Olhar em frente

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Encontramo-nos, enquanto povo, na vertigem alucinante da montanha russa em que, de olhos fechados, a descida parece não ter fim. Sempre a descer com o estômago empurrando os pulmões de encontro ao cérebro, não há notícia que aplaque a vertigem. Pelo contrário. Ou é o défice que afinal é maior do que o previsto, apesar do inenarrável Ministro das Finanças nos dizer que mais este engano é “apenas” uma questão técnica. Ou os juros a apertar quando os mercados percebem que já não há confiança que valha. Ou mesmo constatar que entre 1980 e hoje o stock da dívida directa do Estado aumentou 50 vezes! Ou seja este país transformou-se efectivamente numa montanha russa. Até agora a subir: era necessário crédito dava-se crédito, eram necessárias estradas davam-se de borla, era necessário um pavilhão para meia-dúzia de habitantes e lá se construía o mamarracho para garantir uns quantos votos, sempre sempre a subir até à queda que hoje nos tira o fôlego.

Para piorar só faltava mesmo a actual crise política e a alucinada desfaçatez de Sócrates.

 

Convém, mais do que nunca, inspirar fundo e não ficarmos paralisados pelo medo.

Somos um país antigo cuja história nos deve encher de orgulho. Resistimos ao longo destes 900 anos aos diferentes invasores e soubemos sair deste rectângulo fazendo o mundo avançar. Não precisamos de outros, precisamos de nós.

Precisamos de uma nova cultura de responsabilidade e de exigência e não dos deslumbramentos de ocasião a que a nossa alma é tão (irresponsavelmente) sensível.

Precisamos sobretudo de penalizar de forma exemplar a pouca-vergonha. Dão-se dois exemplos:

 

O défice de 2010 que era para ficar nuns miseráveis 7,3% vai quedar-se, ao que hoje se sabe, pelos 8,6%. A responsabilidade pelo alargamento do buraco é dos bancos (BPN e BPP) e do sector público de transportes (fundamentalmente de Lisboa), estes últimos “contribuíram” com mais 800 milhões de € para o buraco. Ora nós aqui de Guimarães somos, ano após ano, solidariamente responsáveis com este disparate, apesar dos nossos transportes serem privados. E não digo que não o tenhamos que ser. O que não é suportável é ver as greves que se multiplicaram nas últimas semanas e a loucura de chefias que grassa nesses “serviços públicos”. Marques Mendes, no seu recente livro, refere que a CP tem uma quantidade de chefias tão grande, que há um chefe por cada 16 trabalhadores da empresa. Ora isto não é, como é fácil de ver, sustentável.

Por falar em chefes … o diário i trouxe a passada semana uma história típica daquilo que de pior o país tem. Dizia o jornal que um tal Marcos Baptista acedeu à administração de mais uma empresa pública, os CTT, pela mão de um ex-sócio seu o actual Secretário de Estado Paulo Campos. Já seria mau a promiscuidade dos compinchas, mas a coisa pode sempre piorar … e piorou. O despacho de nomeação publicada no Diário da República referiu que o dito senhor era licenciado pelo ISEG. Pelos vistos não era e ganhou em 2009, segundo o jornal, 257 mil €. Mas o melhor é que quando confrontado com o facto de ter produzido falsas declarações sobre as suas habilitações o tal senhor respondeu, e passo a citar, “(…) sempre estive convencido que o meu percurso académico com oito anos de frequência universitária e elevado número de cadeiras concluídas corresponde a um curso superior (…)”.

Alguns, nos quais eu me incluo, têm às vezes pesadelos ao sonhar que alguém nos veio dizer (em sonhos) que afinal não acabámos o curso. É comum isso acontecer. Agora há outros que, pelo contrário, acabaram o curso em sonhos. Enfim, os exemplos vêm de cima.

No entanto o país continua e tem que continuar. Há muito mar ainda e um futuro que importa responsavelmente construir.

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