Vitória: à procura de um rumo



A época de futebol está prestes a começar. Não há, no Vitória, excitantes contratações, e ainda bem. Devido à situação débil em que o Vitória ainda se encontra a aposta na “prata da casa” continua a ser uma solução que eu desejaria que fosse uma firme convicção. Temos, como já se provou, o treinador ideal para um projeto de longo prazo que passe pela afirmação de novos valores portugueses, um treinador com qualidades humanas e técnicas para manter motivados os jogadores, como aliás se viu no tempo em que tem estado ao serviço do clube.

O facto de o Vitória ser hoje um caso à parte no futebol português, em termos da fidelidade dos seus sócios e simpatizantes, leva a que o clube seja um apetecível alvo a abater. A nossa devoção causa inveja aos “grandes” sempre raivosos pela inexpugnabilidade de Guimarães, e aos nossos outros rivais uma dor de cotovelo absolutamente descomunal que culminou com a má disposição de muita gente aquando d’ O DIA V. O recente episódio do Gil Vicente é disso o mais novo testemunho, a maneira como somos tratados quando nos deslocámos aos vários campos do país é o espelho de uma animosidade que, sabemos, esconde no fundo uma inconfessável admiração pela forma como sentimos o clube como parte integrante da nossa cultura e da nossa identidade, em que os resultados desportivos são meras contingências e não a razão de sermos vitorianos.



Apesar da paixão pelo clube ser transversal em relação à esmagadora maioria dos vimaranenses temos vivido tempos conturbados em que as discussões sobre o clube têm sido reféns de gente sem nível, com demasiada acrimónia e sem ideias concretas e motivadoras. As assembleias gerais têm sido um mau exemplo de um clube que não consegue mobilizar os seus melhores elementos no universo associativo para discussões sérias. É penoso, a maior parte das vezes, a elas assistir. Afastei-me, consciente e cobardemente, durante anos dessas reuniões pois ficava desiludido e isso afetava sempre a maneira como interiormente considerava os meus consócios; aquilo que assisti no final do mandato de Vítor Magalhães e em algumas do mandato de Emílio Macedo da Silva, abalaram profundamente a minha convicção romantizada sobre os “melhores adeptos do mundo”, que rapidamente retomaram o seu curso nos anos em que subimos de divisão ou nas finais da Taça que disputámos, isso sim era o meu Vitória e os adeptos que o construíam. Tenho ido às assembleias deste mandato sem grande prazer. As reuniões não são tão más – longe disso – como as anteriormente referidas, mas o grau de interesse que elas despertam é muito reduzido. Não me estou a referir, obviamente, ao cuidadoso trabalho de explicação de contas que tem sido levado a cabo pela atual direção – destaco especialmente as intervenções do vice-presidente Francisco Príncipe e do presidente do conselho fiscal Eduardo Leite – mas às intermináveis discussões que se seguem, sem que nelas se vislumbre o mínimo de interesse para o futuro do clube.



Eu compreendo o afastamento dos sócios das assembleias gerais do clube, provavelmente não iria se não fosse conselheiro vitoriano pois as horas de discussão resumem-se a nada, ou a praticamente nada. Chega a ser confrangedor estar horas refém das esquizofrenias habituais, dos membros das claques, e de um reiterado desrespeito pelo trabalho dos membros da direção que, não imunes à crítica, são no mínimo tributários de respeito pelo seu trabalho, mesmo que eventualmente não se concorde com o rumo. Discuta-se então o rumo e não as pessoas. Sou um grande adepto da discussão livre, democrática, crítica, assertiva, mas estes adjetivos não caracterizam, infelizmente, as assembleias do meu clube, de quem muitos bons vitorianos se afastaram para não serem, uma vez mais, insultados pelos jacobinos de ocasião. Seria contudo importante que a imensa comunidade vitoriana “esquecesse” o passado e contribuísse, nem que seja apenas com a sua presença, para elevar o debate.

O futebol português está pelas “ruas da amargura” e os “grandes” vão rapidamente começar a pagar a sua megalomania alicerçada numa imprensa servilista que lhes dá uma importância distorcida da realidade. A grave crise financeira do Vitória deu-nos, ironicamente, alguma vantagem em termos da construção de um futuro novo. A dedicação apaixonada dos nossos adeptos são a base que qualquer clube não desdenharia ter mas, efetivamente, não tem. É importante que todos nós contribuamos para consolidar e melhorar o rumo de aposta na juventude e na formação.



Que grau de empenhamento temos nós, sócios, nesta aposta? O que discutimos nós até agora sobre esse rumo? Queremos um Vitória longe das contratações milionárias mas respeitador dos seus compromissos? Ou não? Queremos mais e melhores olheiros? Temos a tranquilidade suficiente para apoiar incondicionalmente o Tomané e o Areias, sem ambicionar por um avançado estrangeiro?

Sei da minha convicção, não saberei a dos meus consócios…


Que venha entretanto o campeonato e que o nosso apoio à equipa seja, absolutamente, incondicional. E que a nossa diferença seja, no mínimo, essa. Afirmar a diferença pela positiva, com um rumo novo aguentando percalços e desilusões sem mudar de direção a cada contrariedade. É isso que eu espero e, já agora, felicidades a jogadores “nossos”, como o Ricardo e o Paulo Oliveira, que ajudaram a vislumbrar pelo seu inquestionável mérito e dedicação um novo Vitória. Fazem-nos falta, mas ... que apareçam outros.


Fotos: O DIA V  organização: Muralha/Cineclube/Conselho Vitoriano
Sobre fotografias de Miguel Oliveira, Ricardo Leite e Ricardo Rodrigues

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