagens irão cansar, mais tarde ou mais cedo, a quem não é ator, mas apenas espetador da desgraça alheia. <o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;">Apesar da literatura de Dante continuar viva, a Igreja Católica terminou já com a ideia de Inferno e Purgatório. O Papa Francisco, na sua habitual elegância retórica e profundo humanismo, disse que o Inferno seria - tão só - estar afastado de Deus. O Inferno não será assim uma condenação, mas apenas uma escolha. <o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;">O <i>fim do mundo</i> de quando eu era pequenito implicava uma espécie de Relatório e Contas pessoal. Ou dava lucro, ou dava prejuízo, ou, estando ali quase no empate, permitia a ideia de Purgatório e de expiação. Hoje, isso já não se usa, como então se usava, e o <i>fim do mundo</i> desapareceu da linguagem, apesar de – pelo menos ambientalmente – estar mais presente do que nunca. É necessário estarmos cientes que o <i>fim do mundo</i> já não dará hoje mais pré-avisos, como, quando eu era pequenito, tão frequente o fazia na boca de quem o temia.<o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;"><br /></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 9pt;"><i><span style="font-size: 9pt;">“(...) pelo que toca aos covardes, aos incrédulos, aos execráveis, aos homicidas, aos fornicadores, aos feiticeiros, aos idólatras e a todos os mentirosos, a sua parte será no tanque ardente de fogo e de enxofre: o que é a segunda morte.”<o:p></o:p></span></i></p><p align="right" class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: right; text-indent: 9pt;"><span style="font-size: 9pt;">S. João. </span><i><span style="font-size: 9pt;">Livro do Apocalipse.</span></i><span style="font-size: 9pt;"> 95dc.</span><span style="font-size: 9pt;"><o:p></o:p></span></p><p align="right" class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: right; text-indent: 9pt;"><span style="font-size: 9pt;"><br /></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: left; text-indent: 9pt;"><span style="font-size: 9pt;"><b>Imagens:</b></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: left; text-indent: 9pt;"><span style="font-size: x-small;">La commedia illumina Firenze_Domenico di Michelino_(1465)</span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: left; text-indent: 9pt;"><span style="font-size: x-small;">Detalhe do jardim das Delícias-hieronymus-bosch.-inferno_(1495-1505)</span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: left; text-indent: 9pt;"><span style="font-size: x-small;">Tentação de Santo António_Joos_van_Craesbeeck_(1650)</span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: left; text-indent: 9pt;"><span style="font-size: x-small;">in Wikipédia</span></p>Rui Vítor Costahttp://www.blogger.com/profile/07059965221323441539noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-1159177454361764807.post-9874687112316047592022-03-08T21:24:00.000+00:002022-03-08T21:24:22.310+00:00Um eufemismo chamado loucura<p> </p><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/a/AVvXsEj07F0p0Ytg45S_lgi394_Wouo5LlLSTALdAX-Aq9mUU-8c_iiD8egtdeckxJw4klqwPQa1q98_7fEwBKMyqabZMdXqUVnmFXGZ-WHruDi47VuCSZAbL8oX76Z-Ji9M3XUu6UA0IR9kJC_7WqS7YtbXmY3bQdhX4QJs7gbEH5RTWb_XjTztcCH59Jo7=s1008" imageanchor="1" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" data-original-height="672" data-original-width="1008" height="230" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/a/AVvXsEj07F0p0Ytg45S_lgi394_Wouo5LlLSTALdAX-Aq9mUU-8c_iiD8egtdeckxJw4klqwPQa1q98_7fEwBKMyqabZMdXqUVnmFXGZ-WHruDi47VuCSZAbL8oX76Z-Ji9M3XUu6UA0IR9kJC_7WqS7YtbXmY3bQdhX4QJs7gbEH5RTWb_XjTztcCH59Jo7=w346-h230" width="346" /></a></div><p></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 26pt;">P</span><span style="font-size: 14pt;">erante a ignominiosa tragédia que, dia a dia, na Ucrânia, nos entra pelos olhos adentro, há quem arrume interiormente a questão dizendo que Putin é louco. Não, Putin não é louco: Putin é um homem mau, muito mau. Uma maldade sem limites na esteira de outros tantos homens maus que marcaram a história trágica dos povos. Muitos, como Hitler, morreram e foram derrotados, outros tantos permaneceram no poder até a morte os vir buscar ... e tiveram funeral de Estado.<o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;"><br /></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"></p><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/a/AVvXsEiOdVN6rUzPnZygHSPjuviR5Spz8h1AF0oonq7_5yXUPR85M6RMq46vRPhGUiHL9eZ-OAgBff8TV5mQahNgcuqwcBA62YhgHx8piQH-89CyThC3mu17A8F5op11Gsey7pUuq-qgtJyi_qn5hxzekNHOTphbvKIV8yPeUvlGkKMosIPuVw-Ia8szQdXo=s1104" imageanchor="1" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" data-original-height="806" data-original-width="1104" height="234" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/a/AVvXsEiOdVN6rUzPnZygHSPjuviR5Spz8h1AF0oonq7_5yXUPR85M6RMq46vRPhGUiHL9eZ-OAgBff8TV5mQahNgcuqwcBA62YhgHx8piQH-89CyThC3mu17A8F5op11Gsey7pUuq-qgtJyi_qn5hxzekNHOTphbvKIV8yPeUvlGkKMosIPuVw-Ia8szQdXo=s320" width="320" /></a></div><br /><br /><p></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 26pt;">N</span><span style="font-size: 14pt;">unca, desde 1945, estivemos tão perto de um conflito bélico à escala mundial, como estamos hoje. Mesmo a crise dos mísseis soviéticos em Cuba (1962) parece uma brincadeira militar face ao que presentemente vivemos.<o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;">Homens igualmente maus, como Estaline, contribuíram para o derrube de uma besta maldosa chamado Hitler. E Hitler também teve, como Putin tem hoje, “justificações” para fazer o que fez: o malfadado Tratado de Versalhes (1919) e a humilhação dos povos germânicos. No entanto os homens maus entendem-se bem, falam a mesma linguagem, e o Pacto Germano-Soviético (1939) foi o culminar desse entendimento: Hitler fazia o que queria sem chatear o outro e Estaline procederia de igual forma. Antes de se “desentenderem” a União Soviética, à boleia do pacto Molotov-Ribbentrop, anexou territórios na Finlândia, Estónia, Lituânia, Letónia, Roménia e Polónia (que ainda hoje fazem parte da Rússia) sob o pretexto, em algumas das invasões, de defender comunidades amigas, igual à justificação agora usada por Putin na região de Donbass na Ucrânia e, igualmente, o pretexto de Hitler para a anexação da Polónia ou da Checoslováquia. O esquema mental dos ditadores não mudou: é o mesmo ontem, como o é hoje. <o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;">No entanto, a maldade e ambição de Hitler eram descomunais e chateou-se com o amigo invadindo a Rússia em 1941. Nessa altura a tenaz heroicidade do povo russo aliou-se à determinação dos europeus e, posteriormente, dos americanos. Nos despojos da derrota de Hitler desceu sobre a Europa, como disse Churchill, um homem bom, uma “cortina de ferro” que aprisionou vários povos na esfera soviética até ao colapso económico e o aparecimento de um homem bom e razoável: Gorbatchov, prémio Nobel da Paz em 1990.<o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;">Apesar de tudo que se passou para além da cortina de ferro, a queda de Hitler permitiu libertar a parte ocidental da Europa para a democracia e a liberdade. Caso contrário estaríamos, provavelmente ainda hoje, a estender o bracinho direito em direção ao céu pois, como disse Simone Weill, “faz parte da História oficial acreditar na palavra de honra dos assassinos”, especialmente quando se é dominado por eles.<o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;">À Ucrânia, país de gente determinada, corajosa e trabalhadora, entalada durante tantos anos do lado de lá da cortina de ferro, não lhe é permitido também hoje viver em paz e democracia de acordo com as escolhas livres dos seus cidadãos. E morrem por isso e sofrem por isso às mãos de um homem visceralmente mau.<o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;"><br /></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"></p><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/a/AVvXsEjpXI64Tb06wN0c3fYuu3qMuW0avXEuzYM8E1ZZJnmCg4ozZwVYdetbxHApWxNIvX68ZvpRV0P2ERPa9zjGclXuBmE7rwrU8Q4ME2pN-J5qFLCJ6GY-d_JRHPalkHQUT5ZGefE0vEcB6IkEK7QB2by5JuI8b9bqwqJ4I8znFw702ujmCralf1iK1ddU=s1008" imageanchor="1" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" data-original-height="671" data-original-width="1008" height="213" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/a/AVvXsEjpXI64Tb06wN0c3fYuu3qMuW0avXEuzYM8E1ZZJnmCg4ozZwVYdetbxHApWxNIvX68ZvpRV0P2ERPa9zjGclXuBmE7rwrU8Q4ME2pN-J5qFLCJ6GY-d_JRHPalkHQUT5ZGefE0vEcB6IkEK7QB2by5JuI8b9bqwqJ4I8znFw702ujmCralf1iK1ddU=s320" width="320" /></a></div><span style="font-size: 14pt;"><br /></span><p></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;"> </span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 26pt;">E</span><span style="font-size: 14pt;">ste conflito coisifica o horror, mas, como todas as coisas más, traz por vezes algo de higiénico. É higiénico perceber (mais uma vez) os inimigos das escolhas democráticas, os saudosistas da cortina de ferro e do poder soviético. Os países livres contêm em si mesmo quem odeia a liberdade e a democracia sem que, por isso, os encarcere e assassine, como está a acontecer, hoje, na Rússia, a quem se manifesta contra a indigna intervenção que, em seu nome, Putin hoje perpetra. É essa a diferença fundamental entre as democracias e os sistemas autocráticos, tantas vezes escondidos (conveniente) por trás de ideologias.<o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;">E a vida nem estava a correr mal a Putin. A sua maldade estava a fazer o seu caminho, através da ascensão dos extremismos na Europa, que ele financiou e financia, através do Brexit ou da insidiosa campanha de <i>trolls </i>russos que bombardearam a campanha de Hillary nas eleições que deram a infame vitória a Trump. O mesmo Trump que, uma semana antes da intervenção russa, definira Putin como um “pacificador” e considerava “genial” o reconhecimento por Putin das zonas de Donestk e Lugansk. Entretanto, pelos vistos, já mudou de ideias, mas continuará, certamente, a venerar Putin e a sua forma “genial” de resolver os assuntos matando, de forma indiscriminada, quem lhe faz frente.<o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;">Será higiénico, igualmente, perceber que a Europa acordou para a dura realidade que hoje enfrenta. Enquanto a Rússia gasta 20% do seu PIB com defesa, a Europa fica pelos 3%, confiando no destino. É higiénico, e sobretudo corajoso, que a Europa não deixe a outros as responsabilidades militares da sua própria defesa, que não se inebrie em pacifismos enganadores que provocam violentos acordares. É higiénico que os mercados não fechem os olhos à indignidade que tantas vezes alimentam, que os países europeus se unam e levantem o rabinho do sofá, pois a defesa dos valores e da cultura ocidental não se faz apenas em conferências, mas, também, ou sobretudo, na capacidade de nos sabermos defender militarmente das agressões totalitárias que, mais tarde ou mais cedo, sempre aparecem.<o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;"> </span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"></p><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/a/AVvXsEg7l5qhMc29koGoLJ2lpFyuMSfwR9B1t4VTa-EnNURbZ-nIa3tPO5LQjyAQBsknhfjOC328Fvpj8MPSyAoqGGntiAm4METoDyvAIsnWqPh8CO4ak0DCGebZkHr9XpeRCLqSDC-sBOntwTzHbytKFA2EppUog20lDKcdF3YiXBC0_CSoT6kQrBg_LSqh=s1008" imageanchor="1" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" data-original-height="671" data-original-width="1008" height="231" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/a/AVvXsEg7l5qhMc29koGoLJ2lpFyuMSfwR9B1t4VTa-EnNURbZ-nIa3tPO5LQjyAQBsknhfjOC328Fvpj8MPSyAoqGGntiAm4METoDyvAIsnWqPh8CO4ak0DCGebZkHr9XpeRCLqSDC-sBOntwTzHbytKFA2EppUog20lDKcdF3YiXBC0_CSoT6kQrBg_LSqh=w347-h231" width="347" /></a></div><p></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;"><br /></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 26pt;">O</span><span style="font-size: 14pt;"> progresso e o bem-estar coletivo não se fizeram na alegria de o alcançar, mas, fundamentalmente, no sacrifício de lá chegar. E hoje, uma vez mais, é o sofrimento que convoca os ucranianos, mas igualmente os defensores da liberdade, a lutarem igualmente pela dignidade e pela democracia. Com sacrifício.<o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;">Estamos hoje gordos, pusilânimes na determinação de dar a vida pelos valores em que acreditamos, julgando que o nosso modo de vida é imutável e que nada pode já andar para trás. Mas pode. A maldade é intrínseca à espécie humana e não desaparece só porque achamos que deve desaparecer. A maldade combate-se, não só retoricamente, mas também com armas e coragem, como sempre aconteceu na história dos povos. É desagradável e angustiante? É. Mas haverá outra forma de a combater?<o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;"><br /></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"></p><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/a/AVvXsEjKndmvJxaIedOgvJuoA2vmeaiSbvKwx8OyQAtTXfWI__dRgwq9OukJbLmbH50LCZy5Br9yEQuYOXcVviwxGOOoT7eWKkZmOMidm5AyFIndwb11I-LgyjIv8L-yt3kEEJBCgCWvlEATjapwTc7qVa43S6sIAqyCgo8lVjNdqn1f6jt83ovkkMkV1Bmu=s1008" imageanchor="1" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" data-original-height="672" data-original-width="1008" height="213" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/a/AVvXsEjKndmvJxaIedOgvJuoA2vmeaiSbvKwx8OyQAtTXfWI__dRgwq9OukJbLmbH50LCZy5Br9yEQuYOXcVviwxGOOoT7eWKkZmOMidm5AyFIndwb11I-LgyjIv8L-yt3kEEJBCgCWvlEATjapwTc7qVa43S6sIAqyCgo8lVjNdqn1f6jt83ovkkMkV1Bmu=s320" width="320" /></a></div><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><br /></div><div class="separator" style="clear: both; text-align: left;"><br /></div><div class="separator" style="clear: both; text-align: left;"><br /></div><p></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 9pt;"><i><span style="font-size: 9pt;">“Os homens do Ocidente não quiseram isso. Lutaram, desde 1936 até 1945, e milhões foram mortos ou agonizaram no inferno das prisões, para que a Europa e a sua cultura permanecessem como esperança e mantivessem sentido (...)”<o:p></o:p></span></i></p><div class="separator" style="clear: both;"><p align="right" class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: right; text-indent: 9pt;"><span style="font-size: 9pt;">Albert Camus. </span><i><span style="font-size: 9pt;">A Europa da Fidelidade.</span></i><span style="font-size: 9pt;"> 1951.</span><span style="font-size: 9pt;"><o:p></o:p></span></p><p align="right" class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: right; text-indent: 9pt;"><span style="font-size: 9pt;"><br /></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: right; text-indent: 9pt;"><span style="font-size: 9pt;"><br /></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: left; text-indent: 9pt;"><span style="font-size: 9pt;">Publicado in O Comércio de Guimarães a 9 de março de 2022</span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: left; text-indent: 9pt;"><span style="font-size: 9pt;"><br /></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: left; text-indent: 9pt;"><span style="font-size: 9pt;">Imagens (de cima para baixo): Aris Messinis/AFP; </span><span style="font-size: 12px;">Aris Messinis/AFP; Viacheslav Ratynskyi/Reuters; </span><span style="font-size: 12px;">Aris Messinis/AFP; Emilio Morenatti/AP.</span></p></div><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><br /><span style="font-size: 14pt;"><br /></span></p>Rui Vítor Costahttp://www.blogger.com/profile/07059965221323441539noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-1159177454361764807.post-20268735740531342532022-03-08T12:48:00.002+00:002022-03-08T12:48:27.774+00:00A Avenida do Jordão<p> <span style="font-family: "Times New Roman", serif; font-size: 26pt; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;">É</span><span style="font-family: "Times New Roman", serif; font-size: 14pt; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"> </span><span style="font-family: "Times New Roman", serif; font-size: 14pt; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;">possível que algumas pessoas nunca tenham ido ao antigo Teatro Jordão, mas não deverão ser muitas. Quem seja de Guimarães e tenha mais do que quarenta anos já sentou seguramente os seus glúteos numa das muitas cadeiras daquele espaço, inaugurado em finais de 1938.</span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;">A agonia daquele espaço fundamental na cultura vimaranense, que muitos vivenciaram nos anos 90, até ao seu fecho definitivo em 1994, já vinha de duas décadas em que a empresa apresentava sistemáticos prejuízos, induzidos pelo progressivo abandono do cinema em sala, tristemente aditivado pela popularidade do vídeo e pela surpreendente desadequação de uma magnífica sala concebida para mais de 1000 espetadores.<o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;">O cinema é, ainda hoje, reduzido a uma caricatura quando o vemos numa televisão, ou em salas exíguas com os espetadores ruminando pipocas e falando da mesma forma que o fariam na sala de sua casa. Tenho, felizmente, a experiência do passado, das grandes telas, da imersão que o cinema por vezes convoca e é ainda possível vivenciá-la novamente nas sessões do Cineclube. Uma felicidade própria de quem vive em Guimarães. <o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;"><br /></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;"><br /></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"></p><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/a/AVvXsEiF7z9o1RuGZl89_5MaezleQb3RsldWpQux7hRWnJONy9w-aSiPxFRxuMoYQlqkKf5NlPanR6hX8w4LdNLwsrt_zDVjYH8umBhKpVckmG1ycMpO3fh9LS8BpeX6o6LgUqtWj-FePgJtXKPD9ZHBCYQu50_tDvlT0xd2viw-Js2RR3OIZQqEStqc_2w3=s1600" imageanchor="1" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" data-original-height="1600" data-original-width="1398" height="320" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/a/AVvXsEiF7z9o1RuGZl89_5MaezleQb3RsldWpQux7hRWnJONy9w-aSiPxFRxuMoYQlqkKf5NlPanR6hX8w4LdNLwsrt_zDVjYH8umBhKpVckmG1ycMpO3fh9LS8BpeX6o6LgUqtWj-FePgJtXKPD9ZHBCYQu50_tDvlT0xd2viw-Js2RR3OIZQqEStqc_2w3=s320" width="280" /></a></div><p></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><br /></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;"> </span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 26pt;">O</span><span style="font-size: 14pt;"> fecho do Teatro Jordão, recordo-me, deu apaixonadas discussões, movimentos, petições. Não foi possível salvá-lo na altura. Hoje regressa, passados 28 anos do seu desaparecimento, avivando memórias e constituindo-se como um novo espaço cultural de Guimarães. Diferente, adaptado às condicionantes que lhe impuseram, mas regressa, juntamente com a Auto Garage Avenida, inaugurada no mesmo mês e no mesmo ano em que o Teatro Jordão abriu, por iniciativa de Domingos Alves Machado, o pai da Colecção de Fotografia da Muralha, numa recuperação que me pareceu pouco feliz e que lhe retirou a magnífica comunicabilidade que a garagem estabelecia entre a avenida e a Penha.<o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;"> </span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 26pt;">P</span><span style="font-size: 14pt;">ara muitos daqueles que se sentaram nas cadeiras do Jordão, a avenida em que o Teatro nasceu foi sempre a Avenida do Jordão.<o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;">A artéria que abriu a 30 de dezembro de 1900, estabelecendo a necessária ligação entre a estação ferroviária e o centro da cidade, foi inicialmente designada por Avenida do Comércio, depois, em 1910, após a implantação da República, passou a chamar-se Cândido dos Reis, até que a 10 de dezembro de 1943 adotou o nome que ainda hoje tem: Afonso Henriques. Mas, como sabemos, aquela é a Avenida do Jordão, assim o ficou na voz do povo, indelével, para além das toponímicas decisões camarárias.<o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;">É esse o mote da exposição com que o Cineclube e a Muralha se associam à celebração em que se reganha aquele espaço cultural e que estará disponível para ser visitada, temporariamente, a partir do próximo sábado no 2º piso do mítico Teatro Jordão, a quem se saúda uma nova (e longa) vida.<o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;"> </span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 26pt;">H</span><span style="font-size: 14pt;">á cerca de cem anos atrás Guimarães vivia a angústia de não possuir uma sala de espetáculos digna, após o fecho e a consequente degradação do Teatro D. Afonso Henriques. Durante mais de uma década discutiu-se essa necessidade, enquanto se disfarçava, a custo, a inexistência de um espaço cultural que Guimarães merecia, envergonhando os vimaranenses nos alvores do século XX. Foi Bernardino Jordão (1868-1940) que sonhou e executou o projeto de um Teatro digno e moderno que a todos orgulhasse, como orgulhou. Um espaço por onde passaram centenas de milhares de espetadores, vibrando com os filmes do John Ford, com espetáculos musicais, óperas, teatro e tornando-nos, a todos, um bocadinho melhores.<o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;">Bernardino Jordão foi um homem notável. Um homem generoso, de profundas convicções e, acima de tudo, alguém que não conhecia a palavra impossível. A Avenida do Jordão foi moldada justamente por ele. Instalou-se com a família, nos inícios do século XX, no palacete setecentista de Vila Flor que recuperou e aformoseou. Nela estabeleceu uma fábrica de moagem e panificação, a sua empresa de eletricidade que, depois de comprada a empresários ingleses, trouxe para a avenida em 1909, sendo posteriormente renovada pelos seus sucessores em 1959, e cujo edifício se mantém e domicilia, hoje, a EDP e a “cereja” que faltava: o incontornável Teatro Jordão.<o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;">Bernardino Jordão era um republicano e um democrata que nunca caiu no goto do poder então estabelecido. Quando se abalança, a custas próprias, para o projeto de dotar Guimarães de um espaço cultural modelar escolhe o nome de Teatro Jordão. Nada mais justo e apropriado. No entanto, o antigo regime, proíbe o nome e, rapidamente, se batiza o novo espaço como Teatro Martins Sarmento. Teve que se fazer uma estrutura em madeira que tapasse as letras de granito - que ainda hoje lá estão - anunciando um outro nome, distinto sem dúvida, mas inapropriado para tão notável e individual realização. A sociedade vimaranense amotinou-se, independentemente da sua posição ideológica. Tratava-se de uma questão de justiça e não de política. Água mole em pedra dura tanto dá até que fura e em final de 1940, já Bernardino Jordão havia falecido há cerca de meio ano, o Teatro ganhou oficialmente o nome pelo qual os vimaranenses o reconheciam: Teatro Jordão. Na Avenida do Jordão, acrescentamos nós, desejando-lhe o futuro que a sua longa e vibrante história merece.<o:p></o:p></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;"> </span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 14.2pt;"><span style="font-size: 14pt;"><br /></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 9pt;"><i><span style="font-size: 9pt;">“Dizem-me que Bernardino Jordão está ou esteve preso a orientações políticas bem distantes da minha.<o:p></o:p></span></i></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: justify; text-indent: 9pt;"><i><span style="font-size: 9pt;">Não me interessa essa circunstância - em primeiro lugar, porque entendo, desde sempre, que do Cavalinho para cá, só deve haver vimaranensismo. E se todos pensassem assim, bem diferente seria a situação de Guimarães, hoje. O que a tem prejudicado, o que a prejudica é a pulverização em que vive (...)”<o:p></o:p></span></i></p><p align="right" class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: right; text-indent: 9pt;"><span style="font-size: 9pt;">Alfredo Pimenta. </span><i><span style="font-size: 9pt;">Notícias de Guimarães.</span></i><span style="font-size: 9pt;"> 23 de novembro de 1938.</span><span style="font-size: 9pt;"><o:p></o:p></span></p><p align="right" class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: right; text-indent: 9pt;"><span style="font-size: 9pt;"><br /></span></p><p class="MsoNormal" style="font-family: "Times New Roman", serif; margin: 0cm; text-align: right; text-indent: 9pt;"><span style="font-size: 9pt;"><br /></span></p><p class="MsoNormal" style="margin: 0cm; text-align: left; text-indent: 9pt;"><span style="font-family: Times New Roman, serif;"><span style="font-size: 9pt;">Publicado in O </span><span style="font-size: 12px;">Comercio</span><span style="font-size: 9pt;"> de Guimarães a 9 de fevereiro de 2022</span></span></p><p class="MsoNormal" style="margin: 0cm; text-align: left; text-indent: 9pt;"><span style="font-family: Times New Roman, serif;"><span style="font-size: 9pt;"><br /></span></span></p>Rui Vítor Costahttp://www.blogger.com/profile/07059965221323441539noreply@blogger.com0